Daniel Campos

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Encontrados 254 textos. Exibindo página 5 de 26.

26/04/2015 - Paixão circense

Pendura seu corpo no meu. Vamos às alturas. Ilumina o meu breu. Vamos ser circenses. Viver a paixão no picadeiro. Saia da minha cartola. Envolva-me em seus truques. Pula como se de mola. Atarraque-se na minha gola de palhaço. Cavalga no meu passo. Abusa das acrobacias. Pula no vazio. Causa-me arrepio. Encha a plateia – meus olhares – de alegrias. Estica a lona da ilusão. Dê por aberta a temporada da imaginação. Rola comigo pela serragem entre estrelas, bananeiras e cambalhotas. Beija-me de pipoca. E no alto do trapézio me provoca.


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28/03/2015 - Partes de mim

Meu pai entrava no meu quarto para ouvir Chico Buarque, Tom Jobim, Caetano Veloso. Minha vó criava tartarugas. Acostumei ver minha mãe com as mãos envoltas de linhas, botões e farinha. Meu avô era dono de histórias que me faziam viajar na imaginação. Minha bisavó foi posta num balão e sumiu pelos céus. Meus melhores e únicos amigos de infância e juventude foram lápis, borracha, papel. Meu primeiro cachorro, que não era meu mais do meu pai, chamava Bizuco. Minha avó me passava dentro de seu terço. Meus personagens sempre deixaram as páginas dos romances para conviver comigo. Meu professor de desenho não me deixava criar, só copiar. Meu avô, com seus olhos de catireiro, só me admitia um caminho: ser um homem bom. Meus pés sempre gostaram de pisar descalços na grama orvalhada, na terra fofa, nos botões de algodão que ficavam guardados na tulha. Minha vizinha tinha um mercadinho onde eu marcava tudo na conta de minha mãe. Meus animais de estimação eram cachorros, gatos, porcos, vacas, galinhas, pássaros... Minha tia queria me embebedar com geleia de pinga e licor de jabuticaba. Meu pai sempre me encantou com o barulho de máquina de escrever que fazia em meus ouvidos. Minha língua sempre foi a língua das árvores. Minha professora de inglês dizia que eu só ia aprender a língua quando deixasse de escrever as histórias em português na minha cabeça. Meu tio foi o maior piloto que já conheci mesmo só o tendo visto voar no chão. Minha mãe arrancava as folhas do meu caderno até que a lição estivesse do seu gosto. Meu irmão arrancava meus dentes e ainda fazia cara de santo. Meu pai me deixava caído com seus dribles desconcertantes no campinho do sítio. Muito da minha história foi escrita com terra vermelha. Minhas namoradas eram princesas de reinos distantes, estrelas que viravam mulheres, sereias de mares profundos que vinham flertar comigo e só eu via. Meus pés sempre foram de jabuticaba, manga, goiaba... Meus tios-avôs eram personagens de um enredo grego-mexicano, regado a dramas apimentados. Minha professora do ginásio me achava um ótimo escritor. Minha cachorra, chamada Kika, comia chocolate e pulava de cama em cama para tomar sol. Meu irmão fazia cidades inteiras com pecinhas de montar. Meu professor de violão gostava mais de comer os bolos e doces de minha mãe do que de me ensinar alguma coisa. Meus padrinhos de batismo nunca foram à missa comigo. Meu bisavô tinha um pé de groselha. Meu mundo sempre foi um mundo paralelo, feito de seres fantásticos, de criaturas encantadas, de lendas e magias.


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25/03/2015 - Pe(r)dição

Ela me pede um beijo, não dou. Ela me pede para ser seu super-herói, não sou. Ela me pede um abraço, passo. Ela me pede uma cena obscena, faço cinema. Ela me pede o proibido, dou como lido. Ela me pede um cachorro, corro. Ela me pede “não solta”, dou volta. Ela me pede resposta, dou as costas. Ela me pede em casamento, entrego ao vento. Ela me pede uma oportunidade, falo em saudade. Ela me pede uma dança, digo “não cansa?”. Ela me pede um sorriso, peço juízo. Ela me pede colo, amolo. Ela me pede estrada, dou em nada. Ela me pede atitude, fico amiúde. Ela me pede futuro, depuro. Ela me pede um sonho, proponho. Ela me pede tamarindo, vou indo. Ela me pede minha boca, chamo-a de louca. Ela me pede afeto, veto. Ela me pede para deitar em seus seios, volteio. Ela me pede um toque, digo “não provoque”. Ela me pede miragem, eu aragem. Ela me pede sementes, faço-me ausente. Ela me pede trégua, vou a léguas. Ela me pede choro, quebro o decoro. Ela me pede presença, peço licença. Ela me pede carinho, aninho. Ela me pede cumplicidade, dou realidade. Ela me pede desordem, sou pela ordem. Ela me pede casa, só tenho asas. Ela me pede um canto, espanto. Ela me pede cupuaçu, dou umbu. Ela me pede que a deixe descalça, vou numa valsa. Ela me pede o que não espero, faço-me bolero. Ela me pede mambo, sou tango. Ela me pede para me ver nu, desligo o abajur. Ela me pede companhia, dou poesia.


