Daniel Campos

Texto do dia

Se você gosta de textos inéditos, veio ao lugar certo.

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Encontrados 28 textos de fevereiro de 2011. Exibindo página 2 de 3.

18/02/2011 - Grand-Ópera

Quero pegar o trem que me leve para o mês que vem. Quero pegar a rua que me leve para lua. Quero pegar o a trilha que me leve para deserta ilha. Quero pegar o caminho que me leve para um bom vinho. Quero pegar a estrada que me leve à criatura amada. Quero pegar a direção que me leve a uma paixão. Quero pegar a nave espacial que me leve a outro astral. Quero pegar o cavalo de aço que me leve às flores de março. Quero pegar o submarino que me leve ao feminino.

Quero pegar a vela que me leve a outra janela. Quero pegar o nevoeiro que me leve ao meu eu mais inteiro. Quero pegar a vereda que me leve ao bicho da seda. Quero pegar o balão que me leve à próxima estação. Quero pegar a via que me leve ao mundo de fantasia. Quero pegar o destino que me leve ao tempo de menino. Quero pegar o vento que me leve ao rebento. Quero pegar a cruz que me leve à luz. Quero pegar o avião que me leve para o anjo coração....
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17/02/2011 - Doração

A dor me consome. Uma dor que não dorme. Uma dor com tantos codinomes e sem nenhum nome próprio. Uma dor que me tira a fome, que me tira o sono e me dá o ópio. Os delírios e as fantasias de uma criatura dorida, sentida da vida. Os lírios e as poesias ficam para depois dos espinhos e gritos impossíveis de serem decodificados, quiçá entendidos. A dor que me faz aflito e me toma sozinho. A dor que alimenta o desespero e fecha todo e qualquer caminho. A dor que fermenta e envelhece como um bom vinho. ...
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16/02/2011 - Cidade solidão

A solidão é um sentimento negativo por natureza e em permanente construção. Não só pelos acessos em péssimo estado de conservação, pela sensação de noite eterna, pelas paisagens de uma guerra civil e pelas falas decadentes da época em que se flertou com a felicidade, mas também por toda uma tentativa de reerguer-se depois da separação. Separação de algo, de alguém ou, até mesmo, de si próprio. Quem nunca foi obrigado a se separar de sonhos ou projetos?

A solidão é um campo espesso, infinito e ao mesmo tempo claustrofóbico. Tem tonalidades sombrias e temperaturas frias. É o último lugar que se escolheria num roteiro turístico. Ali, em solidão, a vida é falha e pouco convidativa, melhor dizendo, é uma vida degenerativa. Solitários são como ilhas navegando no meio do oceano da multidão. Ilhas que não se comunicam, tampouco interagem com o ambiente. Apenas flutuam no vazio, exterior ou interior. ...
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15/02/2011 - Por que escrever?

É preciso escrever para manter acesa a chama que me clama a me escrever. Escrever para sofrer e padecer e também para alcançar um misterioso prazer. Escrever para antever, para remoer e meio que sem saber o que escrever. Escrever para dissolver sua força bruta. Escrever a ler e a reler o que se pôs a fazer. Escrever para conter os canhões e render as solidões. Escrever para proteger os corações. Escrever para viver uma página a mais. Escrever para reviver os casais. Escrever para romper o silêncio. Escrever para satisfazer ou umedecer outros olhos. Escrever para tecer a arte com símbolos e óleo. Escrever para esquecer e para se lembrar do que está a se perder. Escrever para doer e para parar de doer. ...
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14/02/2011 - Gosto de você

Eu gosto de você exatamente assim, como que feita sob medida para mim. Gosto de cada fragrância que nasce em sua pele, em seus pelos, em suas entranhas. Gosto de seus saltos, de seus tatos, de suas manhas, e das suas tramas, do seu jeito de andar, de parar, de pousar sobre a cama. Gosto de sua aristocracia, da sua multidão, da sua poesia-coração, da maneira que encontrou para ser felina e dama na mesma canção.

