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Encontrados 372 textos. Exibindo página 8 de 38.
23/03/2015 -
A chuva no bico do João
Choveu, a menina entrou debaixo da coberta. Choveu, a lavadeira se queixou. Choveu, o pintor de parede preocupou-se com sua meta. Choveu, o sino da igreja nem tocou. Choveu, o menino não foi jogar bola. Choveu, deu preguiça de ir para escola. Choveu, o jardineiro agradeceu. Choveu, a florista enlouqueceu. Choveu, o carro não saiu do lugar. Choveu, no fogão uma sopa pro jantar. Choveu, guarda-chuvas e sombrinhas se abriram como flor na primavera. Choveu, a roupa deu em lama. Choveu, não faltaram convites para cama. Choveu, tudo fica mais lento e o relógio não espera. Choveu, o pescador se animou. Choveu, a mulher reclamou que ninguém limpou o pé para entrar em casa. Choveu, passarinho sacudiu a asa. Choveu, passarada cantou pra valer. Choveu, João que é de barro ganhou o que fazer. Choveu, João colheu sua matéria-prima pelo quintal. Choveu, Joana-de-barro pode fazer seu enxoval. Choveu, João-de-barro vai construir no alto do angico. Choveu, e o João-de-barro levou a chuva no bico.
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08/03/2015 -
Almoço só
Ai meu amor, o almoço está pronto. Eu ainda ando tonto, mas fiz tudo o que você mais gosta. Nossa mesa está posta e seu lugar, vazio. Ai chega a me dar arrepio colocar seu prato e você me dar esse destrato. Sua ausência é corte em minha alma, é o desarvoramento que cala fundo na minha calma, é proeminência à morte. Ai meu amor eu preciso ser forte para engolir a minha solidão. Eu tenho catado esperança como se cata feijão. Eu ando procurando você pelos temperos, achando-a em cada cheiro. Comprei aquela louça que você sempre quis e fiz o cardápio para lhe fazer mais que feliz. Fiz suco para manchar seus lábios e num romantismo sábio estou pronto para dar a vida minha pouca na sua boca. Ai meu amor como é difícil conversar com você sem escutar sua voz, ser apenas eu ao contrário de sermos nós. Fiz a sobremesa inspirado em sua beleza que se reflete no espelho como a minha tristeza de ser tão só, de ser tão só, de ser tão só que a minha poesia queima e o meu dia vira pó.
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25/02/2015 -
A princesa dos corvos
No seio da civilização, nos campos de Roma, uma garotinha flerta com corvos, alimentando-os com amendoim. Ao contrário de flores, o jardim de sua casa é salpicado por asas negras. A pequena corre por entre as aves, que não se assustam com suas peripécias. Ela e os corvos dançando aos olhos dos pais admirados com aquela troca de afeto. Para retribuir o amor e os amendoins, os pássaros começaram a presentear a menina com presentes, em sua maioria presentes reluzentes. Tudo o que brilhasse aos olhos dos corvos traziam-na. E assim, a pequena romana ganhou botões, parafusos, brincos, pedrinhas, clips de papel, lampadinhas, pingentes... As aves negras traziam o colorido em seus bicos à menina que os mimava como se fossem suas bonecas encantadas. Mesmo sem querer recompensa alguma por aquele amor passou a guardar aqueles mimos sentindo-se princesa de um reino de corvos. O seu castelo era a própria natureza, com árvores e sentimentos vivos capazes de deixar até a mais cética criatura boquiaberta com tamanha magia. Como flores negras, aqueles pássaros enfeitavam o jardim e bailavam ao vento diante da menina que sonhava voar com eles. Quem sabe um dia eles a levariam para além das nuvens. Quem sabe um dia eles a trariam uma estrela. Quem sabe um dia algum deles se casaria com ela virando homem após ter seu feitiço quebrado. Quem sabe...
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21/02/2015 -
Atente-se ao seus passos
Não importa para onde e do que se esconde, é fundamental seguir. Ficar parado não faz bem nem para você nem para o caminho. É preciso continuar nem que for para recomeçar ou para mudar o rumo. Pode até mesmo voltar tentando encontrar o que não achou, mas é imprescindível se movimentar para alguma direção. Até mesmo as árvores mudam de lugar sem que coloquemos reparo. Elas caminham pela noite, chegam a dançar nos bosques, a trocar sementes, a se deitar em outras raízes, e muito mais, sem que vejamos. Porém não precisamos ocultar nossas movimentações como as árvores ou como as criaturas encantadas, como anjos-da-guarda, cupidos, duendes, fadas, elfos, deuses... Podemos deixar rastros, agradeça e coloque em prática essa dádiva. Devemos escrever nossas histórias utilizando nossos passos. Caminha desenhando corações, famílias, projetos, altares, lágrimas, saudades, lugares, sonhos, sorrisos... Cada passo seu pode desenhar uma guerra ou um cessar fogo, daí o tamanho da sua responsabilidade. Seu passo é sua sentença. Portanto, nada de ficar parado, fadado a não deixar nada escrito. Seu corpo é devorado pela terra, mas seus rastros são nítidos milênios depois até mesmo para quem habita as estrelas.
