Daniel Campos

Poesias

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Encontrados 2480 textos. Exibindo página 226 de 248.

Soneto confuso

O vasto silêncio atirado ao vento
Diz tantas coisas sem querer dizer
O infinito esquece o nosso momento
Num longo gesto sem se perceber.

E pelas ruas abstratas e vazias
Onde se busca não querendo achar
Esconde-se a bandida nostalgia
Que traz o que não é para se lembrar.

Se só há valor no que não se tem
Nossa vida se resume a saudade
Mesmo a verdade não sendo vontade.

Dúvida de todos e de ninguém
A razão nos emudece a resposta...
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Soneto contorcionista

Dobra suas pernas e inclina a coluna
Um, dez ou vinte ângulos para trás
Distenda-se e respire fundo em paz
Correndo seu mundo em cada lacuna.

Solte o ar devagar zomba tomba e vira
Colocando o cabelo em queda livre
E de ponta cabeça, ama em declive
E suspira e gira e pira e transpira

Um arrepio frio que corre ao contrário
Pelas suas costas e abraça suas pernas
Tal qual uma escultura pós-moderna

Distorce e se contorce num aquário...
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Soneto costurado

Entre o pecado e o passado há um vão
Por onde passa a linha do desejo
Que costura o mel no papel dum beijo
Na boca macumba de um coração

Mas o beijo foi feio a luta não veio
O astronauta tropeçou caiu no espaço
São jorge bateu no dragão de reio
E o lábio de tricot se fechou em aço

E zanza acolá alinhava de cá
A agulha alinhava e cava sua boca
E zanza dali e vai como uma louca

Em um eu te amo na língua iorubá...
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Soneto cuidadoso

Cuidado, olha pra trás, olha pro lado
Eles estão na porta a tua procura
Cuidado, não tem reza não tem cura
Eles ainda vão te pegar, cuidado

Olha pro lado de fora do muro
Eles estão lá, eles vão te morder
E vão te prender, vão te entorpecer,
Fazer-te sofrer. Aqui não é seguro

Corre se esconde debaixo da cama,
Em cima da árvore no meio da lama,
Por entre a saia azul da dama estelar

Corre dos caçadores dos que amaram...
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Soneto da amora

Ai, chora que o beijo dela é de amora
Mancha a alma e bem demora seu esquecer
Chora antes que alguém te mande sofrer
Chora a menina pequena foi embora

Do quase namoro e toda a cidade
Canta e canta em coro que foi traição
O que a menina fez da tua ilusão
E agora chora, ai chora sua maldade

O beijo roxo e doce ficou amargo
O vão entre teus braços ficou largo
E a tua comédia virou um bangue-bangue

Sai pelo velho oeste como o bandido...
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Soneto da boiada de poeira

Lembro do gosto da terra vermelha
A estreita estrada face um arvoredo
Meus pés trilhando sob cacos de telha
E o orvalho dizendo que ainda era cedo

Seguia como o maestro de uma boiada
Na cabeça, os nós da palha chapéu
Presa à mão, uma varinha improvisada
E ao lado, a réstia de cães seguia ao léu

Serpenteávamos em procissão
De passos, de olhos, de medos, de gritos
Aboios de ventania sem direção

Hoje o chapéu é fogo de palha triste...
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Soneto da continuidade

Das mãos unidas fez-se sem alcance
O que sem controle escorreu em teu dorso
Na promessa de ter sido só o esboço
Das tantas laudas do nosso romance.

Ah! Se houver amor, mata teus medos...
Deixa quiçá o desespero da ausência
Dos nossos beijos... Confia na sentença
Que irá nos acorrentar sem segredos.

Fazer valer o que sempre foi válido,
Eis o Superior Tribunal do Amor
Que faz o sol em nós não se pôr pálido.
...
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Soneto da conversa fiada

Quando a noite chegar para dormir
Cansada das minhas fiadas conversas
Hei de ser como trovador que versa
O adeus, dois, três dias antes de partir.

No instante em que pousar os cabelos
De estrelas no travesseiro de plumas
Hei de trilhar no lombo de um camelo
Os caminhos desertos de quem ruma

Na imensidão vazia de um amor árido
E caem na tentação da flor de pedra
Que bela, de adeus o destino empedra.

Hei de abortar o desejo mais cálido...
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Soneto da correria

À procura da dona da tua vida
Corre torto e aporta no cais do porto
E desamarra os nós de uma partida
Rumo ao mar-adentro coração. Morto,

Ártico ou, índico ou mediterrâneo
Iça âncoras, velas, queime carvão
E atravessa os corais do subterrâneo
Rumo à ilha dos náufragos da ilusão

Tenha a lua no mar e o sol no iceberg
O destino é avante, sonha e navegue
Consulta estrelas, bússolas, desvia

De tudo o que estiver posto nos mapas...
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Soneto da desesperança

Ó tempestuoso céu a esbravejar
Em loucos urros ensurdecedores,
Eu fiel sonho sonhador a sonhar
Sobre o corpo íntimo meus temores.

Raia os raios e se põe o ventre a cortar
Num último parto de ódio e desejo
Onde os anjos caídos terão lugar
E o pecado à morte cederá um beijo.

Imploro em teus pés céu da escuridão
Cuspa-me sonoras lanças em chamas,
E traga o amor na ponta de um trovão.

Varra a solidão com seu vento norte,...
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