Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 288 de 320.

10/05/2008 - Mendigos, doutores e Nerudas

Dormia no concreto barulhento dos viadutos, no ladrilho da estação do metrô, nas pedras da calçada que se espalham em feitio de ondas pelo caminho sem destino. Ele se chama doutor Raul de Medeiros Pontes de Alcântara Machado. Doutor? Medeiros Pontes de Alcântara Machado? Os boquiabertos que me desculpem, mas Raul é um dos quase dois por cento de brasileiros que se sentaram nos bancos de um curso superior e acabaram nos bancos da praça.

Foi parar na rua em razão de uma desilusão amorosa. A mulher que tanto amava foi embora sem dizer nada. Quando ele chegou em casa, depois de um dia exaustivo de trabalho no consultório médico, não viu mais as roupas, os perfumes, as jóias dela. Havia partido para sempre. Fez alguns telefonemas, inclusive para a polícia, mas nada. Havia sumido sem deixar rastros. Doutor Raul bebeu garrafas de uísque com pedras de gelo feitas de seu próprio choro. No outro dia, já não foi trabalhar. No outro dia, já não sabia o que fazer. No outro dia, decretou a própria morte....
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09/05/2008 - O desejo por detrás do paladar

Há gostos que não saem da boca. Eles adormecem, quase se esquecem, mas continuam lá pulsando desejos e vontades. Pois bem, estava eu em casa dia desses, quando o telefone tocou. Era dona Ofélia, minha avó. Do outro lado da linha, caminhava no cotidiano, quando, de repente, um meteoro caiu na minha cabeça. Poeticamente falando, é claro. E tudo isso porque ela me contou que acabara de tomar leite gelado com groselha. Pronto! Foi o bastante para me dar urticárias.

Naquela noite havia groselha, mas faltava leite em casa. Isto é, tinha leite de soja e leite em pó, mas não serviam para aquela receita. Era preciso leite de vaca. O jeito era esperar. E que grande bobagem tudo isso, afinal não sou mais criança. O que era ficar mais algumas horas sem a tal bebida? Devo confessar que praticamente não dormi pensando na tal mistura. Minha boca salivava daquele gosto passado. No outro dia, como se diz lá no interior, matei minha lombriga. Tomei logo dois copos de tirar o fôlego. ...
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08/05/2008 - V de vitória

"Ayrton Senna vem passando, completa 70 voltas. Aí vem Senna, é a volta de número 71, é o Brasil na frente. Aí vem Ayrton Senna. Aí Ayrton Senna na metade da última volta. Ele já viu a câmera posicionada e fez um sinal de 'v' de vitória. Aí vem Senna, o Brasil na frente. Ayrton Senna está no S, Ayrton Senna vai pro Bico de Pato. Bandeiras verde-amarelas agitadas em todo o circuito. Ele dá um tchauzinho pra câmera. Últimas curvas para Ayrton Senna. Ele vem pela subida. Mihali Hidasi aguarda com a bandeira quadriculada. Aí vem Senna na reta. É o final da prova. Ayrton Senna na ponta dos dedos. Ayrton, Ayrton, Ayrton Senna do Brasil. Ayrton Senna do Brasil. Ele pega a bandeira, repete o ritual. Aí Ayrton Senna, vai a loucura a arquibancada em Interlagos..."...
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07/05/2008 - Gatos, gatos e mais gatos

Depois de ler a notícia de que 300 gatos mortos foram encontrados em três geladeiras quando a polícia revistou a casa de um homem no norte da Califórnia (EUA), lembrei-me da mulher de Tio Antero que também criava centenas de gatos. Tio Antero, na verdade, era tio do meu avô materno. Morreu há uns três anos, mas não foi em razão de seus inúmeros cigarros de palha. Tio Antero era uma figura curiosa, só andava de branco. Calça branca, camisa branca, chapéu branco. Mesmo no final dos 80 anos conservava um charme colonial....
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06/05/2008 - Um ato de fé

Carlos Drummond de Andrade já dizia que a confiança é um ato de fé, e esta dispensa raciocínio. O poeta estava certo. Confiar vem do latim con fides, isto é, com fé. A confiança, portanto, é uma questão de fé. Para além do universo da regilião, a fé é um exercício dinâmico de coragem. E coragem, como o próprio nome diz, é ter o coração na ação. Mesmo o coração tendo razões que a própria razão desconhece, com ele à frente superamos até o impossível.

