Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 31 de 320.

20/01/2016 - Força maior

Não vendo mais champanhe em seu copo ela saiu bebendo estrelas. Tropeçou em paralelepípedos portugueses achando que se enroscava nas pernas de Fernando Pessoa. Trocou versos com a noite escura e saiu pela lua como se nela pudesse vê-la. Andou, girou, cantou e amou bêbados, mendigos e prostitutas como se amasse os seus. E ao olhar para o mar de ressaca viu o reflexo de Deus no seu rosto marcado de tanto apanhar, e se dar e se machucar por acreditar no outro. Foi, sem querer, entrando num conto solto e sem final, entre a realidade e o surreal. Quando o sol deus as caras ela estava sem salto, sem vestido, no asfalto, despida e desprovida de qualquer lembrança. Era apenas uma criança crescida chorando e se buscando com gemidos ecoando em seus ouvidos.


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19/01/2016 - Música de chuva

Em dias assim, chuvosos, nada é melhor do que acordar com Tom Jobim salteando pelas brancas e pelas pretas em arranjos de puro frescor. E, sem mais, tomar café com Vinícius de Moraes sentindo cada célula se apaixonar ainda mais como se isso fosse possível. Ver Bethânia surgindo radiante como um raio de Iansã e ouvir Alcione bradando por entre as nuvens tal um trovão que arrepia até a alma.


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18/01/2016 - Silêncio, samba e amor

Silêncio. Ninguém bate tambor. O surdo ficou mudo. O piano fechou. O conjunto de cordas do violão arrebentou. Silenciou-se tudo. O riso, a flor e o amor. A banda se calou quando o cortejo passou levando o corpo da saudade que ainda arde em silêncio em nossos peitos, com todo respeito, de um quê perfeito que se eternizou. O sentimento chorou em silêncio. O vento nos embalou em silêncio. O firmamento desmoronou em silêncio. E a paradinha da bateria da escola dos corações apaixonados durou mais tempo do que se imaginou.


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17/01/2016 - O trem do dia

O trem do dia vem vindo pela serra do bem-vindo. Vem todo lindo, feito de ferro e fuligem. Vem serpenteando pelos barrancos de dar vertigem. Vem com seu Arlindo e seu Olindo e seu Gumercindo. Vem convergindo para chegar ao destino entre apitos de menino e aflitos de coração. Vem tomando impulso pelo vento do ribeirão. Vem de lata chamando atenção dos vira-latas de plantão. Vem descendo, vem crescendo, vem florescendo como flor que aparece na estação. Vem sendo esperado por uma pequena multidão. Vem correndo e vigiado pelo gavião. Vem vindo, chegando e sumindo, das vistas num clarão. Vem no sacolejo, no relampejo, no beijo de um amor sobre trilhos que a cada curva tem um filho. Vem fazendo revoada de passarada com seu barulhão. Vem com a força de um trovão. Vem chegando, se mostrando, se dando, pouco a pouco, o trem do dia entre a realidade e a fantasia, entre a lógica e a emoção, entre o que se vê e a imaginação.


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16/01/2016 - Canto assim

Há quem cante no chuveiro. Quem cante pra espantar o mal. Quem cante para inventar um outro final. Quem cante de boca, de peito, de corpo inteiro. Quem cante na rua, no telhado, debaixo do coqueiro. Há quem cante afinado, compassado e que cante zumbido como num vespeiro. Há quem cante de amor e quem cante achando que é cantor, compositor, trovador... Há quem cante por dinheiro, por aplausos e por equilíbrio.

Eu canto, eu vibro, eu liro quando respiro a canção que vem de dentro como um unguento para o mal do silêncio. E muito silencio fazendo da quietude meu cio. ...
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15/01/2016 - Peça da memória

Fruta do pé tem gosto de infância. Meus pés correndo pelas terras orvalhadas de uma chuva que invernava bem uns quinze dias. E as frutas, colhidas na hora, tem gosto, cor e cheiro maduros. Comer de se lambuzar. E a fartura, na cabeça criança, é de que aquele pé tem mais frutas do que se pode comer. Tira uma, nasce outra. Mágico. Lá se vão os anos e sempre que possível a memória me prega uma peça e me traz um perfume, uma textura, um sabor, um tom daquela época. Volto no tempo. Divirto-me novamente numa intensidade infantil. E depois sobra na minha boca um gosto indecifrável de saudade.


