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Encontrados 60 textos de abril de 2015. Exibindo página 6 de 6.
05/04/2015 -
O sacrifício do coelho
E se o Coelho da Páscoa se apaixonasse
Numa paixão que o arrebatasse
Os ovos de chocolate seriam destinados
Todos, todos, todos, à coelha amada
Triste sina desse coelho
Que para levar a Páscoa ao mundo
Precisa negar seu sangue vermelho
Fugindo do amor raso e profundo
Porque nunca se sabe onde está
A paixão que o faria largar sua missão
De criar e entregar ovos à civilização
Simbolizando paz e ressureição
Quando seu coração está vazio...
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05/04/2015 -
Desarranjo
Tem dia em que tudo aparentemente está no lugar de sempre, mas a sensação é de completo desarranjo, como se os demônios estivessem no corpo dos anjos. Uma estranheza nasce em cada canto, mesmo onde a beleza parecer reinar absoluta. O desencanto do desespero de ver tudo ali e ao mesmo tempo não ver nada do que queria ver. Você coloca um bolero de Ravel e o rádio toca tango de Gardel. Você fala, fala, fala, e até grita, mas nem você se escuta. Uma coisa maluca vai embaralhando seu rumo, deixando tudo e todos fora do prumo, quando na verdade é você que perdeu o equilíbrio caindo da corda do destino, rompendo a fronteira entre o real e o surreal, tendo um pé em cada mundo, enxergando o chão, mas tendo a certeza de que nada ao seu redor tem fundo. Você está rodeado e tão só porque tudo o que o rodeia já virou pó. O passado dá um nó e o futuro é o futuro e só, ainda não chegou e talvez nem chegará até você. Por quê? Porque o futuro é o futuro e só. Nada além de uma projeção, de um sonho, de uma ilusão como tudo o que o rodeia é fantasia, pois já aconteceu um dia e não mais acontecerá. Será que a teia existe ou é projetada pela aranha para que ela possa flutuar sem causar assombro? Será que tudo o que juntou lhe conforta, ou na verdade não mais importa, é só escombro? Não dê de ombros pra saudade, pois você nada mais é do que saudade. A realidade, na verdade, é antirealidade, você luta a todo instante para existir, como muito ao seu lado já não existe mais e você finge que está tudo certo, tudo em paz. Você luta de forma alucinante para não sumir, como já sumiram tantos, mas se convence de que isso não lhe causa espanto e se põe a seguir de encanto em encanto, com o coração vendado e de mãos dadas com o futuro-do-passado.
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04/04/2015 -
Moleca
Boca de gangorra
Que me sobe e desce
Olhares de carrossel
Rodando ao meu redor
Língua de escorrega
Pernas de trepa-trepa
Costas de tobogã
Tantos pensamentos
De chapéu mexicano
Coração de pelúcia
Ou de montanha russa
Pés de pular amarelinha
Do inferno pro céu
Olhos de bolas de gude
Braços de iô-iô
Mãos de plantar bananeira
Corpo de fazer estrelinha
Menina arteira
Acende a fogueira...
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04/04/2015 -
À varanda dos meus olhos
À varanda dos meus olhos vem sol, vem vento, vem poeira, vem chuva, vem menina moça, vem rosa vermelha, vem manhã limpa, vem tarde turva, vem clarão, vem cometa, vem perfume, vem procissão de estrela, vem luz de toda parte, vem sombra também, vem arte, vem um leque de sabores da infância, vem uma sequência de notas de ré, de fá, de mi-bemol, vem pardal, vem vira-lata, vem lua, vem canção, vem dama de tafetá, vem sementeira, vem fogueira de Pedro, de Antônio e João, vem embarcação, vem aceno, vem onda de mar distante, vem fiapo de manga, vem nódoa de jabuticaba, vem paina, vem drible, vem água-de-coco, vem horizonte, vem morro, vem nuvem, vem beijo endereçado ou não, vem cabelo, vem silhueta, vem folha de árvore, de anúncio , de poesia e de manjericão, vem lembrança, vem expectativa, vem a oitiva do tempo, vem átomo e universo, vem com vergonha e sem pudor, vem vestida e pelada, vem saudade, vem tempero, vem vela, vem jardim, vem outono, vem rio, vem encantaria, vem seresta, vem moda, vem papel, vem sapato e pé descalço, vem cetim, vem clarim, vem flautim, vem preguiça, vem malícia, vem molejo, vem sal e açúcar, vem um agrupamento de óleos e outros olhos, vem valsa, vem bolero, vem quero-quero, vem onça-pintada, vem garra, vem bico, vem asa, vem flor, vem chama, vem balão, vem asa-delta, vem saia, vem anel, vem faísca, vem chá, vem ladeira, vem pintinhas, vem manha, vem malemolência, vem compota, vem capim, vem fotografia, vem mensagem, vem trovoada, vem causo, vem nevoeiro, vem cantiga, vem pipoca, vem maçã-do-amor, vem algodão-doce, vem andorinha, vem mago, vem nave-espacial, vem princesa, vem sereia, vem rainha, vem cavaleiro, vem coração alado, vem formiga, vem alecrim, vem flor de sabiá, vem o verso do mundo pra mor de eu espiar.