Mas por que toco neste assunto? Simples, muitas vezes queremos mergulhar fundo em um projeto, mas nos falta confiança. Temos medo de nos entregar, de corpo e alma, a uma causa. Resultado: ficamos de pé atrás com a vida. E não há nada pior do que ficar neste estado. Tornamo-nos inseguros e tristes e a vida, por sua vez, emperra. Como é bom ver aquela criança que corre de braços abertos em direção à mãe ou ao pai, com a segurança de se jogar neles com a maior felicidade. Com o passar dos anos, o mundo nos endurece a tal ponto que essa cena deixa de existir. ...
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05/05/2008 - Béééééééé!

A nossa política financeira anda em ritmo de tartaruga, cochila feito urso em período de hibernação e tem o ânimo de uma preguiça. A nossa política monetária, com os maiores juros de todo o mundo, é puramente recessiva e vive para restringir investimentos e o consumo baseado em crediário. A nossa política fiscal é absurda a ponto de não permitir expansões como em países civilizados. A política cambial é uma ilusão, posto que tenta, a uma preço alto, manter o câmbio valorizado, prejudicando, sobretudo, a indústria e a agricultura....
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04/05/2008 - Com vocês, o rei...

Menino sonha cada coisa. O menino Daniel sempre sonhou com reis e princesas. O tempo passou, o menino cresceu e não deixou o sonho para trás. Em um belo dia, o garoto torceu para que monarquia fosse o regime vencedor de um plebiscito. Para infelicidade geral do jovem, o sistema de governo escolhido foi o presidencialismo. Esse mesmo que está em uso na atualidade. O adolescente cresceu ainda mais e se tornou um homem, mas o sonho de viver em um país regido por um rei não acabou.

Pudera... o menino sabe, como ninguém, que o presidencialismo é uma ilusão. Afinal, a idéia é de que qualquer um pode ser presidente (ao contrário dos reis que precisam ter sangue nobre). No entanto, está mais que comprovado que o povo não chega aos palácios. E se, por algum tropeço do destino, chegar... pouco tempo depois não é mais povo. Parece feitiço ruim, mas o palácio transforma plebeu em rei. E se for para ter rei sem classe, é melhor ter um monarca de verdade. ...
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03/05/2008 - Quero uma cama no meio do nada

Quero uma cama no meio do nada. E que esse nada tenha, ao menos, algumas palmeiras para ofuscar o sol. Que o silêncio deste nada cante o som de um riacho correndo ao fundo e, vez ou outra, de alguns grilos por ente a terra molhada. Ah! É essencial que a terra esteja recém-umedecida por uma chuva lenta. E que haja um pouco de mato florido para perfumar isso tudo. E se não for pedir demais, quero um canário e um cavalo. Esses serão meus únicos dois luxos. Enquanto o canário estrala forte, o cavalo galopa manso na imensidão. ...
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02/05/2008 - O último suspiro liberal

Depois de ter arrasado as economias dos países menos desenvolvidos e aumentado as desigualdades sociais de forma gritante, intelectuais apregoam o fim do neoliberalismo. Começa a se colocar em xeque a noção de que o mercado seria capaz de equacionar sozinho o problema do desenvolvimento das nações.

A questão chave: "o que substituiria o neoliberalismo?", traz-nos diversas perguntas: Estaríamos diante de uma nova fase do desenvolvimento capitalista? Seria possível retomar o desenvolvimentismo econômico com um Estado interventor? Outra possibilidade é a de que seria esse o início de um período de transição que poderia desembocar em algo novo, numa sociedade pós-capitalista, mas de que forma isso aconteceria? Através de uma ação política? Através de movimentos não governamentais? São todas essas questões que devem ser levadas em consideração na busca de alternativas para o modelo pós-neolibral. ...
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01/05/2008 - De luto

Amanheço de luto. Amanheço em busca de uma manhã de domingo. Amanheço com um gosto de champanhe na boca. Amanheço nas retas sem fim de um pesadelo. Amanheço sem vontade de levantar. Amanheço e enxergo um rosto de olhar longínquo e boné azul como que querendo me dizer alguma coisa. Amanheço ao som de motores de doze, dez cilindros roncando alto. Amanheço rezando por chuva e pelo rei da chuva. Amanheço ao cheiro de pneu queimado. Amanheço buscando o amarelo riscado de verde e azul de um capacete. ...
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