Daniel Campos

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Encontrados 301 textos. Exibindo página 19 de 31.

Soneto carioca

Observo seu olhar, triste devaneio
Na busca interrupta de algum passado
Olhar perdido em morros, corcovados
Remanso de um rio de tantos janeiros.

Quantas as ondas envoltas de espuma
Não jazem em seus vastos olhos poentes
Aqui onde até ipanema fica doente
Na miragem dos seus olhos de pluma.

Olhos de olhares mares de?uma poesia
Deixam-se tomar pela fantasia
Ocultam-se e deturpam quem os lêem.

Olhos sós que se entregam à aflição...
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Soneto cheio de mandinga

Por todos os santos quebra os quebrantos
Que amarram o amor aos nós da alheia intriga
É mau olhado dedo cruzado em figa
É tanto amor amarrado no encanto

Traidor dessas feiticeiras de quinta
É tanta reza, mandinga e macumba
Levando pro fundo das catacumbas
O riso pintadinho cheio de tinta

E é tanto agouro reza prosa e choro
Levando o mal a ser coroar de louro.
Espantando o sono dos orixás

Tem banho em pinga e guiné na janela...
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Soneto confuso

O vasto silêncio atirado ao vento
Diz tantas coisas sem querer dizer
O infinito esquece o nosso momento
Num longo gesto sem se perceber.

E pelas ruas abstratas e vazias
Onde se busca não querendo achar
Esconde-se a bandida nostalgia
Que traz o que não é para se lembrar.

Se só há valor no que não se tem
Nossa vida se resume a saudade
Mesmo a verdade não sendo vontade.

Dúvida de todos e de ninguém
A razão nos emudece a resposta...
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Soneto contorcionista

Dobra suas pernas e inclina a coluna
Um, dez ou vinte ângulos para trás
Distenda-se e respire fundo em paz
Correndo seu mundo em cada lacuna.

Solte o ar devagar zomba tomba e vira
Colocando o cabelo em queda livre
E de ponta cabeça, ama em declive
E suspira e gira e pira e transpira

Um arrepio frio que corre ao contrário
Pelas suas costas e abraça suas pernas
Tal qual uma escultura pós-moderna

Distorce e se contorce num aquário...
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Soneto costurado

Entre o pecado e o passado há um vão
Por onde passa a linha do desejo
Que costura o mel no papel dum beijo
Na boca macumba de um coração

Mas o beijo foi feio a luta não veio
O astronauta tropeçou caiu no espaço
São jorge bateu no dragão de reio
E o lábio de tricot se fechou em aço

E zanza acolá alinhava de cá
A agulha alinhava e cava sua boca
E zanza dali e vai como uma louca

Em um eu te amo na língua iorubá...
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Soneto cuidadoso

Cuidado, olha pra trás, olha pro lado
Eles estão na porta a tua procura
Cuidado, não tem reza não tem cura
Eles ainda vão te pegar, cuidado

Olha pro lado de fora do muro
Eles estão lá, eles vão te morder
E vão te prender, vão te entorpecer,
Fazer-te sofrer. Aqui não é seguro

Corre se esconde debaixo da cama,
Em cima da árvore no meio da lama,
Por entre a saia azul da dama estelar

Corre dos caçadores dos que amaram...
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Soneto da amora

Ai, chora que o beijo dela é de amora
Mancha a alma e bem demora seu esquecer
Chora antes que alguém te mande sofrer
Chora a menina pequena foi embora

Do quase namoro e toda a cidade
Canta e canta em coro que foi traição
O que a menina fez da tua ilusão
E agora chora, ai chora sua maldade

O beijo roxo e doce ficou amargo
O vão entre teus braços ficou largo
E a tua comédia virou um bangue-bangue

Sai pelo velho oeste como o bandido...
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Soneto da boiada de poeira

Lembro do gosto da terra vermelha
A estreita estrada face um arvoredo
Meus pés trilhando sob cacos de telha
E o orvalho dizendo que ainda era cedo

Seguia como o maestro de uma boiada
Na cabeça, os nós da palha chapéu
Presa à mão, uma varinha improvisada
E ao lado, a réstia de cães seguia ao léu

Serpenteávamos em procissão
De passos, de olhos, de medos, de gritos
Aboios de ventania sem direção

Hoje o chapéu é fogo de palha triste...
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Soneto da continuidade

Das mãos unidas fez-se sem alcance
O que sem controle escorreu em teu dorso
Na promessa de ter sido só o esboço
Das tantas laudas do nosso romance.

Ah! Se houver amor, mata teus medos...
Deixa quiçá o desespero da ausência
Dos nossos beijos... Confia na sentença
Que irá nos acorrentar sem segredos.

Fazer valer o que sempre foi válido,
Eis o Superior Tribunal do Amor
Que faz o sol em nós não se pôr pálido.
...
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Soneto da conversa fiada

Quando a noite chegar para dormir
Cansada das minhas fiadas conversas
Hei de ser como trovador que versa
O adeus, dois, três dias antes de partir.

No instante em que pousar os cabelos
De estrelas no travesseiro de plumas
Hei de trilhar no lombo de um camelo
Os caminhos desertos de quem ruma

Na imensidão vazia de um amor árido
E caem na tentação da flor de pedra
Que bela, de adeus o destino empedra.

Hei de abortar o desejo mais cálido...
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