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20/03/2015 - Perdeu a graça

No céu não voa mais maranhão... No chão não se roda mais pião... Não se sabe mais pular amarelinha... Ninguém conhece a cor da joaninha... Quem ainda quer uma casa na árvore? Quem ainda sabe o que é uma árvore? Ninguém sobe mais em árvore... Corda já não bate mais na rua... Meia velha já não vira bola... Nem pó de giz tem mais na escola... Ninguém mais tem medo do bicho papão... Virou uma coisa só ser polícia e ladrão... Menina não quer mais cirandar... Menina não quer mais passar anel pra não casar... Criança já nasce crescida, decidida a não ser criança... Criança não quer mais ser astronauta, super-herói, pirata... Leite hoje em dia nem tem mais nata... Quem é que quer dormir com histórias de ninar? Quem é que ainda balança com cantigas de além-mar? Quem é que quer no tempo voltar? Pelos canteiros não tem mais pique-esconde... Não se vê mais nenhum visconde... Derrubaram os pés de fruta-do-conde... Ninguém mais precisa falar pelas bonecas... Hoje em dia é outra coisa ser sapeca... No céu não voa mais maranhão... No chão não se roda mais pião...


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06/03/2015 - Pássaro passa

Pássaro que é pássaro nunca deixa de voar. Nem a idade nem a tempestade nem a saudade fazem-no desistir de amar o céu. O pássaro nasceu para ficar suspenso entre a nuvem e o chão. O medo jamais é maior que o ímpeto pelo voo. O pássaro sabe que o verbo que o rege é o passar. O pássaro passa. É folha ao vento. É suspiro, jamais lamento. É onda no mar do esquecimento. O pássaro nunca sabe quando completa seu voo, por isso sempre precisa bater asas em busca do seu destino. E destino de pássaro é em pleno ar. É como um remetente à procura do destinatário. Pássaro não é peixe de aquário. Pássaro é o livre, o liberto, o libertário. Pássaro é breve, mas se atreve a ser infinito a cada voo. O pássaro é a envergadura do traço divino. O pássaro é a abotoadura do tempo, é o dobrar do sino, é o espanto do menino. Pássaro é o traço do criador em movimento. Pássaro é o braço da saudade acenando para a manhã de ontem ao encontro do amanhã. ...
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24/02/2015 - Por mais que doa me perdoa

Desculpa se eu não consigo me controlar, se estou carente, como copo vazio na mesa de um bar. Desculpa se tudo o que eu digo sai com farpas de um coração lascado por um grande amor. Desculpa se tenho ciúme de tudo e se diante do que faço fico mudo. Desculpa se trago lágrimas aos olhos que não são meus por não querer chorar sozinho. Desculpa se eu quero você mais e mais perto e se pra paixão não coloco um teto. Desculpa minha falta de limites para amar e querer. Desculpa por não ser morno, estando sempre em ebulição. Desculpa se dentro do peito trago um vulcão em permanente erupção. Desculpa se corto como tempo. Desculpa se eu me derramo em sentimento. Desculpa se sou um tsunami de emoção. Desculpa se eu vou além de qualquer compreensão. Desculpa se estrago o seu dia querendo melhorar o nosso. Desculpa se a distância não combina comigo. Desculpa se antes de partir quero viver tudo o que sonhei para nós dois. Desculpa se o meu ritmo lhe atropela. Desculpa se eu não sou de ficar esperando a tempestade passar debruçado na janela. Desculpa se por amor meto os pés pelas mãos, esquecendo por completo da minha metade razão. Desculpa se chego com espinhos por acreditar que as melhores flores nascem dos espinhos. Desculpa se para viver um amor intenso tão imenso quão o que quero é preciso sofrer. Desculpa pela minha alta voltagem. Desculpa por dar importância ao que pode parecer bobagem. Desculpa por nunca parar de querer quando o assunto é amor. Desculpa por discutir o que será indo além do que já é. Desculpa por lhe deixar maluca com minha intensidade. Desculpa se eu ofendo o seu deus por voar no sétimo céu. Desculpa pela minha imaginação tão abundante. Desculpa por esse romantismo alucinante. Desculpa por dizer a mais profunda verdade de tudo o que se passa em mim. Desculpa por já sentir saudade do que ainda não aconteceu. Desculpa se sou surdo ao óbvio, ao lugar comum, ao mesmo do mesmo... Desculpa se vou a esmo. Desculpa se por amor me faço sem começo e sem fim não aceitando ser meio, mas inteiro em tudo. ...
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17/02/2015 - Portela campeã

