Daniel Campos

Texto do dia

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Encontrados 32 textos de agosto de 2011. Exibindo página 2 de 4.

22/08/2011 - Sorriso selado

Ela sorri em preto e branco, como um selo, de um jeito recatado e melancólico como há tempos não sorria. Sorri para trás. Sorri de uma forma incapaz de insuflar felicidade em alguém. Quem se aventura pelas sombras de seu riso e toma sua boca num beijo ardente se espanta com tantas cores. A simplicidade do riso, estampado nostalgicamente em seu rosto, esconde um mundo que vai fundo na vivacidade das coisas.

E o sorriso, que parecia triste, parado no tempo, refém do espaço e da saudade, na verdade está embutido numa paleta de tantos minirisos, que vão colorindo aquela boca pelo avesso. Misturadas às tintas, crônicas e poesias de uma mulher que de amor se quer. E o primeiro sorriso – oficial até então – suave e delicado – dá margem a outros tantos sorrisos arrebatadores, que causam prazeres e dores nos lábios alheios. ...
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21/08/2011 - Espíritos do tempo

Mártir de um sentimento tão intenso quão denso, eu quero deixar meu corpo livre para que ele possa ser receptáculo dos espíritos do tempo. Espíritos que nos fazem mudar de rostos e de atitudes, de gostos e de virtudes. Espíritos joviais e ancestrais, espíritos de guerra e de paz. Espíritos do crescimento, do amadurecimento, do conhecimento, do envelhecimento, do princípio e do firmamento.

Não procurarei entender a fala desses espíritos, mas o que deles me cala. Espíritos que trazem as mãos cheias de falta. Espíritos que me roubam memórias, histórias, vitórias e até mesmo o que jamais esqueço. Espíritos, figuras da loucura, que tatuam em meu avesso ideogramas de cores e texturas. Espíritos de finais (felizes ou não) e de sucessivos recomeços. ...
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20/08/2011 - Seguidor

Vou lhe seguir pelas crateras da lua, pelos raios do sol até que nossos corpos se confundam num último eclipse. Vou lhe seguir pelas curvas de nível, pelo desnível das emoções, pelas variações da elipse. Vou lhe seguir quando isto for possível e impossível também, vou lhe se seguir pecando e dizendo amém até a fonte do apocalipse.

Vou lhe seguir pelas ramas da sua tatuagem, pelas tramas da sua imagem, pelas damas da sua linhagem até que ríamos da nossa própria bobagem. Vou lhe seguir pelos volteios, pelos clareios, pelos centeios de uma mesma e insensata paisagem. Vou lhe seguir pelas tempestades, de água, vento e saudades, até encontrar-me na sua aragem....
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19/08/2011 - Salve Vovó Marilu

Vovó Marilu me falou para eu me cuidar que inimigo está por perto, mais perto, mais do que perto como sombra e luar. Inimigos desta e de vidas passadas. É bom se proteger. Vovó Marilu não brinca, fala sério e até dá bofetão. Anda com seu filho, pai Seta Branca, com princesas indígenas e com a falange dos pretos velhos. Vovó Marilu tem espírito acaju, coração-açú e uma magia sururu. Contra meus inimigos vou passar na sua linha de passe e defumação. Ajorã do amanhecer, vovó vai fazer dor em quem me faz doer. Salve Deus. Salve Vovó Marilu. ...
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18/08/2011 - Hei de viajar

Hei de viajar pelo seu corpo, pelas suas linhas geométricas e telefônicas, sem quaisquer cerimônias. Hei de viajar pelas suas ligações umbilicais, zodiacais, extraconjugais. Hei de viajar pelos querubins e pelos seus demônios, entre o enxofre e o jasmim. Hei de viajar pelos seus cantos, dos retos aos mais obtusos, como um perfeito intruso. Hei de viajar até que eu não saiba mais começam meus limites e findam suas afrodites.

Hei de viajar em passos suficientemente longos e pausas mudas, meditando em seu tempo particular todos os meus budas. Hei de viajar tomando para mim partes das suas asas, das suas artes. Hei de viajar pelas suas poeiras, pelas suas lamas, pelos seus desconfortos, pelas suas desordens até que todo sentimento apague as luzes que nos casam num mesmo palco. Hei de viajar trágico e nostálgico pelos seus fatos. ...
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17/08/2011 - Sem abusos

Se ela falou, por favor, perdoe. Se ela chamou, sem rancor, voe. Se ela sangrou, dor em dor, doe. Faça uma doação de palavras; crava as unhas em teu céu de manhãs, manhas e mumunhas. Rasgue nuvens, desfie horizontes, entonte estrelas, mas não caia nem traia a lua que ela te deu. Se ela chorou, abençoe o pranto que jaz. Se ela cantou, entoe o encanto que há. Se ela badalou, soe o acalanto de lá. De lá de trás dos temporais escusos, onde a vida se refaz sem maiores abusos.

