Daniel Campos

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Encontrados 208 textos. Exibindo página 4 de 21.

20/05/2015 - É tudo silêncio

Tudo tão quieto, tão quieto, tão quieto de se ver... O mar virou deserto pra nem as ondas barulhar... Onde esse silêncio todo vai dar? Quem é que vai querer, querer falar? Não se pode nem beijar se for pro beijo estalar... Como é que vai ficar essa mudeza toda? Nem as notas do café caem mais sobre a mesa... A beleza não grita e a tristeza não chora de soluçar... Ninguém arrasta sandália, mãe com criança não ralha, do céu sumiram as gralhas... E agora, e agora, e agora? Carro na rua já não passa, baderneiro não faz arruaça, urubu não sai rindo depois de achar uma carcaça... Cachorro não late, lavadeira não bate, moleque não dá combate... Não há música alguma a solta. Ninguém ameaça o senhor silêncio que governa as bocas com suas mordaças roucas... ...
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01/05/2015 - Ela foi além de si

Ela não adiou sua vida por ninguém. Tomou seu rumo tratando obstáculos com desdém. Ignorou todo e qualquer porém e foi além do que muitos acreditavam ou lhe davam. Botou na bagagem apenas o necessário, ou seja, ela. Fez de seus braços suas asas, de suas costas sua caravela e do seu ventre, sua casa. E como não era defunta de cova rasa, foi a fundo em tudo o que se propôs não deixando nada para depois. Em suas contas, um mais um nunca deu dois. Tudo ela tirava a prova e se reinventava a todo instante. Era amante de si mesmo. Ah, como gostava de si. Um albatroz no corpo de um bem-te-vi. Ganhou mundo e não se arrependeu nem por um segundo de ter se doado ao futuro sem jamais ter sido passado. ...
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27/04/2015 - Essa tal gravidade

Se não fosse essa tal de força da gravidade nós poderíamos andar nas nuvens sem nos prender a nada. As árvores ficariam de ponta cabeça, com raízes descabeladas aos céus e frutos ao alcance das mãos dos mais pequeninos. Os peixes nadariam por outros azuis e os pescadores poderiam fisgar anjos distraídos. A terra não prenderia ninguém, todo e qualquer corpo seria alforriado. Seríamos como balões de gás namorando pelo horizonte. Voaríamos, flutuaríamos, boiaríamos como astros e estrelas que somos. As pedras da calçada, das montanhas, das geleiras diriam que estávamos enganados sobre seus pesos, pois levitariam sem precisar de mágica. Ah, se a força gravitacional não nos atraísse arbitrariamente o universo nos seduziria muito mais. Não teríamos endereço fixo, pois nossas casas não parariam no lugar. Seria o caos se o caos não fosse o hoje, da forma como se está tudo aparentemente no lugar mas realmente tudo, do raso ao fundo, de pernas pro ar.


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10/04/2015 - Eis-me

Porque urjo eu fujo do subterfúgio inerente ao seu olhar depois das seis. Será que um dia, qualquer dia, mais dia menos dia, o meu sonho por entre os seus seios ainda tem vez? Eu já lhe contei que venho de outro planeta, que já fui árvore na paisagem e minha linhagem é de reis... Eu já duvidei do que sinto e, sinto muito, não minto, do seu eu mais bonito, situado entre o seu eco aflito e a sua alma de absinto, continuo o mesmo freguês. Então, ilusão na mesa, coração que troveja, demônio de igreja, para além da boca que beija: ainda me quereis?


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10/03/2015 - Esqueci-me

Esqueci-me de marcar meus poemas preferidos e hoje estou perdido dentre tantos versos. Esqueci-me de guardar minhas memórias em compartimentos à prova do tempo. Esqueci-me de listar os beijos que ainda tinha para dar. Esqueci-me de terminar de ler tantos livros que poderiam ter mudado muito em mim. Esqueci-me de dizer tantos eu te amos por vergonha ou medo ou simplesmente porque deixei para depois e o depois se foi. Esqueci-me de acompanhar as mudanças da fase da lua nos últimos anos. Esqueci-me de conversar com o vento e hoje ele está mais calado comigo. Esqueci-me de que o futuro se torna passado rápido demais. Esqueci-me de alimentar tantos sonhos acreditando que eles resistiriam ao passar da vida. Esqueci-me de olhar nos olhos do meu destino e fui tocando, tocando, tocando... Esqueci-me de que a felicidade é o agora, aliás, tudo o que sou e, o que importa e o que significa de fato é o agora. Esqueci-me de fazer minhas receitas prediletas obrigando-me ao arroz com feijão diário. Esqueci-me de que é preciso não só engolir, mas apreciar, degustar, descobrir novos sabores no velho prato. Esqueci-me de tentar ser pássaro ficando cada vez mais preso ao chão. Esqueci-me de esquecer tantas coisas inúteis, doloridas e pesadas que pesam desnecessariamente na bagagem. Esqueci-me de podar alguns medos que hoje são mais fortes do que eu. Esqueci-me de colocar para fora tanta coisa que hoje não quer mais sair. Esqueci-me de dançar mesmo que tropeçando nos próprios passos, de cantar mesmo que desafinado, de continuar encantado como menino. Esqueci-me de que a vida é muito mais do que aquilo que se vê, que se ouve, que se toca... Esqueci-me de que não existe infinito, eterno, para sempre se não houver o hoje. Esqueci-me de que o exato momento é único e mágico, a chave do nosso mundo.


