Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 30 de 320.

30/01/2016 - Machismo

Mulher, hoje tem jogo, então bota mais feijão no fogo. Mulher, hoje tem futebol, então nada de novela ou besteirol. Mulher, hoje tem pelada, então nada de me olhar com esses olhos de trovoada. Mulher, hoje tem carnaval, então faça de um jeito especial. Mulher, hoje tem festa, então não seja ciumenta, possessiva, indiscreta. Mulher, hoje tem feijoada, então nada de fazer cara de enjoada. Mulher, hoje tem Maracanã, então fique sabendo que eu só volto de manhã. Mulher, hoje tem festejo, e em dia assim fico tinindo de desejo. Mulher, hoje tem roda de amigos, então nada de brigar comigo. Mulher, hoje tem bate-bola, então não vem com isso e aquilo, ai ai não me amola. Mulher, hoje tem bloco na rua e eu vou, já você, fica em casa, com suas asas e toda nua, porque quando eu chegar, ai ai, você vai gostar.


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29/01/2016 - Te amo assim, assim

Eu não queria que você soubesse, mas eu te amo. Não conta para ninguém, por favor, porque eu tenho vergonha e medo que não dê certo. Eu não sei lidar com o amor, mas clamo por ele toda hora. Ai, e agora, queria tanto que desse em algo bom. Pode ser maluquice, mas já escuto o som, já vejo a cor, já sinto a textura do amor. Ai, meu deus, pelos cupidos de Orfeu, que loucura. Que sentimento é esse que vem e a gente não segura. Parece que todo dia é primavera, que a cada pulsação inauguramos uma nova era, que o mundo gira em torno dessa espera, espera que tudo isso valha à pena. Eu já dei de escrever poema, querer filme de ficar agarradinho, fazer comidinhas que combinem com velas e estender meus olhos pela janela buscando rever o amor, que chegou sem avisar, sem pedir licença, sem se desculpar ou perguntar se eu queria mesmo sua presença em mim. Foi chegando e se instalando e me dominando de um jeito que eu fiquei sem jeito de dizer não. E agora, entre a paixão e o amor, eu não sei mais o que fazer. É só me entregar, é só me render, é só me querer ao seu lado. E que o futuro seja mais que o passado, porque até ontem não havia você e agora hoje está tão presente como buquê na mão da noiva, como mel no corpo da abelha, como centelha na estrela, como uivo na boca do lobo, como lótus no lodo. Você chegou e colou em mim e ficou e se alastrou como erva-daninha no jardim, como fogo de querubim. Eu não quero que nada disso tenha fim, embora eu não te conheça eu já sei de você tin tin por tin tin. Que tudo saia do preto e branco, desse sépia, desse descorado e seja carmim. Eu não queria que você soubesse, mas eu te amo assim, assim... ...
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28/01/2016 - Viração

Vira a página, o dia, o mês, o ano. Vira na cama, na esquina, na estrada. Vira o destino, o itinerário, o mapa. Vira a vida de pernas para o ar. Vira o que deseja. Vira o copo. Vira o corpo. Vira o olho. Vira o mundo de cabeça para baixo. Vira o ponteiro do relógio, do volume, da temperatura. Vira rotina. Vira romance. Vira realidade a ilusão, o sonho, a fantasia. Vira causo a história. Vira flor a semente. Vira asa o ninho. Vira água o que era pedra de gelo. Vira abandono o que não se cuida. Vira saudade o que já se vai longe. Vira o vento fazendo curva, trazendo chuva. Vira verso. Vira música. Vira livro. Vira lição o que se aprendeu. Vira caminho o que se percorre. Vira fé o que se acredita. Vira príncipe o sapo. Vira pó a carne. Vira mar o rio. Vira amor a paixão, ou não. Vira, vira, vira... O que virá da viração?


