Daniel Campos

Prosas

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04/10/2010 - Odontofobia

Bombas de pânico vão explodindo lá e cá. O coração não aceita conselhos e pula feito burro xucro. Os pulmões doem a cada passagem de um novo fluxo de ar, pois o ar está áspero. O rosto perde cor. Há comichões e contrações. Há milhares de casamentos e separações de células nervosas a cada segundo. Há tonturas entontecendo a razão. Há uma tendência pessimista no ar. E o ar, como dito, está áspero, irrespirável. Ainda mais porque o ar tem cheiro de dor.

O sangue borbulha de aflição, ameaça um derrame. Os pensamentos se embaralham. Os pés tropeçam em angústias. Os olhos cegam. Há dores generalizadas por todo o corpo. Os sentidos perdem e ganham intensidade. Há uma estiagem de bom senso e uma epidemia de loucura. Raios e trovões dominam o corpo tomado por tempestades. O espírito arde. Ainda é cedo. Ainda é tarde....
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03/10/2010 - Inferno de Dante

Vamos colocar mais água no feijão, afinal, hoje é dia de eleição. E em dias como hoje tem sempre uma boca a mais para comer um pouco da gente, da vida da gente. É tanto candidato querendo tirar o nosso pão e nos deixar só com duas ou três migalhas na mão. Sai pra lá corrupião. Eu renego essa sua prosa barata, seu doutor cramulhão. Hoje tem sempre alguém tentando comprar a sua ideologia, tentando lhe empurrar uma velha fantasia, tentando selar um pacto em troca de alegria.

Hoje é dia de eleição. Hoje um novo tempo pode vingar ou ser sepultado nas próprias urnas, eletrônicas ou não. Hoje alguém vai querer lhe dar um lote, uma cesta-básica, uma dentadura. Cuidado com as promessas, com a ilusão, com as máscaras e com o excesso de compaixão alheia. Hoje é um dia perigoso. As bruxas e os monstros estão soltos. Vale à pena rezar um mistério glorioso pedindo pra ser iluminado e pra não cair em tentação. Pois o demônio, em dias assim, mora ao lado. ...
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02/10/2010 - É lá que eu quero morar

Detrás das montanhas do vento leste, há casinhas coloridas, pintadas com duas ou três demãos de cal, por pintores de aquarela. Lá, as ruas são de pedra e sal e ninguém medra de bandido ou de desconhecido. Lá, a lua volta e meia tem uma queda de pressão, o que a faz cair nos braços de um sol vermelho rouxinol. Lá, há um frescor de menta pelas esquinas e as meninas se vestem de vestidos de algodão. Nessa cidadezinha perdida entre a mata e um riacho, dona Mariquinha raspa a goiabada cascão pregada no fundo do tacho. Lá, nessa terra de amores simplórios, reza-se o responsório ao meio-dia e não há espaço pro esculacho. Reina a rainha poesia. ...
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01/10/2010 - Amor e hortelã

O amor é hortelã. A comparação pode parecer estranha, mas existe muita coisa em comum entre o sentimento-maior e a planta citada há pouco. O amor tem efeitos medicinais, estéticos, holísticos assim como a hortelã. Assim como o amor, a hortelã tem muitos nomes e variações, como hortelã-brava (todo amor tem sua bravura), hortelã-doce (todo amor tem sua doçura), hortelã-pimenta (todo amor arde e esquenta). O amor, seguindo o comparativo com a hortelã, é simples. Pode acontecer em qualquer quintal, em qualquer jardim, em qualquer cozinha. ...
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01/10/2010 - Capítulo 55

Os noticiários estampam que Sebastian continua sem comer e que ao contrário de falar com advogados, investigadores e familiares prefere conversar com espíritos. Um policial, cujo nome foi preservado, informou que o detento está em jejum absoluto e que passa horas conversando sozinho na cela. Assegurou ainda que, em certos momentos, ele chega a ficar em transe.

As opiniões divergem a respeito da postura adotada por Sebastian durante sua prisão cautelar. Para alguns, o promotor quer apenas chamar atenção, fazer cena, fingir um estado para tentar burlar uma futura condenação. Para outros, ele precisa ser internado com urgência, pois está louco. Para outros ainda ele é um bruxo, um fanático religioso e, até mesmo, um santo. ...
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30/09/2010 - A vida é a vida e...

