Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 101 de 320.

03/01/2010 - Do mesmo amor

Eu quero um pouco e muito mais do mesmo amor. Do mesmo amor que há pelas ruas do meu corpo. Amor inocente, amor docente, amor de repente amor. Eu preciso da próxima fala, da próxima cena, do próximo capítulo desse amor. Nada de pausas ou de interrupções, que venha a continuidade da história. Uma história de muitas páginas e sem final. Amar é querer viver mais e mais páginas sem nunca se encontrar com o ponto derradeiro.

Eu quero um pouco e muito mais do mesmo amor. Amor que tem me dado todos os dias como prenda e oferenda. É vital tirar mais açúcar dessa moenda sentimental. Abuse da imaginação para criar o que já foi criado. Inspire-se no amor dos beija-flores, das jaguatiricas, das aranhas fulanas de tal. Redimensione as planilhas do coração, coloque mais versos na canção e reze pelo milagre da multiplicação....
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07/04/2014 - Do quanto

Eu nunca me esqueci dos teus olhos em meus olhos e do quanto pedi e peço isso tudo pela vida afora. Eu nunca me esqueci da tua boca em minha boca e do quanto quis e quero beijos eternos pelo tempo de agora. Eu nunca me esqueci do teu corpo em meu corpo e do quanto gritei e grito mais, mais, mais sem ser da boca pra fora. Eu nunca me esqueci das tuas palavras de amor nas minhas e do quanto implorei e imploro: não me ignora. Eu nunca me esqueci dos teus encontros nos meus reencontros e do quanto me feri e firo no teu ir embora. Eu nunca me esqueci da tua vontade na minha vontade e do quanto fiz e faço em prol do me namora. Eu nunca me esqueci dos teus braços nos meus braços e do quanto o teu eu no meu ainda mora. Eu nunca me esqueci do teu caminho em meus caminhos e do quanto nos quisemos e queremos para além da hora. Eu nunca me esqueci do teu rosto em meu gosto e do quanto sorri e sorrio na lembrança do teu rosto que cora. Eu nunca me esqueci das tuas promessas nas minhas e do quanto o esquecimento delas me apavorou e apavora. Eu nunca me esqueci da tua entrega na minha entrega e do quanto o que negou e nega me devora. Eu nunca me esqueci da tua magia na minha fantasia e do quanto solucei e soluço na ausência que me aflora. Eu nunca me esqueci do teu signo no meu significado e do quanto de amor minha saudade da tua saudade chorou e chora.


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24/04/2014 - Do que mais?

Do que mais precisa um homem do que uma mulher para amar? Amar livremente, loucamente, ininterruptamente, com altos e baixos, mas com a mesma fulgurante intensidade. Amar fazendo do corpo da mulher amada seu mar aberto e seu cais ao mesmo instante. E que as velas sejam içadas e as ancoradas jogadas ao longo dessa mulher-mar que é onda, farol, sereia, pérola, coral, gaivota...

Do que mais precisa um homem do que uma mulher para amar? Amar sem perder tempo abstraindo o firmamento, extraindo seiva do vento, contraindo uma epidemia de sentimento ao abrir do coração entre um pulso e outro. Hipnotizando, delirando, prazerando, vibrando, amando. Que o sentimento seja posto em gerúndio num quê que não cessa, não tem fundo, não tem lugar senão o tempo amar. ...
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12/04/2016 - Do que não tive

Molhei as plantas. Dei banho nas crianças. Adiantei o almoço. Acendi uma vela aos pés da santa. Renovei as esperanças. Presentei o cachorro com um belo osso. Liguei a televisão, o rádio, o computador, o celular, o liquidificador, o ferro de passar, a máquina de lavar, o carro e parti. Com um beijo da boca que mais amo me despedi. Ganhei às ruas inventando novos velhos caminhos. Nem chorei, nem sorri. Por um momento, senti-me um trem sem trilhos. Porém, logo a gravidade me trouxe de volta. E o que é a realidade senão essa coisa que vem e não solta? O carrilhão de sonhos me provoca. E a saudade do que não tive me sufoca. ...
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14/06/2016 - Do que tu se escondes?

Menina, por que é que tu se escondes? De quem é que tu tens medo? É do bicho-papão? É da pisadeira? É da solidão? Menina tu me contas o segredo desse seu sumiço. É algum enguiço? Tanto mistério. É sério... tem ameaça? Quem é que a caça? Menina, me conta que passas. Tu queres que eu ajude? Tu queres que eu mude seu coração de lugar?

