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Encontrados 28 textos de fevereiro de 2011. Exibindo página 1 de 3.
28/02/2011 -
Trocas e trocos
Eu pulso mesmo sem pulso. Eu como mesmo sem fome. Eu durmo mesmo sem sono. Eu acordo mesmo sem dormir. Eu vejo mesmo sem querer enxergar. Eu ouço mesmo sem suportar ouvir a mesma canção. Eu danço mesmo pisando em meus próprios pés. Eu amo mesmo sem saber amar. Eu viajo mesmo sem sair do lugar. Eu escrevo mesmo sem ter o que contar. Eu leio mesmo sem saber decifrar as palavras. Eu rezo mesmo sem acreditar. Eu trabalho mesmo fora de órbita. Eu vivo mesmo fingindo. Eu caminho mesmo sem direção. Eu aposto mesmo sabendo que vou perder. Eu saio mesmo querendo ficar. Eu choro mesmo sorrindo. Eu ligo mesmo que for para o telefone da solidão. Eu erro mesmo querendo errar. Eu emociono mesmo sem maior intenção. ...
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27/02/2011 -
Gárgulas apaixonados
Eles se amam como amam os gárgulas, de dia estão tão perto e quão distantes, já a noite são amantes, voando nas asas um do outro, num amor guerreiro e solto.
Antes do fim do primeiro beijo, o coração de pedra explode de prazer em medos e desejos, em trovejos e segredos que não aguentam mais se esconder.
Pela escuridão, entre o sim e o não, os gárgulas vão se perseguindo, se seduzindo, se possuindo, como duas estátuas em movimento, duas criaturas de sangue ao vento. ...
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26/02/2011 -
Drinque de chuva
A chuva dá cor, cheiro e significado às coisas. É impressionante como uma simples chuva muda o tom de paisagens inteiras. Essa água vinda das nuvens guarda um mistério – serão as pinceladas do criador reavivando a criação? Sinto que é na chuva que Deus está mais próximo. É uma forma dele se fazer presente e tocar sua obra sem causar alardes. Adoça os frutos, dá folhas novas, alimenta os rios, germina as sementes, lava as urucubacas, perfuma, renova o espírito.
Na chuva cada milímetro de matéria ganha intensidade e beleza. A chuva tem algo de dramático em seu espetáculo, que é feito naturalmente de quedas. A maioria dos filmes aproveita da chuva para emocionar o telespectador. “Singin' in the Rain” é um exemplo disso. A cena em que o personagem interpretado por Gene Kelly canta e dança na chuva mexe com qualquer um. É o milagre da chuva, que revira emoções dentro e fora de nós. Quem nunca se lembra de um fato marcante, um beijo, por exemplo, sob chuva? ...
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25/02/2011 -
Uma escola chamada Nelson
A Estação Primeira de Mangueira vai trazer logo mais para a avenida o mundo encantado de um de seus fundadores e principais expoentes: Nelson Cavaquinho. Esse bamba da verde-rosa cruzou o meu caminho quando ainda menino meu pai me apresentou, meio que sem querer, ao seu violão boêmio. Desde então, o sambista me ensinou a amar como amam os sambistas: entre a flor e o espinho.
Passei a pisar nas folhas secas caídas de uma mangueira com mais cuidado, lembrando-me do poeta de voz rouca e cabelos brancos. Como nunca o vi frente a frente, lembro-me dele como numa ilustração do pintor de música Elifas Andreato. Durante muitos anos, vivi como Nelson, sempre só, procurando alguém que sofresse como eu também. Vivi pedindo para que as pessoas tirassem seus sorrisos do caminho para eu passar com a minha dor. ...
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24/02/2011 -
Mãe, onde está?
Será que me ouve e escuta o que digo em silêncio? Será que me vela como as velas velam teu altar? Será que me toma como filho ou esqueceu meu nome? Mãe onde está que não a vejo? Por onde caminha? Aninha a minha fé em seu colo, por favor, por amor.
Como eu faço para lhe encontrar? Já não sei mais onde lhe procurar. Já perguntei pros padres, pros anjos, pros santos da paróquia e até agora ninguém me soube dizer como faço para achar o seu passo, ver o seu rosto em meio a tanto desgosto. ...