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14/01/2016 - Indo de tudo quanto é jeito

Se eu for de caminhão, chegarei ao final do estradão. Se eu for de asa-delta vou até onde o vento quiser. Se eu for de nave espacial preciso, antes de tudo, aprender a língua dos extraterrestres. Se eu for a pé posso me perder em alguma mulher. Se eu for de balão não será mais inédito dar a volta ao mundo. Se eu for de submarino posso encontrar cidades perdidas, galeões assombrados e criaturas desconhecidas. Se eu for de cipó pode ser que eu chegue só à metade do caminho. Se eu for de ponto em pesponto que coração servirá de linho? Se eu for de espinho em espinho chagarei perto da rosa a ponto de eu pular e desfolhar seu cálice perfeito. Se eu for de jegue para tudo dá-se um jeito. Se eu for cortando caminho perderei o melhor, com certeza. Se eu for de trem eu alcançarei a realeza. Se eu for de bicicleta eu pedalarei sozinho. Se eu for de barco eu me darei à correnteza. Se eu for nos olhos das mulher amada verei o que quero e o que não quero. Se eu for pela boca da mulher desejada eu, na primeira oportunidade, me jogarei ao coração. Se eu for pela saudade aí andarei em círculos e não há de prestar mais não.


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13/01/2016 - O bom da vida é perfumar

Perfuma o seu dia, o seu corpo, o seu lar. Perfuma a sua vida, a sua rua, o seu destino. Perfuma a sua boca, o seu coração, o seu caminho. Perfuma o seu lençol, a sua jardineira, o seu ganha pão. Perfuma o seu sonho, a sua vontade, a sua oração. Perfuma deixando seu cheiro por onde passar. O bom da vida é perfumar. Perfuma para lá, perfuma para cá, vamos perfumar. Perfuma a moça, o velho, a senhora, o menino, perfuma a louça, o violoncelo, o agora, o mezanino, o sótão e o porão. Perfuma de amor tudo e todos para não dar confusão. Perfuma os pés da santa, as águas de Iemanjá, perfuma e encanta por onde trilhar. Perfuma para cima e para baixo, por tudo quanto é lado, presente e passado, sem esculacho ou embaraço, perfuma porque o bom da vida é perfumar. Perfuma, perfuma, perfuma como quem dança, lançando esperança e fantasia, alegrando o dia, noite e dia, por onde estiver, venha o que vier, perfuma o quanto puder. Perfuma o cachorro, a ladeira, o morro. Perfuma a fogueira, o quarto, o parto. Perfuma a comida, o abraço, o passo. Perfuma porque o bom da vida é perfumar. Perfuma eu, perfuma você, perfumamos nós, lálálá, vamos perfumar. ...
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12/01/2016 - Indo longe

E ela dançou, dançou, dançou até fazer vendaval e sair de pernas dadas com o vento para algum lugar do espaço sideral. E ele acreditou que a terra tinha fundo e cavou, cavou, cavou tão profundo que achou o oco do mundo. E ela pensou que a lua fosse de mel e procurou, procurou, procurou e não achou abelhas lunares, mas encontrou a rainha de Antares. E ele idealizou o amor perfeito e sonhou, sonhou, sonhou até acordar numa paixão desenfreada vendo na mulher amada sua loucura materializada.


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11/01/2016 - No mesmo ponteio


O lobo uiva à lua. O faroleiro murmura às ondas. O pirata cantarola às estrelas. O lavrador conversa com a plantação. O menino fala com o cachorro. E a senhora fica de prosa com o tempo. O moço troca palavras com o vento. A garota confessa ao diário. A aranha toca as cordas da sua teia como o violeiro tateia sua viola em noite de lua cheia inspirado pelo lobo que uiva, pelo faroleiro que mareia, pelo pirata da barba ruiva que serpenteia pelo mar das constelações, pelo lavrador que semeia histórias, pelo menino que troca memória com o cão, pela senhora perdida no tempo da imaginação, pelo moço que de solidão troca com o vento, pela garota que escreve sentimento, pela aranha que se amarra na própria teia e pela sua própria mão que mais parece uma garra de lobo quando a lua clareia a viola e sua peia. E o cavaleiro, até então sumido, relampeia, serpenteia e apeia no terreiro como sombra na lua que de desejo incendeia. E o pássaro preto, no viveiro, gorjeia. O uivo e meio, o galope que não veio e o gorjeio no mesmo ponteio. ...
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