Daniel Campos

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Encontrados 79 textos. Exibindo página 5 de 8.

19/10/2011 - Rua São Miguel, 71

Sem dúvida alguma, esse foi o endereço da minha juventude. Eu morava com meus pais nessa mesma rua, um pouco mais acima, mas a casa em questão era a de meus avos maternos. Conto nos dedos das mãos quantas vezes deixei de ir lá ao menos uma vez por dia ao longo de 25 anos de idade. Definitivamente, celebrei bodas de prata com aquela casa. Perdi a conta de quantos sorrisos, de quantos sonhos, de quantos poemas, enfim, do quanto de mim ficou impregnado naquelas paredes.

Ah! Quantos passos meus ficaram marcados num balé de encontros e reencontros naquele piso, que ora formava desenhos geométricos ora pinturas abstratas. Quantas danças garbosas de meu avô bailando por aquela casa permanecem dançando em meus olhos. Quantas vezes eu me sentei ao redor de uma daquelas duas mesas de madeira, construída por ele, para comer de iguarias típicas de minha avó como polenta com frango ou sorvete de ameixa. ...
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17/10/2011 - Religião bossa nova

Havia um tempo em que minha religião era a música. Tom Jobim e Vinícius de Moraes sempre foram meus principais deuses, aqueles que haviam criado o mundo de canções em que eu habitava. Tom e Vinícius, como Jesus, Buda, Alan Kardec, tiveram sua passagem pela terra. Ao contrário de parábolas, falavam por meio de versos e partituras. E como poucos, estavam ligados diretamente à natureza. Falavam do amor com propriedade. Era uma religião sem castigos, sem medos, sem pecados.

A música de Tom e Vinícius é milagrosa por si só. Capaz de curar problemas do corpo e da alma. Além disso, as canções tanto trazem a pessoa amada até você como a levam até ela. São capazes de tocar profundamente nas questões mais íntimas e secretas. Suas canções provocam alívios, renovam esperanças, alimentam desejos. Letras e ritmos que confortam e provocam ao mesmo tempo. São músicas vivas que não só simbolizam, mas que concretizam a vida como deve ser vivida – de maneira atemporal e intensa.


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01/10/2011 - Rosas de sangue e pólvora

Dos mortos de guerra, soldados-cadáveres, nascerão dúzias de rosas, de belas rosas de sangue e pólvora. Dos túmulos erguer-se-ão anjos de pedra em poses fotográficas, numa graciosidade mansa e cálida. Poetas e bêbados cantarão suas glórias sob uma lua pálida. Os heróis do combate serão responsáveis por tantas gravidezes póstumas, tantos filhos dos seus gritos de guerra. Da guerra renascerá uma nova terra, mais forte e com menos medo da morte. Os mortos de guerra escorrerão como rios perenes nas faces de suas mães, viúvas, irmãs, crianças. Os combatentes desaparecidos serão encontrados facilmente nas páginas das cartilhas escolares. ...
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18/09/2011 - Rancho coração

Meu coração é como um rancho caipira, com canteiros de cheiro verde, moinhos de pedra, flores de erva doce, ninhos de galinha e fogão à lenha. Tem espaço para sanduíche de mortadela, para bolo de fubá, para roça de mandioca amarela. São sacas e mais sacas de arroz agulhinha, de feijão guandu, de açúcar mascavo. E por falar no doce da cana caiana, tem rapadura, melaço e batida de tacho.

Tem pé de goiaba vermelha, pé de jabuticaba sabará, pé de manga rosa, pé de sabiá. Tem jatobá, castanheira, abacateiro e jacarandá. Tem ipê roxo, amarelo, rosa e branco. Tem terreiro, procissão e dia santo. Tem varanda, terra batida e riacho. Tem porteira, cancela e cerca de arame farpado. Tem algodão, girassol e muito gado. Tem lavoura de milho, um bocado de trem e estribilho de cantador. ...
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04/09/2011 - Refeição literária

Amanheceu e não tomou o café da manhã de costume. Torradas, sucos, geléias, pães, frutas ficaram sobre a mesa. Intocáveis. Estava sem fome. Ao menos, sem fome de comida. Ao menos, daquele tipo de comida. Sua mulher estranhou. Ofereceu-lhe então ovos mexidos, bolos de cenoura, pães de mel. Ele torceu o nariz. Estava entojado daquelas iguarias. Ela ainda tentou mais uma vez: champanhe? O não veio como num estouro de rolha, alto e seco.