Eu gosto de você sem tirar nem por: metade ódio metade amor. Gosto das paisagens concretas ou abstratas, conhecidas ou inéditas que surgem em seus olhos de condor. Gosto do seu açúcar e do seu veneno, eu gosto de você assim nenhum quilo a menos, nenhum centímetro a mais. Gosto de você como um barco gosta do cais, sempre por perto. Gosto de você como se gosta de um sonho predileto....
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13/02/2011 - Canção de Peão

Quem vem lá, quem vem de lá? É o peão que não tem medo da morte desafiando a vida montado no cavalo do norte. Peão que tem porte de homem e alma de menino, chapéu rústico e trato fino. Veste linho e troca o vinho pela cachaça. Nunca se perde e acha até agulha no palheiro. Homem do campo, planta sua vida no terreiro em pés de peão estradeiro, peão campeiro, peão ilusão, peão coração, peão violeiro, peão boiadeiro.

Quem vem lá, quem vem de lá? É o peão pé de valsa, que calça botina e roda a cabeça das meninas. Peão do zóio verde que tem sede de olhar o que é bonito. Peão que gosta de ser visto sempre alinhado e tocando o próprio destino. Peão que tem no peito um berrante, pulsando e chamando sua boiada para perto de si, batendo e cantando pela estrada feito peão bem-te-vi....
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12/02/2011 - Dizem que sou louco

Dizem que sou louco porque falo sozinho, porque ando em ziguezague, porque leio de trás pra frente. Louco porque almoço no café da manhã e durmo na hora do jantar. Louco porque só rezo para o demônio e só cobro dos santos. Louco porque saio sem destino e descaminho os caminhos. Louco porque invento histórias e me perco nas próprias memórias. Louco porque converso com as plantas, com as pedras, com o espelho. Louco porque bebo com poetas que já morreram e canto músicas que ainda não foram compostas. Louco porque queria que todos os dias fossem chuvosos. ...
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11/02/2011 - O capeta que se cuide

Enquanto muita gente não quer nem ouvir falar no coisa-ruim, o velho Joaquim, que adora fazer marketing a respeito de sua bandidagem, garantiu que seu maior desejo é encontrar o diabo e lhe meter seis tiros na cabeça. Diz que uma legião acredita no demônio, atestando sua existência por meio de textos de livros sagrados e de experienciais reais. Já chegou muita conversa em seu ouvido, mas até agora não ficou frente a frente com o capeta. E lamenta profundamente por isso. No seu entender só pode estar ocorrendo duas coisas: ou o chifrudo não existe ou está bem escondido, com medo do que vem pela frente. ...
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10/02/2011 - O reino de Anúbis

O clima de revolta e guerra instalado no Egito só pode significar uma coisa: Anúbis, o deus dos mortos e do submundo, prepara sua volta em grande estilo. Deve estar usando Seth, seu pai e deus da desordem e da violência, para resgatar o trono que um dia lhe pertenceu. Portanto, não estranhe se múmias levantarem das tumbas e frustrarem tanto os projetos dos capitalistas quanto os dos muçulmanos para a região.

Os chacais de Anúbis estão soltos. Homens estão sendo usados pelo guia dos mortos para levar o Egito aos seus tempos áureos, do grande Nilo. Sacerdotes estão reunidos nos antigos templos alimentando o espírito de guerra. Faraós se armam e marcham inspirados pela beleza de Cleópatra. Rá, o principal deus da religião egípcia, está preso nos confins de alguma das pirâmides remanescentes. ...
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09/02/2011 - Matar o tempo

Estou atrasado. Perdi a condução, perdi a condição, perdi a minha hora, perdi o nosso horário. O relógio me passou a perna. E eu achei normal. Feliz o tempo em que os homens costumavam medir suas vidas de acordo com o tempo de plantar e colher. Ninguém se preocupava em medir o tempo em termo de exatidão matemática. O tempo era uma coisa divina, uma espécie de dádiva a ser usada em nosso favor. Hoje, é um castigo. O tempo é calculado em suas frações minúsculas numa ciência exata e objetiva. O tempo foi materializado. Tornou-se um vilão, um algoz, um elemento concreto. Um pesadelo permanente e constante. Afinal, já reparou que o tic-tac não cessa? ...
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