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Encontrados 32 textos de julho de 2010. Exibindo página 3 de 4.
11/07/2010 -
Carta a Vinícius
Caro poetinha,
Sinto em lhe informar, mas se estivesse aqui, com a alma encarcerada num corpo físico, limitado à vida mundana, não escreveria com a facilidade característica. Com todo respeito ao fato de que estaria quase completando cem anos se a morte não ousasse lhe visitar naquele trágico julho de 1980, o obstáculo o qual me refiro não tem relação alguma com a idade.
Sua Excelência, pois foi nomeado ministro de primeria classe, era um descobridor do universo feminino. Um poeta do mistério. Com delicadeza e tato aguçado, explorava o território feminino tanto na superfície estética quanto na profundidade da dialética que há em cada mulher. ...
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10/07/2010 -
Dália de carne
Adélia era uma mulher que cultivava dálias no complexo de jardins que mantinha na frente de sua casa. O único lugar em que me deparei com essas flores graúdas e coloridas foi naquele canteiro que tinha um coqueiro no centro e cacos de azulejo vermelho, azul e amarelo dispostos num mosaico ao longo do passeio. Depois da morte de Adélia nunca mais encontrei as tais dálias. É uma pena eu não ter ficado com sementes ou com algumas batatas daquela planta-mãe. Nem mesmo as pétalas eu me lembrei de guardar dentro de um livro. Assim como Adélia, as dálias desapareceram das minhas vistas. ...
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Comentários (1)
09/07/2010 -
Não há, ó gente, oh não...
Com a bola no pé, queria ser Pelé ou Mané. Com o lápis na mão, queria ser Drummond. Na beleza que há na fé, queria ser madre Tereza de Calcutá. Na contracena que tal ser Ayrton Senna. No adiantar da prosa, queria ser Guimarães Rosa. Diante da mulher de olhos de cais ai se eu falasse como Vinicius de Moraes. Seja nos palcos de Amsterdã ou de Taiwan, queria ser Paulo Autran. E se a vida me desse o afago de ser por alguns minutos Mário Lago? Agora, se eu pudesse perder a cabeça como Joana D’Arc viveria de canção em canção como Chico Buarque. ...
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08/07/2010 -
Beijo de avelã
Era para ser mais um amor adolescente desses feitos de arroubos e levezas da estação. No entanto, como num texto de Shakespeare, a paixão ganhou contornos de tragédia. E então do romantismo inocente de um beijo no pátio da escola, fez-se o pânico. Para além dos característicos e inofensivos tremores de pernas e arrepios, a jovem britânica começou a ter dificuldades de respirar e ganhar um inchaço crescente no rosto.
Sem entender aquela cena, como se vivesse um script paralelo, o garoto entrou em desespero. Não. Não havia nada de premeditado naquilo. Era tão vítima como ela. Como poderia saber que ao comer uma barra de cereal, o sabor das avelãs impregnaria seus lábios a ponto de envenenar a namorada durante um leve e doce beijo. O escritor do destino teria de ser cruel demais para findar assim uma história de amor. ...
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08/07/2010 -
Na mídia: Amor Junino
Hoje é dia de São João. Dia de muita alegria. Dia de pular fogueira, tomar quentão, comer pé de moleque, soltar balões... Em comemoração a esta data festiva, estou postando abaixo um belo texto de Daniel Campos, poeta, escritor e jornalista
Amor Junino
Amor junino que se preze pula fogueira, ferve como quentão e estoura dentro da gente feito pipoca. Tem um toque caipira de inocência. No amor junino a quadrilha é de dançarinos; o casamento, de mentira e o pé de moleque, de amendoim. Sob os olhos e bênçãos de Santo Antônio, o coração é aberto com muito jeito à moda de pinhão. No amor junino, o milho assado ganha bastante manteiga e o vinho, açúcar e quentura. A mulher tem olhos de balões coloridos, tranças de Rapunzel sertaneja e sonhos de arraial....
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07/07/2010 -
No fundo do seu íntimo
Entre o canhão e a escuridão, no fundo do seu íntimo, existe uma canção de amor. Pode acreditar, esta melodia existe e o verso não é assim tão triste como se acredita. Há sempre tempo e espaço para amar e viver esse amor independentemente de hora e lugar. Um romance de três segundos e um beijo de seis meses podem ter a mesma duração na intensidade poética de se compreender as coisas do coração. Pois então, cante avante o refrão de modo que espante do leito do peito a fria e vazia solidão.
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06/07/2010 -
País cara de pau
Todos pintam o rosto. Todos falam com gosto. Todos levantam uma bandeira. Todos se esquecem da canseira. Todos viram técnicos. Todos têm palpites proféticos. Todos falam mal da mãe do seu juiz. Todos vivem por um triz. Todos se reúnem com todos. Todos vão do céu ao lodo. Todos têm um feitiço particular. Todos bebem de bar em bar. Todos têm suas crenças. Todos têm suas exigências. Todos se esforçam para cantar o hino nacional. Todos se esquecem do mundo real.
Todos entram no gramado. Todos dizem: isso ta certo, aquilo ta errado. Todos têm um motivo para comemorar. Todos querem apostar. Todos comem pipoca com coca-cola na frente de uma tv japonesa e ainda dizem que são nacionalistas. Todos são anônimos e artistas. Todos têm uma receita infalível. Todos se unem para combater o mesmo pesadelo terrível. Todos têm uma escalação na cabeça. Todos têm no coração o desejo de vença. ...
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05/07/2010 -
Virgens de Copacabana
A mulher precisa voltar, precisa voltar às origens para não se olvidar, por uma semana sequer, das virgens de Copacabana. Ondas que nascem no eclipse do oceano e se levantam do ventre do mar como um apocalipse nuclear. Com força e beleza femininas, as ondas correm pelas vistas como meninas descalças avançando, sem perceber, sem querer, em cristas de valsa. O perfume das ondas é brisa que o pássaro leva em suas asas, é a melodia que um piano traz ao rádio da nossa casa, é a poesia que extravasa na maresia. ...
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04/07/2010 -
Toada da porteira da estrada
Lá no alto da porteira, num galho da velha cumeeira, mora um pássaro preto que assovia bonito toda vez que vê moça fagueira romper o estradão. Conta uma lenda cabocla que ele era Dito de Benedito, moço bonito e de muitas posses, cobiçado na região. Tava de casamento marcado com uma morena de olhos de brasa quando se apaixonou pela filha de um tropeiro. Numa noite de lua prateada o coração do peão balançou e da aliança de noivado até a casa, que já tava toda montada, tudo se perdeu pela estrada. ...
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03/07/2010 -
De grão em grão
É de assovio em assovio que um pássaro faz sua canção. É de tijolo em tijolo que o homem ergue sua construção. É de ponto em ponto que a mulher compõe suas rendas. É de centímetro em centímetro que ela seduz através de suas fendas. É de milho em milho que a galinha enche o papo. É de passo em passo que se molda um sapato. É de gota em gota que se enche um copo. É de zoom em zoom que se acha o foco. É de tronco em tronco que se faz um arvoredo. É de mão em mão que se passa um segredo.
É de beijo em beijo que se escreve uma novela. É de barraco em barraco que se monta uma favela. É de rua em rua que se trança uma cidade. É de ausência em ausência que se faz saudade. É de procura em procura que algo se acha. É de memória em memória que se fecha uma caixa. É de botão em botão que se chega à nudez. É de desespero em desespero que se alcança a insensatez. É de rosa em rosa que a primavera visita um jardim. É de rama em rama que se alastra o amendoim. ...
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