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07/02/2015 -
Amor pra vida inteira
Quando da Portela, ela esnobava o malandro que roubava seus olhares do alto de sua janela. Quando da Imperatriz, ela confessava que por mais que amasse e se entregasse não era feliz. Quando da Grande Rio, ela desfilou com todo respeito ao estandarte, mas num sorriso vazio como se sua cabeça estivesse em Marte. Quando da Mocidade, ela foi destaque, verdadeira obra-de-arte no abre-alas, vestida de saudade. Quando da Vila Isabel, ela ganhou o nobel da imaginação, pensando que Noel pra ela entregava o seu samba-coração. Quando da Estácio de Sá, ela beijava para lá e para cá querendo se reencontrar. Quando da Império Serrano, ela saiu na comissão de frente querendo fazer diferente mas foi tudo engano. Quando da Beija-Flor, ela teve tanto glamour quanta solidão que olhava pro malandro dizendo bonjour como se nem pisasse no chão. Quando da Viradouro, ela dizia que amava deus e o mundo mas lá no fundo ela escondia o ouro. Quando do Salgueiro, acreditou que o sentimento que doava era lhe entregue de modo inteiro. Quando da União da Ilha, ela foi a muitas milhas do que poderia ir e no meio da avenida chegou a cair. Quando da Caprichosos de Pilares, ela batia os bares e os altares com a mesma intenção. Quando da Mangueira, novamente, ela chorou copiosamente, pedindo perdão ao malandro pelos meandros de um verso que admitia a traição e assumia a agremiação pela vida inteira.
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05/02/2015 -
A melhor idade
Qual a melhor idade? Aos 5 meses, quando ainda não se conhece a realidade? Aos 5 anos, quando ainda não se tem conta para pagar? Aos 15, quando vivemos um tsunami de sonhos e paixões? Aos 35, quando se está muitas vezes no auge da carreira? Aos 50, quando a qualidade dos passos ganha importância em relação ao ritmo? Aos 70, quando cada segundo ganha um valor imenso? Aos 85, quando nossas histórias são verdadeiras lições de sabedoria?
A melhor idade é sem dúvida a que estamos agora, basta que nós queiramos que ela seja a melhor. Mas, sem dúvida alguma, depois dos 60 nos tornamos uma safra humana de excelência. Afinal, não há nada mais valioso do que a nossa trajetória. Com erros e acertos, vamos desenhando um caminho cheio de curvas e retas, de subidas e descidas, de encontros e despedidas. Um caminho que muitos chamam de destino....
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Comentários (2)
03/02/2015 -
Assovio mágico
Quando você assoviou a minha tarde mudou de cor, de temperatura e até de textura. Foi uma loucura para todos os meus lados, do direito ao avesso foi me virando e revirando. Como se um pássaro me assoviasse a canção predileta chamando-me para o ninho de sua boca, tornei-me lábios e ganhando asas fui ao seu encontro. Fiquei tonto por tudo, fiquei pronto para tudo. A saudade se estilhaçou em segundos com as notas que tocaram fundo vindo desses lábios tão sábios de mim. Você foi falando a língua do desejo e o sol se envermelhou ao nosso beijo. E do nosso enroscar de asas surgiram tantos gritos, tantos ritos, tantos mitos. A tarde virou manhã, o azul do dia virou céu estrelado, as árvores ganharam perfume, as pedras cantaram o nosso bingo e tudo ficou lindo, ainda mais lindo, de se ver. E antes de falar qualquer sílaba, o assovio cortou meu peito como flecha de cupido. Não vi mais nada senão minha amada e um rio. Um rio de arrepio interior. E veio o calor, e veio o resplendor e veio então o meu, o seu, o nosso amor.
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06/01/2015 -
Abandono do abandonado
Asa de mosquito. Casca de barata. Antena de borboleta. Couraça de besouro. Fóssil de pernilongo. Tudo pelo chão acusando a falta de cuidado, a falta de habitação, as garras da solidão. Cama desarrumada. Poeira pelos cantos. Teias de aranha. Livros empilhados. Janelas fechadas. Portas emperradas. Panelas vazias. Rascunhos jogados. Vida embolorada. Ciscos trazidos por um vento invisível. Silencio e pó. Heróis e mocinhas esquecidos nas páginas amareladas dos romances que caíram da estante. Sonhos rasgados. Esperanças desbotadas. Velas queimadas, palitos de fósforo quebrados. Provas de abandono por quem abandonado foi.
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09/12/2014 -
A menina do pé
A menina que passou sob um pé de jatobá pode ser que nunca vá se casar. A menina que subiu numa jabuticabeira já desistiu há tempos de ser freira. A menina que se lambuzou de amora não vai dizer por aí onde mora. A menina que se acostumou a dormir em travesseiro de paineira não vai pegar no sono com a cabeça na madeira. A menina que se delicia com pitanga é de ficar procurando pitangueira na lua noite alta na varada. A menina que se dependura num pé de ameixa vive pedindo deixas. A menina que dorme debaixo de um pé de ingá gosta de namorar. A menina que sonha em carregar buquê de flor de laranjeira não vai subir descalça a ladeira.
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05/12/2014 -
Acabado e sacramentado
Acabou. Nunca mais vai ouvir minha voz. Nunca mais vai chegar nada meu para você. Nunca mais vai colocar os olhos em mim. A partir de agora, serei silêncio e vazio na sua vida. O que passou, passou. Nada ficou. Tudo se findou. Se ainda existia algum elo, por mais tênue que fosse, rompeu-se. Qualquer coisa que podia continuar entre nós, perdeu-se. De agora em diante, somos dois estranhos. Os erros e arrependimentos foram tamanhos. É como se já tivessem passados mil anos, pois, em matéria de sentimento, está tudo esvaído. Caso resolvido. Tudo terminou. A ilusão que se tinha o vento carregou. A página virou e o romance antes de acontecer, acabou.
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