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03/03/2015 - Escrevendo e vivendo

Coloca seu nome junto ao meu para ver se combina. Escreva em seus cadernos de menina sua receita de felicidade. Rabisca corações em meu peito, pois corações nunca são demais. Soletre amor tantas vezes quiser ou puder aos meus ouvidos. Fala a língua dos meus sonhos. Romanceia o nosso romance. Versa e reversa o que nos faz bem. Transcreva o que está em sua cabeça para as minhas mãos. Passa a limpo suas verdades. Copia do horizonte as mensagens do por do sol. Lembra que o nosso destino não tem pauta. Não importa a caligrafia, mas o sentimento contido em cada letra. Una as pessoas que te fazem feliz como que unisse sílabas. Seja em prosa seja em verso supera o adverso. Não queira apenas que o final da sua ou da nossa história seja feliz, capriche no meio e embora o começo esteja distante é sempre tempo de recomeço.


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14/02/2015 - É o Caboclo Tupinambá

Quem vem lá, quem vem lá, é o Caboclo Tupinambá. Chega com penas coloridas, vermelhas, amarelas e brancas, num imenso e vivo cocar. Chega impondo respeito, com pouca conversa, e fazendo grande emanação de energia. Chega batendo no peito e bradando seja noite seja dia. É índio, é mata, é cachoeira, é céu, é fé, é caboclo que ecoa como pássaro em tronco oco.

Quem vem lá, quem vem lá, é o Caboclo Tupinambá. Chega vestido de penas, com colares de pedras e dentes. Vem numa luz azulada por vezes esverdeada que limpa tudo de ruim ao seu redor. Vem com desenhos vermelhos e pretos que guardam segredos de seu povo. Vem pra trabalhar pela cura desobsessiva, fazendo limpeza pesada, pondo fim à briga, intriga, figa......
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24/01/2015 - Eu te dei me dando

Eu te dei tanto de mim que até acreditei que esse amor não tinha fim. Eu te dei tantas horas minhas fazendo de você princesa, condessa, rainha. Eu te dei tudo o que eu tinha, mas advinha? Eu te dei o meu lado gourmet para você comer até enjoar. Eu te dei minhas certezas e você fez proezas com as quebras de expectativa. Eu te dei o meu interior para você colocar suas cercas. Eu te dei minhas confissões para serem mantidas no seu segredo. Eu te dei porta-retratos falados que não têm razão quando silenciados.


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16/01/2015 - Entre o infinito e o impossível

Um dia eu ainda mudo de nome de tantas promessas feitas a mim mesmo. Prometo nunca mais fazer isso ou aquilo e só faço o mesmo do mesmo do mesmo. É difícil cumprir o compromisso que tenho comigo, pois eu tenho pressa de querer demais. E eu quero mais e mais numa busca incessante pelo que quero ser. E assim eu prometo o infinito e me comprometo com o impossível.


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14/01/2015 - Ebulição

Minha casa não tem telhado. Minha boca tem sol e lua no mesmo céu. Meus braços não formam laços. Meu chão não tem fundo. Minha saudade está à frente de mim. Tenho medo da minha falta de medo. Meus ouvidos escutam as pedras, as árvores, as nuvens... Meu coração não tem cantos e meus amores são agudos e obtusos ao mesmo instante. Eu sou ave de silêncio, cantante apenas no que escrevo. Não me dobro, mas me cobro intensa e incessantemente por tudo o que sou, o que fui e o que quero ser. Sou ebulição mesmo nas horas em que sereno. Nada do que se passa ao meu redor deixa de me afetar, me influenciar, me tomar de uma forma ou de outra. Sou onda ora a caminho do continente ora em direção ao mar aberto.


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