Daniel Campos

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Encontrados 362 textos. Exibindo página 12 de 37.

09/04/2013 - Considerações cotidianas

Toda escuridão nasce de uma fraqueza da luminosidade. O silêncio é conseqüência do excesso de barulho. A individualidade surge de uma brecha do coletivo. Nem toda vela queima até o fim, algumas chamas acabam antes do pavio. Em certos casos, remédios fazem aumentar a dor. Nem todo destino é prescrito por algum deus. A falta de tempo é tão abstrata quão o próprio tempo. Em meio à luta por sobrevivência, o cachorro mia, o gato late. A insônia crônica é resultado da carência de sonhos.

As mudanças externas e internas são parte do encontro de movimentações. O mau-humor se esconde atrás de um sorriso. Todo anjo já emergiu do limbo. Todo demônio já fez uma boa ação. O bem nem sempre precisa vencer o mal para uma história ter final feliz. Todo par de asas um dia se fecha. A perfeição, para ser realmente perfeita, precisa ter um toque de imperfeição. A maçã do amor, dependendo da mordida, pode ser a maçã da separação. Todo inverno, por mais frio que seja, guarda lembranças de febre. O final é a outra face do começo.


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08/04/2013 - Com os pés no espaço

Eu quero ser abduzido por algum extraterrestre. Eu quero ser levado desta terra. Eu quero receber a escritura de uma casa em Vênus. Eu quero me casar nos anéis de Saturno. Eu quero conversar com São Jorge na lua. Eu quero me aninhar em uma estrela. Eu quero pegar carona num cometa. Eu quero aventuras espaciais.

Eu quero tocar nos signos, influenciar os horóscopos. Eu quero acompanhar uma chuva de meteoros sem ter medo de enchentes. Eu quero mergulhar na imensidão do espaço sem risco de congestionamento. Eu quero que meus problemas se incendeiem na atmosfera terrestre. Eu quero viajar na velocidade da luz. ...
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31/03/2013 - Coelho em crise

Em crise, o coelho procurou a preguiça, mas ela demorava demais para fazer ovos. A onça não entregava os ovos. O morcego fazia ovos de ponta cabeça. A baleia fazia ovos grandes demais. O cachorro enterrava os ovos. O rato roubava seus próprios ovos. O gato brincava com os ovos como novelos de lã. Os cangurus colocavam seus ovos para pular. O mico-leão-dourado só fazia ovos com sabor de banana. Os ovos de rena confundiam páscoa com natal. As ovelhas faziam ovo de pelúcia. A mulher fazia ovos sentimentais demais....
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28/03/2013 - Céu de semana santa

O céu de semana santa é diferente de outros céus em todos os sentidos e formas. Um céu que fica nu de nuvens e até mesmo de pássaros. Um céu desértico, como que feito de areia azul, com marcas de via-sacra. Um céu que brilha trêmulo como a chama azulada de uma vela quando carregada em procissão. Um céu que dói e, que chora e que silencia. Um céu que abriga cânticos e lamentos.

O céu de semana santa aperta o coração. Um céu de ramos, de lava-pés, de paixão. Um céu por onde cavalga a morte, mais do que nunca, soberana. Um céu que nos leva a pedir perdão. Um céu que se transforma no lenço da Verônica, com direito ao canto e à Santa Face. Um céu bordado de tristeza e pesar. Um céu que demora a passar, que pesa os olhos, que tira a cor do mundo. ...
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21/03/2013 - Contra a discriminação, salve os pretos-velhos

Respeite a sabedoria dos pretos-velhos. Valha-se dos conselhos dos pretos-velhos. Honre o sangue dos pretos-velhos que corre em seu corpo. Faça justiça aos pretos-velhos. Orgulhe os pretos-velhos com atitudes certas na hora certa. Humilhe-se para ser elevado pelos pretos-velhos. Tome os pretos-velhos como exemplo. Beba a cultura dos pretos-velhos. Dance com a alegria e a ginga dos pretos-velhos. Aprenda a arte da paciência com os pretos-velhos. Acredite no poder e na magia dos pretos-velhos. Serena na serenidade dos pretos-velhos. Transborde o axé dos pretos-velhos. Leve as guias brancas e pretas dos pretos-velhos. Encante-se com as encantarias dos pretos-velhos. Exorcize a dor da discriminação com ajuda dos pretos-velhos....
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18/03/2013 - Caro corretor