A vida é a vida e nada mais. Aos que sonham, a possibilidade de viver um pouco fora da realidade. Aos que tudo aceitam, a certeza de um sofrimento menor. Ou seja, todo sonho tem um preço, toda resignação tem um bônus. Sonhar é encantador, no entanto, a dor que surge ao acordar é algo insuportável, explicação para inúmeros suicídios e crises de depressão. Ninguém pode viver absolutamente de sonhos. O sonho é chama que se apaga, é luz que fraqueja, é estrada que cessa.

Viver sonhando é viver negando a própria existência. É sempre querer mais, é nunca se dar por contente, é ir pra trás quando se quer ir pra frente. O sonho é deveras bonito, mas o ser que sonha é definitivamente ausente. Ausente de concretude, ausente de solidez, ausente de plenitude. Quem sonha sempre tem medo de acordar. Por isso, por detrás do sonho, a vida é a vida e nada mais. Já para os céticos, que levam dia após dia sem criar expectativas, viver é uma conta sem graça, porém satisfatória. ...
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29/09/2010 - Trégua

Ter a mulher amada nos braços traz uma sensação de poder e de fragilidade difícil de compreender. Um estado físico, psicológico, espiritual que pode se desestabilizar a qualquer minuto. A respiração dela, ali, tão perto. Os olhos dela, abertos ou fechados, numa sensação de cumplicidade extrema. Os pensamentos dessa mulher, sempre tão secretos, saindo pelos folículos pilosos, deixando-se se descobrir. Um momento único. Vontade de gritar, de chorar, de sorrir, de se dar. É o êxtase, a overdose, o clímax. ...
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28/09/2010 - O vento virou

O vento virou. Demorou, mas o vento virou. A chuva vem aí. Salve São José e São Benedito dos quilombos de Zumbi. Daqui um pouco ela chega. Benditas sejam as águas do céu, canta o bem-te-vi. Bendita seja a senhora das águas do céu, que torce o pranto de seu véu sobre nós. Que a partir dele, as sementes possam vingar, que os doentes possam se curar, que as bocas possam se alimentar. Santa ceia, santíssima chuva. Bendito seja aquele que transforma água em uva, que multiplica os pães, que manda chuva....
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27/09/2010 - Cajus do oriente

Como são belos os cajus do oriente, nascidos e amadurecidos numa vermelhidão pungente. Doces adstringentes, vermelhos penitentes, delicados e ardentes. Como são belos os cajus do quintal, tão esperados, tão encantados, tão vestidos de vermelho quanto o velhinho do Natal. Como são belos esses frutos, benedictus frutos, que conseguem transformar a seca em açúcar, poeira em mel. Pássaros e abelhas: abusai dos cajus do oriente, que mancham os céus como estrelas cadentes.

Como são belos os cajus que surgem coloridos por entre os ruivos cabelos de Iansã. Cajus que causam inveja na maçã do paraíso. Cajus que nos fazem perder o juízo a cada manhã. Cajus que colorem o riso de acauã. Cajus das castanhas e das castanholas. Cajus do oriente miscigenados na paixão espanhola. Cajus perfumados como mulher amada em noite de núpcias. Cajus abocanhados como mulher amada em um momento de astúcia. Cajus de sentimentos caudalosos, de argumentos poderosos. ...
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26/09/2010 - A naturalidade da mulher amada

Não existe sinal de solenidade nem de formalidades na mulher amada. Ela é de uma espontaneidade típica do amor verdadeiro. Para além do mistério natural, ela tem olhos arejados e iluminados, fonte eterna da renascença. Por entre os silêncios da mulher amada, corre um certo burburinho. Dizem que esse barulho provém da mistura de dois coros: o dos anjos adorando a criação e o dos demônios marmanjos entoado a partir de cantadas baratas. Entre o céu e o inferno, no centro de uma bagunça metodicamente ordenada, está a mulher amada. Nem santa, nem pecadora, mas tudo ao mesmo tempo. ...
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