Depois de sangrar, de badalar, de cantar, surge amena e intensa, como Maria, como Madalena, como que vinda de uma mutação poética. Impossível observá-la de soslaio. Os olhos varrem seu corpo e interrogam cada célula. Os olhos perguntam de um tudo andando de um lá para outro. Vez em quando esses mesmos olhos tropeçam em sua geografia, machucam-se em seus espinhos e confundem seu suor com maresia, seu perfume com vinhos. ...
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16/08/2011 - Sacolas de memórias

Atravessei os últimos dias com sacolas carregadas de memórias. O viço bom das histórias que insistem em viver após o ponto final. Sob o pretexto de amar, pedaços de sorrisos e silêncios, de súbitos e pausas, de suspiros e desfechos vão se colando, formando assim um só corpo. No caminho, cheiros, sons e texturas me alcançam. Sabores aconchegantes me conduzem numa barca de sonhos e medos pela água da boca.

As cores do que é verde e maduro se contrastando na composição de um cenário que mistura sequências de futuros e pretéritos. Lembranças aromatizadas. Tardes matizadas. Temperos em movimento. Afetos meticulosos sob o mesmo teto. O teto da imaginação. Ilusões inéditas e usadas, novas e quebradas, reformadas e inutilizadas esperando para nascer, para morrer, para renascer ao mínimo toque da vara de condão da esperança. ...
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15/08/2011 - Recado de Iansã

Iansã mandou lhe dizer que amanhã o vento vai trazer uma febre terçã de sofrer pra essa gente que não sabe viver de paixão. Vai vir tempestade, de raio e trovão, pra mostrar que a saudade é a semente da solidão. Iansã não perdoa quem machuca à toa a ilusão de seus filhos. Os estribilhos da sua canção espalham o medo e o segredo da sofreguidão. Iansã, Eparrei Oyá. Iansã, vem castigar quem não sabe amar.

Iansã, dona das ventanias, não hesita em dar seu corpo e coração a quem se apaixona. Mas ela quer sinceridade. Ela quer entrega. Ela não nega desejo. Ela não foge à luta. Iansã é a força bruta da paixão. Iansã é a vermelhidão. Iansã é o beijo. Iansã é o que queima. Iansã é a cama. Iansã é a chama de quem ama. Iansã Eparrei. Iansã tem o rei da justiça aos seus pés. Fé na rainha dos raios que tem os cupidos por seus lacaios. ...
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14/08/2011 - Vou indo de trem

Enquanto você não vem, vou indo de trem. Vou além das linhas, de onde alcance os olhos do maquinista. Não sei se lhe convém saber, mas vou de estação em estação à procura de um pouso. Se com alguém ou de ninguém, vou de trem. Sem você, viajo refém de uma esperança que já se cansa de pulsar em mim. Sem você, sou o mais recém-passageiro que arde nas fornalhas desse trem carmim. Sem você, sigo num vaivém entre querências e clemências. Vou com dezenas de vagões de canções e solidões e também ao lado das ilusões que me fazem pagar seus bilhetes. Vou de trem e lá se vai meu vintém, minha sorte, meu querer-bem. ...
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13/08/2011 - Peoa de boiadeiro

De um jeito um tanto queixudo, ela chega e se apresenta em meia dúzia de versos improvisados. Menina peoa nascida no interior do interior em berço caipira. Mulher parceira, adolescente tranqueira. Moça xucra, que pisa nos homens como se pisasse no chão duro. Pisa firme. Pisa forte. Pisa doído. Nem boi bandido nem peão malandro domam seu coração nem lhe tombam na arena em dia de apresentação.

Amassando lama ou levantando poeira, gosta do mato e noiva com o sertão toda noite de lua cheia. Chega a chorar ouvindo violeiro pontear histórias de solidão. Mulher ajeitada e aporrinhada, de corpo bitelo, chega a dar febre nos peões de boiadeiro. Não é de negar pulo. É de rodeio, mas não é de cancha. Encara boi xucro e cavalo velhaco no laço de sua corda americana. Seu colchão é de feno, sua cama é cigana. ...
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