Menina, tu sabes que não há nada melhor para espantar assombração do que arrumar a casa, mudar os móveis de posição. Deixa eu mudar seu coração de lá pra cá. Presta atenção, bota ele bem aqui na minha mão. Menina, tu precisas de um abrigo, de um anjo ou de guardião? Menina tu vejas que eu sou tudo isso num só. Tu não estás só não. ...
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05/12/2009 - Doce amor

Amor, doce amor, coloca em mim suas asas e me leva a um vôo cego pelos confins do infinito amar. De colherada em colherada, alimenta-me dessa canção que mistura prazer e sofreguidão. Mas uma sofreguidão bem quista pelos meus apelos. Deixa-me respirar seu ar, sonhar e me afogar em seus cabelos. Quero invadir seus espelhos, tatuar em mim seu escaravelho e morder, feito cão vira-lata, seus tornozelos.

Amor, doce amor, lava meu eu de toda insegurança, ensina-me a ser, mais uma vez, criança tão ingênua quão pura de amar. Leva para longe todos os fantasmas que gostam de assombrar aqueles que acreditam no gostar. Não permita que o passado se apodere do presente, que toda construção desabe num de repente, que o fruto negue a semente, tampouco que a solidão se agigante numa última tentativa de não morrer....
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30/01/2012 - Doce mar

Entre as peculiaridades divinas é válido ressaltar a doçura do mar salgado. Poucas coisas são tão doces quão o mar. Aquele sal em movimento constante comendo a areia, perfumando o vento, curando as feridas do corpo e da alma. O mar faz a alegria da criançada como uma panela cheia de brigadeiro. O mar, como se feito de mel, traz inúmeros benefícios à beleza. O mar e as pessoas numa relação de açúcar e formiga.

O mar é um verdadeiro banquete. De uma forma ou de outra, todos desfrutam dessa enorme e constante ceia a céu aberto. O mar abre o apetite e, ao mesmo tempo, sacia todas as nossas fomes. O mar quebra nos olhos como quebra queixo. O mar gruda em nossa pele como calda de caramelo. As conchas são como confeitos de açúcar. As espumas das ondas são chantilly. No mar, o sal tem uma doçura poética. ...
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05/10/2011 - Doce tristeza

Nada ao seu redor conseguia ser mais triste do que seus olhos entristecidos pela falta de deus. Uma situação de abandono, uma sensação de falta de dono, uma carência de filha deixada pelo caminho. De quem seria sua alma se o apocalipse se cumprisse agora? Por não saber responder, calava-se numa tristeza fatal e conflituosa.

Uma tristeza que, mergulhada em seus olhos de compotas, cortava como lâmina amolada nas pedras do tempo. Sua tristeza, em flor, espalhava-se pelos jardins da solidão, descolorida e rasteira, como planta misteriosa que distende os ramos querendo juntar bocas e espinhos num mesmo beijo. ...
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24/01/2011 - Doce voz

Como é doce ouvir a sua voz. Como é doce ouvir a sua voz no silêncio de uma oração ou no meio da multidão. Como é doce ouvir a sua voz na linguagem dos sinos, construindo destinos como quem constrói frases. Como é doce ouvir a sua voz curando cicatrizes, fixando raízes, colorindo almas em seus matizes. Como é doce ouvir a sua voz. Como é doce ouvir a sua voz falando de nós.

Sua voz que vem em forma de vento, brisa, ventania. Sua voz que cobre nosso coração em feitio de manto. Sua voz que não diz adeus e que tem tanto de deus. Sua voz que vinga a poesia, que aflora o mesmo pranto que cala. Sua voz que clareia a escuridão, que destrona a solidão, que se espalha feito canção nas bocas dos pássaros de amores e perdão....
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31/10/2008 - Doces ou travessuras

Um antigo celta disse-me para tomar cuidado. Com a barba por fazer e um sotaque inglês, contou-me um segredo. Na verdade, uma antiga lenda de seu povo. Segundo ele, no dia 31 de novembro, véspera do Dia de Todos os Santos e antevéspera do Dia de Finados, todos os que desencarnaram ao longo do ano vigente descem a terra à procura de corpos vivos. O propósito está em encontrar um corpo para invadir e usar pelo próximo ano.

Eu ri e ele fechou a cara, já fechada, dizendo que essa era a única forma de haver vida após a morte. A receita para não ser possuído era um tanto esdrúxula, mas dava resultado. Na noite do dia 31, é bom apagar todas as luzes de sua casa. Quanto mais fria e sem graça ela estiver, melhor para afastar os mortos. Para completar, coloque fantasias de monstros e saia pelas ruas fazendo muito barulho, na tentativa de assustar os espíritos. ...
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