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27/01/2016 - Gosto inédito

Por mais que eu ame um filme, jamais consigo vê-lo uma segunda vez. Livros, a não ser que eu tenha esquecido a história, também não gosto de repetir. E se eu esqueci a história é porque não vale a pena ler outra vez. Há tanto a ser visto ou lido que não me conformo em perder tempo vendo o mesmo do mesmo. Passo longe do Vale a Pena Ver de Novo. Música boa já ouço mais de uma vez, no entanto, nunca na mesma sequência e sem necessidade de haver imagens. Ou seja, DVDs também vejo, com atenção, apenas uma vez. Nas seguintes, o DVD vira CD. Se puder, jamais faço o mesmo caminho, a mesma viagem, a mesma ordem das coisas. Repetindo o prato principal hei de mudar, ao menos, os acompanhamentos ou a apresentação. Há de haver algo diferente, novo, inédito. Por isso, considero a vida mágica: nascemos, vivemos e morremos sempre de um jeito único. Podemos ter inúmeras reencarnações, mas as formas como chegamos ao mundo, como interagimos com ele e nos despedimos se diferem das anteriores. E o amor? Nunca se ama da mesma maneira. Os beijos, as ligações, o sexo têm identidade própria. E por mais que amanhã vamos amanhecer aparentemente igual hoje, seremos diferentes. Estaremos mais velhos por dentro e por fora e isso conta. O dia é novo e nós também. Quando nos dermos conta disso o mundo será diferente e a vida completamente mágica. O “eu-hoje” morre hoje. Amanhã, serei outro eu. E com isso um reino de possibilidades se abre ao meu favor. A orquídea floresce uma vez por ano e a cada floração, por mais idêntica que possa parecer, as flores são diferentes. O trem que parte não é o mesmo que chega. A goiaba do mesmo pé, inclusive da mesma galha, nunca tem o mesmo sabor. O sorriso sempre tem uma envergadura diferente, assim como a intensidade do olhar. A coloração do céu se altera sem que percebamos. O mundo roda e gira sem parar alterando sem que atentemos para os detalhes causados por esses giros e rodopios. O mar nunca produz a mesma onda. Luas e sóis nunca são os mesmos. O sol que se põe jamais retorna ao céu. A lua nova é literalmente nova, porém cada minguante, crescente e cheia também são novas cada vez que despontam. Pode seguir uma receita à risca, um bolo, uma torta, um pudim nunca ficam iguaizinhos ao passado. Algo pode ser muito parecido, nunca igual. Por isso, amo os vira-latas que na mesma cria trazem exemplares tão diferentes uns dos outros. O espaço muda a todo instante. Num piscar de olho tudo já não é como foi anteriormente. O tempo está agindo, transformando, evoluindo tudo e todos de forma constante, permanente e incorruptível. Ninguém dobra o tempo, mas, querendo ou não, de uma forma ou de outra, dobramo-nos a ele e badalamos como relógios que se atrasam, adiantam e acertam o horário às vezes. Perfeito mesmo, em sua precisão, só o tempo. Nós, inéditos a cada fração de segundo, vamos buscando o novo quando o novo já está em nós, ou melhor, já somos nós.


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26/01/2016 - Frutos da insaciedade

Um só amor não basta à mulher que carrega o coração oco no peito. E vai tentando ter árvores cada vez mais altas e vistosas, floridas e carregadas de fruto, mas caindo sempre pelo machado da ilusão vê em sem meio a tocos. As paixões que vai buscando a todo custo se alastram feito queimada devorando tudo, devastando seu mundo. Ela mesma, na sua insaciedade, consome todo e qualquer sonho. É árvore, mas também é a formiga, o formigueiro, que corta suas folhas. É árvore, mas também é a broca que fere o seu tronco e, sem que ninguém perceba, mata o seu cerne. É árvore, mas também é a mosca que apodrece seus frutos, o vento que derruba suas flores, a enxurrada que desterra suas raízes. Podia ter uma arvorezinha linda e firme, mas quer ter várias árvores em um só tronco, mais frutos do que suportam seus galhos, flores tantas e complexas que um só pássaro não consegue fecundar. E com isso acaba se extinguindo antes de se perpetuar. ...
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25/01/2016 - Fugindo do ancoradouro

Outro navio chegou, aportou no porto das seis, e ela não chegou, não chegou outra vez. Ela ainda baila pelas águas e se a maré descer pode ser que ela chegue quando as mágoas baixarem. Pode ou não acreditarem, mas ela virá. Por enquanto não veio, mas o mar ainda está cheio e pode ser que será que quando menos se esperar ela estará entre nós fazendo pós em apaixonamento. Encantará de cabelos ao vento, de peito aberto e sorriso incerto. Aportará com olhos de maresia, viagens e paisagens a contar, e uma alegria difícil de disfarçar. Só que depois de tanto tempo pelas ondas, balançado para lá e para cá, descobrindo novos mundos e que o oceano não tem fundo, ela nunca mais se prenderá. Será como brisa que bate e alisa, que chega e desliza para longe. Terá tanto a dizer e ao mesmo tempo um silêncio de monge. Sinto esclarecer, mas quem chegar como âncora, ela despistará e no primeiro sopro suas velas há de inflar e tocar para o mar.


