Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 146 de 320.

07/11/2009 - Já faz algum tempo

Já faz algum tempo que não digo o quanto lhe tenho amor. O tempo é tanto que as palavras já congestionam a minha boca. E esse vazio de declarações vai silenciando a tarde que arde de saudade ao meu redor. Tenho tanto a dizer e a redizer que já começo a rodar como um disco antigo e buscar um abrigo para me esconder dos minutos que passam sem você me ouvir falar de você. E se eu não puder lhe dizer o meu amor não quero dizer mais nada. Podem ceifar a minha língua e me deixar marcando a página de um livro. ...
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18/05/2016 - Já não sei mais

Meu violão já não toca. Minha vitrola não gira mais. Meu coração provoca provocado pelos casais de namorados. Minha vida já não raia e meus pés já vão longe da praia. Minhas louças não saem do armário e minhas poesias enchem as gavetas. E eu desafino quando murmuro sua letra. Eu já te acho me perdendo e tudo vai correndo para longe, para longe, para longe do que sonhei. Minha cama já não geme e anda mais arrumada do que eu. E um passarinho indiano me soprou tudo é Maya, inclusive você e eu.


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06/02/2016 - Já passa das nove

Já passa das nove e eu ainda te espero. A não ser que me prove o contrário, eu sempre te quero. Já enxergo seu rosto pelas nuvens e sinto o seu gosto e até o seu silêncio me ruge. Sua pele conversa com a minha e meu coração plebeu a chama de rainha. Meus pés tropeçam nos seus rastros. E eu saio do meu mato para te buscar no asfalto. Eu rebato toda saudade com mais saudade e assim faço da minha a sua, a nossa cidade de memórias e histórias sem idade. Já passa das nove e chove em mim a felicidade de vê-la dançando, se dando, deitando no jardim das bromélias, ou seria das camélias? Não importa, quando chegar saiba que a porta estará aberta e a minha metade de tudo ainda deserta, pronta, plenamente pronta para ser preenchida e vivida por você e seus porquês.


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Já pulsa um novo tempo

Já ouço os sinos ansiosos de um papai-noel assoberbado vindo em seu trenó de renas cantantes à procura de nossas chaminés imaginárias. Já vejo as crianças esperando ansiosas as respostas de suas cartinhas postadas ao Pólo Norte. Já vejo os trabalhadores sonhando com as férias. Já sinto o cheiro dos assados natalinos. Já plana no ar a voz do rei Roberto Carlos trazendo nossas emoções à flor da pele.

Já há quem deguste panetones, castanhas, uvas. Já há quem coloque seus planos no papel. Já há aquela menina sonhando com uma boneca e um menino desejando um carrinho. Já há quem mergulhe fundo na agenda do próximo ano. ...
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Jabuticaba

Jabuticaba. Talvez nenhuma palavra mexa mais com o meu imaginário do que essa. Um bosque. Um lago. Um desejo. As abelhas. As pessoas vindas de não sei onde com o mesmo objetivo. As bocas, grandes e pequenas, esganadas e delicadas, todas experimentando para ver em qual árvore a frutinha estava mais doce. Andava-se de um pé para o outro, sem parada certa. Mas quando decidia fazer do pé uma parda, subia-se, de forma experiente ou desengonçada, por aqueles galhos fechados. Aquela madeira centenária se vestia de negro. Como que quisesse vestir-se de glamour, vestia-se com um vestido de bolinhas de açúcar em um gosto que não sai da boca....
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30/09/2011 - Jacy (Minas-Brasília) Afonso

Ê Minas, ê Minas!

Aos apitos festeiros, uma maria-fumaça traz vagões e mais vagões de histórias para uma cidade que ainda constrói seus trilhos. Nos olhos de um homem-menino o mundo das tradições se mistura ao cenário contemporâneo. O barroco voa nas asas do modernismo. Aleijadinho e Niemayer dividem a mesma escultura. As veredas de Guimarães Rosa seguem paralelas aos eixos de Lucio Costa. Com muito a contar, as folhas das janelas de madeira se abrem aos calados prédios espelhados. As pedras das ladeiras e os azulejos de Athos Bulcão se encontram no botequim do horizonte. ...
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19/10/2009 - Jacy Afonso, cavaleiro de sonhos

Vivendo a riqueza das tradições mineiras, sua família partia em romaria cruzando os sertões brasileiros no lombo de um cavalo em honraria aos céus. Sem tempo para se dedicar aos costumes de Minas, ele corre, articula, aponta, discute, analisa, debate, mobiliza. Trocou o cavalo pelo avião e as veredas pela ponte aérea Brasília - São Paulo. Jacy Afonso de Melo foi uma das primeiras personalidades do peculiar mundo político da capital federal que conheci frente a frente, na época, diante de uma xícara de café nas mesas de uma casa de tortas com sotaque italiano. ...
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08/01/2010 - Jandaias

Como é bom acordar pela manhã e, ao saudar o dia recém-nascido, encontrar um casal de jandaias nas galhas desfolhadas por um outono fora de época. Equilibrando-se entre as cruzas dos ventos sudoestes, os enamorados periquitos realizavam uma espécie de dança naquela árvore do cerrado. De maneira bastante sutil, beijavam-se, agarravam-se, desejavam-se. O céu gritava azul ao contrate das duas jandais que insistiam em misturar seus corpos verdes.

A poucos metros de distância tentei escutar o que diziam. Mas como não entendo jandaês, pus-me a imaginar o cancioneiro poético que o macho soprava no ouvido da fêmea. Não estavam discutindo a relação, afinal a conversa era intimista demais. Também não falavam amenidades, pois as palavras motivavame e eram motivadas por carícias. Devia ser algo impróprio para o horário já que o barulho costumeiro das aves se restringia a sussurros. ...
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15/04/2011 - Janelas abertas à chuva

De repente, um anjo distraído tropeça e derrama uma lata de nanquim pretejando as nuvens, que, na tentativa de expelir a tinta que as deixa pesadas (gordas), choram. Guardiões da ordem celestial lançam raios na tentativa de iluminar aquela escuridão e castigar quem provocou aquela confusão. O anjo tenta se esconder a todo custo, arrasta móveis para lá e para cá, bate portas e portões... Trovões. O choro aumenta, a chuva aumenta. O vento é convocado para limpar aquela lambança. O choro caído, sentido, colorido, quando carregado pelo vento ganha direções e nações....
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22/11/2015 - Jardim vazio

Olhei pro jardim não vi flor nem capim. Assustei com tudo desflorido, desverdeado, revirado. Ai de mim, fiquei abobado. Os girassóis se foram, ficamos sós como sóis. Sóis desertos. Sóis sem fetos. Sóis nada pertos das suas luas. Jardineiras nuas. Quintais brasileiros. Canteiros sem camélias, astromélias, bromélias. Uma antiprimavera no mundo inteiro. E eu sem saber se semeava, se ressemeava ou se corria do verbo desaparecer. Eu não sabia se chorava ou se morria de dizer: Cadê? Cadê? Cadê o buquê? Cadê o ramalhete? Sumiram por quê? Das rosas não sobraram nem as prosas. Das hortênsias ficaram as inflorescências. Das papoulas não restaram nem as tolas. Das margaridas foram todas idas. As primaveras, em todas as suas eras, foram dadas como lidas. E o jardim da minha vida desbotou, mirrou, murchou, acabou... O jardineiro se despediu. O florista fugiu. O floreio faliu. E do amor-perfeito urgiu o vazio.


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