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03/04/2015 -
Viajando no silêncio
Transmuta do grito ao silêncio. Diminua o volume da televisão, a altura da voz e os repiques do seu coração. Pisa mais leve, de preferência descalço para não haver barulho de solado ou salto e tomando o solo feito de via-crúcis e pranto passado como sagrado. Repara como até os pássaros diminuem hoje a cantoria e a rua de agora não é como ontem se via. Repousa as cordas do violão, observa como os trens chegam quietos na estação, ouça a voz da solidão. O andor da quietude passa e pede respeito. Nada de palavrão, de berreiro, de exaltação... Hoje o amor que perdura por milênios passa em procissão. Porém, nada de se fazer sofrimento, de ser morada de tristeza, de remoer a morte... O silêncio, além de ser uma emanação de respeito, leva-nos para além do tempo a um aprendizado: o que é amar? Solidarizar-se com aquele que foi crucificado há dois mil anos não é passar o dia chorando, mas amando.
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03/04/2015 -
Gaia
Gaia
Raia
No céu
Arraia,
Aroma
De uvaia
E o véu
Ao vento
Engoma,
Toma vaia
Da tristeza
Ao se casar
Com o mar,
Desfruta
Da beleza
Tal fruta
A madurar
No tempo,
Tal truta
No templo
De sal e doce,
Gaia
Delicadeza
Que Maia
Trouxe
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02/04/2015 -
Pagode caipira
Formiga que não sai de casa não cria asa
Água que move pá não volta pro mesmo lugar
Violão de sete cordas já tá bom pra cantar moda
Namorada que bota reparo não vai pelo faro
Quem não é prefeito também dá o seu jeito
Laranjeira que dá limão não faz suco azedo não
Menina que dá encanto leva de volta o quebranto
Enquanto tiver coração, cacho de banana não madura
Em estrada que vai e vem anda o mal e anda o bem
Grito de urso com fome ou que não dorme corta soluço ...
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02/04/2015 -
Sofrimento transcendental
Semana Santa não tem como não ter aquela levada de tristeza. O que o vento da Sagrada Paixão toca vira dor. O tempo ganha um silêncio natural. O céu fica encoberto, mesmo em dias ensolarados. A cor da vida sai de cena um pouco, deixando tudo mais desbotado. A cidade se aquieta. O peito fica cheio de nós. A beleza nasce doída da angústia. Até os animais mudam de comportamento, ficando cabisbaixos. Mais de dois mil anos depois as feridas ainda sangram, os pontos arrebentam e uma sensação de culpa cobre a nós todos. A dor é latente quarta, quinta, sexta-feira... E vem uma ausência, uma falta de não se sabe o quê, uma saudade indefinida. Há soldados romanos marchando por todos os lados, fora e dentro de nós. Há traições e negações de onde menos se espera. Todas as estradas da Semana Santa parecem levar ao Calvário. As nuvens chegam a chorar uma chuva fina. É como se os senhores das trevas andassem sem medo algum pelo mundo de meu Deus. Uma semana que demora a passar. Vamos queimando como velas. Provações à parte, cabe a nós, filhos do tempo, manipularmos todo esse sofrimento transcendental transformando-o num amor incondicional. ...
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01/04/2015 -
No meu interior
Lá no meu interior do interior do mato
Carne é embrulhada em jornal de ontem
Verdura é trazida orvalhada pelo carroceiro
O copo vazio vai pro pasto e volta com leite
A dona do mercadinho anota pra mãe da gente
As frutas são comidas diretamente no pé
O capim exala um perfume inconfundível
O jardim velho tem maçã-do-amor e churros
As ruas do centro são de paralelepípedo
Cedinho tem pão bengala no cesto de bambu
O frio é espantado no rabo do fogão a lenha...
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01/04/2015 -
Garapa
Depois da tradicional macarronada com aquele bife esfregado no fundo da frigideira, com direito a refrigerante de maçã e pudim de padaria feito em casa, dona Ofélia nos levava para o quintal de sua casa que mais parecia um bosque, com direito a um pouco de tudo, de pitangueiras a pessegueiros, de macieiras a pés de erva-doce, de coqueiros a salsinhas, de gengibres a jabuticabeiras, de mimos de todas as cores a hortênsias, de violetas a orquídeas, de cebolinhas a tomatinhos, de arrudas a poejos, de folhagens a ramas, achávamos feixes da mais doce cana-de-açúcar. Seu Antônio ficava só olhando, meio que fazendo sala com a família, enquanto sua mulher há mais de cinquenta anos passava a mão no facão amolado na pedra e desbastava aquela cana arroxeada. Em tempo, tiramos de um quartinho cheio de tralhas, que pertenciam à coleção de achados e perdidos de seu Antônio, um pequeno engenho pintado de verde claro. E daí começava a brincadeira para moer aquela cana extraindo a mais pura garapa, cujo cheiro atraia abelhas e beija-flores. Os copos eram distribuídos para quem se aconchegava num banco de Kombi ou num improvisado feito de saca de cimento endurecido, ou ainda em cadeiras de madeira do tempo da bisavó. A festa valia a bagunça, de modo que todos, naquela simplicidade, ficavam satisfeitos com o pouco que na verdade era muito.
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