Respeitosamente, o mangueirense aqui abaixa o seu chapéu reverenciando a águia redentora ao tempo em que vai declarando Portela campeã do carnaval. Salve a majestade do samba, a maior das vencedoras, a carioca da gema, numa aquarela azul e branco, direto de Madureira, Portela, Portela, Portela... Do baluarte Paulinho da Viola ao verde-rosa Tom Jobim, o Rio passa pela janela da passarela foliã como arte viva, altiva Portela, da nobreza à favela, cidade-samba tão bela, Portela do ontem e do amanhã é hoje a minha campeã. A águia portelense abraça o Rio de Janeiro com asas pela folia de fevereiro tomando de conta do céu inteiro. Num tempero surreal, vem sem igual, arrancando gritos da arquibancada como gol no Maracanã, balançando as palmeiras do Jardim Botânico num amor oceânico, tremulando repiques terças de uma bateria que bota pra rodar a fantasia das baianas atiçando a chama da escola de samba na veia que volteia e rebola no balanço de quem ama. Os malandros-marujos de Oswaldo Cruz içam as velas, azul e branco na tela, da comissão de frente à velha guarda é Portela passando aplaudida, destemida e amada como num conto de fada.


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13/02/2015 - Pai João das Matas apareceu

Com bata e paletó branco, Pai João das Matas apareceu. Como amanhecer nas matas frondosas, calmo e intenso, Pai João das Matas apareceu. Com três colares coloridos de contas miudinhas, Pai João das Matas apareceu. Sobre a bata com três colares intercalando lilás e branco, vermelho e preto, laranja e azul, Pai João das Matas apareceu. Todo alinhado, de um modo impecável, Pai João das Matas apareceu. Pronto para caridade, Pai João das Matas apareceu. De chapéu de palhinha, de bordas desfiadas e fita iluminada, Pai João das Matas apareceu. Com olhares amadeirados, que nos olham por todos os lados, Pai João das Matas apareceu. De cabelos embranquecidos pelo tempo, Pai João das Matas apareceu. Com seu jeito sério e afável, Pai João das Matas apareceu. Irradiando cura, Pai João das Matas apareceu. Numa simplicidade de se admirar, Pai João das Matas apareceu. Como pai, avô, senhor, irmão, mentor, amigo, Pai João das Matas apareceu. Com porte nobre, na mais pura nobreza de coração, Pai João das Matas apareceu. Sem pedir nada em troca, Pai João das Matas apareceu. Como que vindo de tempos distantes, mas tão atuais, Pai João das Matas apareceu. Numa roupagem de preto-velho, Pai João das Matas apareceu. Numa presença forte, Pai João das Matas apareceu. Do alto de sua evolução, Pai João das Matas apareceu. Emanando amor, humildade e tolerância, Pai João das Matas apareceu. Com vontade de prosear, Pai João das Matas apareceu. Pra fazer chorar de emoção e alegria, Pai João das Matas apareceu. Numa figura de respeito e carinho, Pai João das Matas apareceu. Negro sábio, Pai João das Matas apareceu. Com bigode e barba de algodão, Pai João das Matas apareceu. Envolto de muita luz, projetado à frente de um sol simétrico, Pai João das Matas apareceu. Em um retrato de amor, Pai João das Matas apareceu. Como este menino aqui sempre sonhou, Pai João das Matas apareceu.


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08/01/2015 - Para perto de si

Chama-me para perto de si. Perdoa a minha distância e me aceita debaixo de sua saia. Chama-me para seus cuidados. Entoa nosso amor, novamente nosso amor, nosso amor mais que iluminado. Chama-me para seus sóis alaranjados. Deixa novamente minha vida se enroscar na sua. Chama-me de maldito, de bendito, deixa o dito pelo não dito. Desata o nó do meu coração. Chama-me para um último primeiro beijo. Faça todo e qualquer rito que leve à paz entre nossas bocas. Chama-me para romper o silêncio. Impeça que nossos retratos virem pó. Chama-me para velar o que ficou. Desista de tentar deixar o que não terminou. Chama-me de covarde. Venha me dar um sopro da sua coragem. Chama-me de pecador, mas não despreze um corpo que queima do seu mais puro amor. Chama-me para perto de si. E que tudo mais seja de repente, reticências e por favor.


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24/11/2014 - Perfume da memória

De vez em quando, sobe um cheiro de mato pelos confins do meu tempo. Perfumes de capim molhado, de raiz forte, de fruta madura vão se misturando pelo estradão das minhas memórias. Tudo vai ficando tão nítido e tão perto novamente de mim. É como se eu vivesse uma época que já não existe aqui do lado de fora. A essência da terra molhada vai calando lá no fundo das minhas lembranças. Numa chuva volto a ser criança, menino-sonhador. Fecho os olhos e vejo um latido fazendo festa, cheirando a cachorro molhado, chacoalhando a chuva que tomou. O galo canta limpo, como se a água limpasse sua garganta. As pererecas fazem festa, assim como os sabiás, bem-te-vis, curiós. O joão-de-barro já prepara a reforma da sua casa. A galinha chama os pintos pra debaixo de sua asa. A pitanga, o caju, a jabuticaba vão ganhando ainda mais gosto no pé. O vento vai regendo a perfumaria. Um balé de cheiros entranhado no meu temporal que a chuva, outra vez, coloca em pleno movimento.


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