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Encontrados 59 textos de maio de 2015. Exibindo página 3 de 6.
21/05/2015 -
Vida de cachorro
Meu cachorro me falou que não quer mais ser cachorro, que não aguenta mais viver no osso da vida pós-moderna. Enjoou da ração que é todo dia sempre igual. Sente necessidade de ter crédito na praça para comprar o que vê nas propagandas da televisão. Quer fazer terapia para passar incólume pelos pets shops. Meu cachorro está depressivo com saudade de ser cachorro de verdade, seja correndo pelo campo, rolando na grama, latindo quando lhe der na telha. Agora meu cachorro tem que respeitar a lei do silêncio do condomínio estando, portanto, terminantemente proibido de uivar para o melhor da lua cheia que é na noite alta. Tem saudade até do tempo que tinha uma pulguinha ou outra para passar boas horas se coçando. Hoje com esse tanto de shampoo e condicionador canino está tão limpo e macio que parece mais enfeite que cachorro. Ele queria mesmo era correr livre, rosnar pra carteiro, roçar nas cadelinhas, cheirar o traseiro alheio. Mas agora vive entre paredes, espiando o mundo apenas da janela do décimo sétimo andar. E quando sai é de coleira. Deixou de ser cachorro para ser um produto. Ele sente falta do tempo que eu tinha tempo para brincar com ele e não apenas para postar suas fotos nas redes sociais. Meu cachorro anda tão estressado que morde o próprio rabo e deita de barriga para ficar olhando pro teto. Odeia o funk, o sertanejo universitário, o pagode dos vizinhos. Queria mesmo era poder escutar o som do vento batendo nas árvores, a cantoria da passarada, as prosas das pessoas que tinham muita história para contar. Hoje meu cachorro tem as unhas compridas porque só anda no porcelanato. Queria mesmo era pegar carrapicho, correr atrás de galinha, deitar em qualquer lugar. Queria poder comer comida de verdade, meter as fuças onde quisesse e ainda sorrir numa total falta de compromisso, pois na sua agenda só constaria uma anotação: ser cachorro.
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20/05/2015 -
É tudo silêncio
Tudo tão quieto, tão quieto, tão quieto de se ver... O mar virou deserto pra nem as ondas barulhar... Onde esse silêncio todo vai dar? Quem é que vai querer, querer falar? Não se pode nem beijar se for pro beijo estalar... Como é que vai ficar essa mudeza toda? Nem as notas do café caem mais sobre a mesa... A beleza não grita e a tristeza não chora de soluçar... Ninguém arrasta sandália, mãe com criança não ralha, do céu sumiram as gralhas... E agora, e agora, e agora? Carro na rua já não passa, baderneiro não faz arruaça, urubu não sai rindo depois de achar uma carcaça... Cachorro não late, lavadeira não bate, moleque não dá combate... Não há música alguma a solta. Ninguém ameaça o senhor silêncio que governa as bocas com suas mordaças roucas... ...
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20/05/2015 -
Menina serpentina
Veja só, serpentina é igual menina
Se estica toda quando quer festejar
E se enrosca onde menos se espera
Num enrosco cuja sina é se quebrar
E como rama florida de primavera
A menina tal serpentina colorida
Vai voando e se jogando e enroscando
Num jogo que nem ela sabe onde vai dar
O melhor mesmo é estar solta no ar
Como se entre a partida e a chegada
Sua ilusão não pudesse ser rasgada
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19/05/2015 -
Formiga cortadeira
Nossa, pelo amor de Deus,
Dona formiga cortadeira
Vá-se pra longe do meu jardim
Saúva graúda tem pena de mim
E da minha plantação de adeus
Que precisa seguir inteira
Nem adianta se assanhar
Vá fazer feira noutro lugar
Eu tenho flores a zelar
E pétalas para entregar
Por favor, dona formiga
Não me faça mais intriga
Volta pro seu formigueiro
O meu jardim não carregue
Dele não leve nem o cheiro
Deixa minhas rosas e prosas...