A filha, aproveitando da situação, sugeriu que o pai pedisse uma pizza. Ele riu e saiu da mesa às pressas. Pegou um paletó e saiu dizendo que ia comprar comida. A esposa não entendeu nada e a filha lamentou a falta da pizza. Horas depois chegou com sacolas e mais sacolas. Mas não eram sacolas de supermercado com legumes, verduras, carnes, frios, enlatados supérfluos... Eram sacolas de livrarias. Pelo menos cinco delas. Nem sinal de comida. ...
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02/09/2011 - Reconsiderações

Mande seus medos para a masmorra mais distante de seu reino. Acorrente suas frustrações de modo que elas não consigam voltar a sua cabeça. Alimente bem cada um de seus sonhos, dos mais próximos aos mais impossíveis. Eduque-se para o amor e também para a guerra. Reescreva seu destino quantas vezes for preciso. Traia para continuar sendo fiel aos seus valores. Peça perdão as suas dores.

Diga o silêncio sempre que não tiver nada lírico ou revolucionário para dizer. Ame sem posologias, precauções e sem contra-indicações. Chore para limpar os olhos e lavar as escadarias da sua alma. Guarde as lembranças do que não teve coragem de fazer no fundo do baú. Revire seus pensamentos, desarrume a ordem vigente. Quebre expectativas, iluda o espelho, encaracole desejos em seu cabelo. ...
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15/08/2011 - Recado de Iansã

Iansã mandou lhe dizer que amanhã o vento vai trazer uma febre terçã de sofrer pra essa gente que não sabe viver de paixão. Vai vir tempestade, de raio e trovão, pra mostrar que a saudade é a semente da solidão. Iansã não perdoa quem machuca à toa a ilusão de seus filhos. Os estribilhos da sua canção espalham o medo e o segredo da sofreguidão. Iansã, Eparrei Oyá. Iansã, vem castigar quem não sabe amar.

Iansã, dona das ventanias, não hesita em dar seu corpo e coração a quem se apaixona. Mas ela quer sinceridade. Ela quer entrega. Ela não nega desejo. Ela não foge à luta. Iansã é a força bruta da paixão. Iansã é a vermelhidão. Iansã é o beijo. Iansã é o que queima. Iansã é a cama. Iansã é a chama de quem ama. Iansã Eparrei. Iansã tem o rei da justiça aos seus pés. Fé na rainha dos raios que tem os cupidos por seus lacaios. ...
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09/08/2011 - Reviravolta

Nunca pensou em se divorciar. Achava que tinha algum problema por nunca ter pensado isso. Não tinha motivos para cogitar a separação. Não desconfiava da mulher com quem era casado há dezesseis anos. Nem se lembra de quando foi à última vez que brigaram. Jamais ficou tentado a trair sua esposa com quem quer que fosse. Gostava de seu jeito, de seu corpo, de suas manias, de seus temperos, de suas roupas, de seu cabelo, de sua voz, de seu sexo, de seu andar, de seus sapatos...

Gostava de um tudo em se tratando dela, era seu admirador convicto e nada secreto. Sempre fazia juras e gestos para afirmar e reafirmar seu amor. Convivia de forma harmoniosa com os parentes e amigos da mulher. A sogra o chegava a chamar de filho. Também não tinha problemas com os chefes e colegas de trabalho dela. Jamais precisou beber ou fumar ou se drogar para tentar esquecer algo de ruim que tivesse sido provocado pela esposa. ...
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22/07/2011 - Ri

Ah! Esse seu sorriso largo é o meu afago. Trago seus risos pra dentro de mim. No meu lago particular. Drago seu sorriso dias afim. Vago por seus lábios sem fim. Sorriso sem preço, sem pago. Sorriso sem qualquer estrago. Quando desmancha o riso, caio gago aos seus pés. Coisas de homem e mulher. Coisas de mago e de quem se quer.

Ri com toda educação, com toda classe, com toda retidão e ri com a boca cheia longe da finesse. Ri deixando furos como uma blusa de lesie. Ri como deusa, como humana, como Lessie. Ri, não se esquece, ri, e não me fenece, ri, e me apetece, ri, e me enlouquece, ri, e me veste neste teu sorriso que me arranca o siso. ...
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28/06/2011 - Reflexões sobre a felicidade

O problema da felicidade é que ela acaba quando começa a tomar corpo. Ela não se apresenta ao som de trombetas e termina quando o desenvolvimento começa a ficar interessante. É a fábula da irrealidade. Nós a buscamos pela vida afora, dia após dia, e quando a encontramos não sabemos bem o que fazer com ela, já que não existe da maneira que pensávamos. A felicidade não é palpável, prevista, manipulável. Ela é nuvem. Cada dia está com um formato, com uma textura, com uma cor, com um ritmo...
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