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24/01/2016 - Casório e mais casório

Hoje o dia amanheceu de casamento. Seu galo cocoricou chamando a galinhada para o altar. A abelha rainha saiu da colmeia para se refestelar nas flores do buquê. E toda mulher amanheceu meio noiva num quê de sentimento sem mais nem porquê. A bicharada se alvoroçou e até dona vaca noivou. Sinhá porca também quis e rolou pela lama mais sinhó leitão toda feliz. O peixe fisgou a companheira de um jeito que até a água do ribeirão borbulhou. E mesmo ela o chamando de cachorro e ele a levando por cadela se casaram debaixo da janela. E o amarelo arisco que só para essas coisas de casar, meio que enfeitiçado, deixou a bichana fazer dele gato e sapato. Teve baile na roça para festejar tanto casório que até o seu Honório, do alto dos seus noventa e tantos, resolveu trocar alianças diante do santo. Menina Helena se derreteu toda quando teve sua mão pedida com direito a viola e poema. Teve serenata, fogueira, amor para a vida inteira e paixão vira-lata, mas o que importou mesmo é que casamento algum foi em vão. E a cigarra casou com a chuva. E o sabiá casou com a laranjeira. E a viúva casou na segunda-feira. E o pescador casou com Maria Lamparina. E o quitandeiro se juntou com Irene do Pomar. O violeiro se casou com a rima. E, no laranjal, a baiana se casou com a lima. O garnisé foi para lua de mel com a cocar. E a tilápia subiu o rio com o lambari. E com tanto casamento aqui, a lua se vestiu de noiva e, toda branca, numa claridade de acordar rouxinol, foi balançando suas ancas ao encontro do sol. E teve casório na roça e baile no céu. E na reviravolta dos contos de fada, pela estrada do brejo, até Rapunzel jogou suas tranças pro Osório, que como não era príncipe a levou direto pro cartório e o juiz de paz os declarou casados e enrolados.


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23/01/2016 - Canoeiro descendo o rio

O canoeiro vai de corpo inteiro descendo o rio. Pelas margens vai vendo a vida passar e se transformar. Quanto mais ele se distância da nascente maior é o ritmo do tempo que vai mexendo com tudo. Vai deixando saudade, lembrança e os sonhos que não conseguiu realizar até hoje. O que ele queria ser ontem e não foi fica pelo rio. O que ele podia ser ontem e já não pode hoje fica pelo rio. O leque de oportunidades perdidas, seja lá por qual razão, fica pelo rio. Já o canoeiro, realizado ou não, segue em frente buscando ser e fazer o que ainda o cabe. E tudo passa a fazer mais sentido, como que o fazendo enxergar pela primeira vez, quando ele descobre que não é ele quem desce o rio, mas o rio que desce com ele.


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22/01/2016 - Saideira

O tempo fechou e ela não voltou para casa. Saiu de bar em bar, de boca em boca, fazendo papel de louca. Banalizou as conjugações do verbo amar e numa saideira amou mais do que muitos em uma vida inteira. Amou sem dor nem choro, mas quebrando todo o decoro possível. E se julgando infalível não avisou ou prestou conta dos casamentos e separações que foram acontecendo de repente bem debaixo do nariz da lua. E era vulgaridade demais para haver qualquer saudade. E as lembranças ficaram vazias, como gavetas sem memória. Tudo foi feito com a desculpa da bebedeira, mas todo mundo neste mundo sabe para que e para quem acendem um fogueira, bem como dos riscos de se queimar. E ela foi de braço em braço, de grito em grito, de catarse em catarse sem se preocupar com possíveis danos ou reparações. Quando acordou estava vestida apenas por quintas intenções, literalmente perdida entre razões e paixões tão inconsequentes quão inexistentes.


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21/01/2016 - Considerando

Nem só de comida vive o homem. Nem sempre o homem é chamado pelo nome. O coração nunca é quem come. Amor que é amor não some. Não boto fé em paixão que dorme. Quando se tem sonho tudo é enorme. Não existe romance uniforme. E não há homem impedido de amar que se conforme. O destino tem tantos codinomes. A estrada de quem se ama é disforme. Não há quem bata e asse amor que mais cedo ou mais tarde a dor não desenforme.


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