Corretor, quero uma casa onde chova dia sim dia não. Corretor, quero uma casa sem vizinhos. Corretor, quero uma casa numa cidade perdida ou proibida. Corretor, quero uma casa com perfume de mato verde. Corretor, quero uma casa aonde o vento chegue sem empecilhos. Corretor, quero uma casa com assentamentos para os meus orixás. Corretor, quero uma casa camaleoa, que mude de cor pra afastar o tédio. Corretor, quero uma casa com bailarinas e astronautas. Corretor, quero uma casa com pé de jabuticaba, manga, goiaba, abacate......
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Comentários (1)

08/03/2013 - Campos de Praga

A cada dia sua poesia vai ficando mais moça
E a minha vida longe de você mais insossa
E a fantasia é só prazer é só querer é só poder
E que ninguém, meu deus, ouça
O que eu digo aos teus ouvidos
Eu quero é me perder nos seus olhos perdidos
Entre as montanhas e as castanhas
Entre as manhãs e as avelãs
Entre os algozes e as nozes
Contido no desejo que gozes

Seus seios vão crescendo em minhas mãos
E eu vou bebendo nas tabernas das suas pernas...
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04/03/2013 - Conclave

Vote num papa negro. Num papa com traços indígenas. Num papa japonês. Vote num papa mestiço. Num papa tupiniquim. Num papa abaixo da linha do equador. Vote num papa pop. Num papa rock. Num passa bossa nova. Vote num papa de fé. Num papa de santo. Num papa que acredita em espíritos. Vote num papa mulher.

Vote num papa que canta, que dança, que levanta multidões. Vote num papa sem burocracia. Num papa zodiacal. Num papa de alto astral. Num papa fértil de fantasia. Num papa que vá além da bíblia. Num papa que doe o ouro do Vaticano aos pobres. Num papa que esteja sempre por perto. Num papa que deixe a Praça de São Pedro para peregrinar pelos desertos. ...
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28/02/2013 - Chorante

Chora o sabiá na dobra da janela. Chora o sol nos quartos da lua. Chora o serrote no cerne do jequitibá. Chora o tempo nas voltas do relógio. Chora o grilo em roçadas de pernas. Chora o broto rompendo o chão. Chora a cortina que fecha o espetáculo. Chora o buquê pela separação da noiva. Choram as paralelas por viveram lado a lado e não se cruzarem nunca. Chora a garrafa vazia nas mãos de um bêbado. Chora a cigarra esperando a chuva. Chora o violão nos braços dos desafinados.

Chora o lavrador no meio da estiagem. Chora a amora lágrimas de sangue doce. Chora as palavras a cada investida da borracha. Chora o pescador pelos peixes que não pescou. Chora a bailarina condenada ao silêncio. Chora o peito flechado de solidão. Chora a saudade em cada uma de suas camadas. Chora o destino que não vingou. Chora o mar no balanço das ondas. Chora a cebola na ponta da faca. Chora o sereno no hálito da madrugada. Chora o galo fechando o dia no alto do mourão.


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10/02/2013 - Corpos

Corpos de dão. Corpos se flertam. Corpos se entortam. Corpos se vão. Corpos se provocam. Corpos se chocam. Corpos se invocam. Corpos se misturam. Corpos se seguram, ou não. Corpos se roubam. Corpos se tombam. Corpos se usam. Corpos se alinham. Corpos se abusam. Corpos se engalfinham. Corpos se fitam. Corpos se gritam. Corpos se bolam. Corpos se embolam. Corpos se rolam. Corpos se agigantam. Corpos se tomam. Corpos se cantam. Corpos se rasgam. Corpos se devoram. Corpos se engasgam. Corpos se coram. Corpos se enfeitiçam. Corpos se atiçam. Corpos se viçam. Corpos se cobiçam. ...
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