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23/02/2011 -
Preste atenção
Preste atenção, não diga nem que sim nem que não, apenas ame. Ame sem pensar no minuto seguinte, no que ficou ou passou. Ame atemporalmente e achando-se ou não, perdidamente. Ame de forma ilusória subvertendo a ordem da própria memória. Ame de contração em contração, como que parindo um novo amor a cada gemido. Ame como as sombrinhas amam a chuva, com muita cor, exposição e dança. Ame sem se importar se o que vive é romantismo ou pieguismo.
Ame e chame por esse amor como a flor chama o fruto. Ame e, modéstia à parte, ame como a maior das amantes. Ame ponteando alegrias e martírios. Ame buscando completar a incompletude da vida. Ame privando-se de tudo o que não diga respeito a esse amor. Ame bebendo e comendo esse amor. Ame com todos os suspiros e ais que tiver direito. Ame entre babados e rendas, enrodilhando-se de redondilhas....
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22/02/2011 -
Lições de vida e morte
Tive a honra de ter convivido por quase 25 anos com meus quatro avôs. Também conheci cinco dos meus bisavôs e uma porção de tios-avôs. Se hoje sou um contador de histórias, muito devo a eles. Cada qual do seu modo eles ensinaram-me muitas lições de vida e de morte. Até meus vinte três anos, dez meses e vinte e três dias de vida terrena, a morte ainda era uma coisa estranha para mim. Um tabu. Algo que só acontecia na casa do vizinho. Era como se eles, meus avôs, fossem imortais.
Embora eu já tivesse chorado as mortes de Betinho, Ayrton e Jobim e de alguns bisavôs, o meu círculo familiar mais próximo estava imune aos ceifadores. Durante a noite, acostumei-me a rezar pelos quatro e me questionei várias vezes como seria a vida sem eles. Eram próximos, na verdade, parte de mim. Não posso me queixar que os santos foram generosos comigo, afinal, poucas são as pessoas que puderam ter uma convivência tão intensa quão duradora como eu tive com meus avôs. ...
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Comentários (1)
21/02/2011 -
Porque é segunda-feira
Porque é segunda-feira,
Hoje há alguém que acorda de mau, de mau humor, de mal da vida, de mau caráter. Hoje há alguém que acorda disposto a matar e alguém que acorda querendo morrer. Hoje há alguém que acorda sem querer acordar. Hoje há alguém que perde a hora. Hoje há alguém que nem acorda. Hoje há alguém que se perde no destino ou nos próprios pensamentos. Hoje há alguém que chora a tristeza de existir. Hoje há alguém que grita e ofende a mãe do juiz. Hoje há alguém que nasce disposto a atacar tudo e todos. Hoje há alguém que acha tudo sem gosto. Hoje há alguém que desconhece o próprio rosto. ...
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20/02/2011 -
Mudança de horário
O texto saiu atrasado porque fiz questão de esperar pelo momento exato da mudança de horário. E não o fiz somente para dar adeus e comemorar o fim do relógio de verão que nos fazia acordar no escuro antes mesmo do concerto dos pássaros e trocava a luz das velas no jantar pela luz nada romântica do sol. À meia-noite pude tomar parte da magia de mudar o tempo, de voltar ao passado, de brincar de Deus.
Voltar os ponteiros do relógio em uma hora e poder viver novamente e de forma diferente aqueles últimos sessenta minutos é algo que mexe com dois mundos: o imaginário e o real....
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19/02/2011 -
Edifício de mulher
À primeira visita, a mulher desejada deve ser contemplada do alto de sua arquitetura e engenharia. Porque depois que ela se tornar mulher amada só poderá ser vista de baixo, no ângulo permitido aos olhos que rastejam e ajoelham. Enquanto lhe é permitido voar, alongue as asas e observe bem do alto esse arranha-céu de beleza e tristeza que é essa criatura descendente de Eva. Se não conseguir chegar até lá com suas próprias asas, tente um teleférico, um foguete ou se pendure nos cabelos de um anjo. ...
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