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19/05/2015 -
Vira homem vira bicho
O sapo se incha todo e até toma banho no lodo querendo namorar. O pavão abre a cauda, a cigarra estronda, o cachorro uiva querendo namorar. O gato mostra as unhas, a galinha abre as asas e o rato sai da toca querendo namorar. O canguru troca de bolsa, o jacaré palita os dentes e a girafa estica ainda mais o pescoço querendo namorar. O galo estufa o peito, o macaco faz graça e a cobra encontra seus pés querendo namorar. O porco rola na lama, a mula pisa feito uma dama e a lagartixa cai na cama querendo namorar. O grilo afina a sanfona, o tatu fica nu e a maritaca se ataca querendo namorar. O pato até bota ovo, o carrapato desgruda e a matilha fica muda querendo namorar. O leão penteia a juba, o cisne faz pose e o cavalo empina querendo namorar. A formiga sai da trilha, a hiena fica séria e o elefante é todo ouvido querendo namorar. A onça dá pinta, o lagarto dá língua e o papagaio dá o pé querendo namorar. O morcego dá com a cara na parede e o peixe cai na rede querendo namorar. O cupim morde, o bode cospe, o hipopótamo se sacode querendo namorar. A vaca se esfrega, o coelho não sossega, a cabra fica cega querendo namorar. O tubarão se faz de vilão, o pinguim jura fidelidade e a aranha teia a saudade querendo namorar. O jumento dá coice, o camaleão muda de cor e a taturana pega fogo querendo namorar. O homem vira bicho e o bicho vira homem querendo namorar. ...
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18/05/2015 -
Avesso a calendário
Vou me desvestir
De índio e pedir
À primeira estrela
Que acender
Um pedaço dela
Para poder juntar
Aos meus
E me fazer inteiro
Como corda
De violeiro
Como poda
De jardineiro
Vou me pintar
De índio e dançar
Até ficar tonto
No encontro
De Iara e Iemanjá
Nas águas do mar
Com o rio que corre
Ao contrário
Morre para nascer
Feito eu antiadeus
Avesso a calendário...
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18/05/2015 -
Devaneando
Um dia era a gente. Noutro dia, semente. Na semana seguinte, um pó. No mês passado ainda era nó. No ano que vem sentirá saudade do que no passado não queria. Na outra vida se esquecerá do que foi, se gente se pedra se vento se capim ou se boi. Só fará sentido se se lembrar com o passar do tempo que passar do amor que teve e assim manteve até então. No soprar das folhas, terá ido além da paixão. No somar dos dias, terá vencido a solidão. No virar da ampulheta, terá sido adeus, deus, capeta e tido a certeza de que só o amor compensa o coração da gente que é semente, pó, nó, saudade e tudo o mais o que um dia achou menos ou mais...
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16/05/2015 -
Faminta
Seus dentes afiados e bem articulados
Furavam mais do que mordida de cachorro
Deixando suas marcas como se fosse Zorro
Tinha uma mordedura que era uma belezura
Mordia o mundo numa fome sem fundo
Comia nuvem, pedra, boca e até pensamento
Tudo o que via, sabia, sentia, conhecia ou não
Era de comer. Era para comer. Era seu comer.
E assim ela comia o dia e arrotava poesia
Comendo o que for e regurgitando amor
Assim era ela que não existe nesse tempo mais...
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16/05/2015 -
Senta a minha mesa
Senta a minha mesa. Coma da minha comida. Entre jarros e copos, chora sua dor. Com os talheres vá destrinchando a sua vida. Pode falar. Não há necessidade de cerimônia. Eu como rápido, mas prometo degustar com parcimônia cada uma das suas palavras. Beba da minha água fresca ou ardente, como preferir. Se for necessário pode cuspir seus marimbondos. Nada de vir com meias palavras, meias verdades, meias culpas. Tudo há de ser dito como se não houvesse depois. Somos agora. Pode, deve, precisa trazer o passado à mesa, mas esqueça do futuro. Fala independente das consequências. Não vamos sair da mesa enquanto a última migalha não for engolida.
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15/05/2015 -
Daqui
Sou daqui
Falo Tupi
Guarani
Sou Peri
De Ceci
Eu vi
Bem-te-vi
Colibri
Saci
Quati
Comi
Caqui
Mandi
Kiwi
Nasci
Cresci
Vivi
E trai
Dali
Com Di
Cavalcanti
Sou daqui
Sou Peri
De Ceci
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