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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 68 de 320.
09/01/2015 -
Como antes, ou não
Eu não estou no seu porta-retrato. Eu nunca sai na sua foto. Eu sempre fui escondido. Pra você fui um homem proibido. É fato. Meu copo não bate com seu copo. Eu fui o seu hospício. Você foi o meu precipício. Hoje a gente se encontra e não se dá conta do que se é. Será que ainda sou seu menino? Será que ainda é a minha mulher? Pra que lado vai o nosso destino? Fui a sua nuvem. Você me deu ferrugem. O seu lado da cama ainda está vazio. Você desceu e eu subi o rio. E agora como é que a gente faz porque nossa história nunca foi nem é de tanto faz como tanto fez. Podíamos nos recomeçar mais uma vez da forma certa, você musa eu poeta.
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08/01/2015 -
Para perto de si
Chama-me para perto de si. Perdoa a minha distância e me aceita debaixo de sua saia. Chama-me para seus cuidados. Entoa nosso amor, novamente nosso amor, nosso amor mais que iluminado. Chama-me para seus sóis alaranjados. Deixa novamente minha vida se enroscar na sua. Chama-me de maldito, de bendito, deixa o dito pelo não dito. Desata o nó do meu coração. Chama-me para um último primeiro beijo. Faça todo e qualquer rito que leve à paz entre nossas bocas. Chama-me para romper o silêncio. Impeça que nossos retratos virem pó. Chama-me para velar o que ficou. Desista de tentar deixar o que não terminou. Chama-me de covarde. Venha me dar um sopro da sua coragem. Chama-me de pecador, mas não despreze um corpo que queima do seu mais puro amor. Chama-me para perto de si. E que tudo mais seja de repente, reticências e por favor.
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07/01/2015 -
Tia Dodô e o céu das águias
No céu de Madureira, a águia-mãe se veste de negro e alça um voo triste sobre passistas que não passam, acenam o luto da despedida. Tia Dodô, com o coração de águia que sempre teve, voou pra outras bandas em busca de um jardim de flores brancas e azuis. Dama das damas, Maria das Dores Alves silenciou os nossos tamborins. Aos 95 anos, a primeira porta-bandeira, que desfilava desde os 14 anos defendendo a azul e branco, foi sambar noutro lugar junto de Paulo da Portela, Candeia e Heitor dos Prazeres. Salve os bambas que aplaudem da janela Tia Dodô, que aos 84 anos desfilou como rainha da bateria nota 10 de Madureira; Coisas de Portela. Lá em Mangueira e na velha quadra da Estácio se chora a partida de Tia Dodô. Aplausos e repiques para mais uma rainha que subiu para os céus das águias que bebem das águas do carnaval do Rio.
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06/01/2015 -
Abandono do abandonado
Asa de mosquito. Casca de barata. Antena de borboleta. Couraça de besouro. Fóssil de pernilongo. Tudo pelo chão acusando a falta de cuidado, a falta de habitação, as garras da solidão. Cama desarrumada. Poeira pelos cantos. Teias de aranha. Livros empilhados. Janelas fechadas. Portas emperradas. Panelas vazias. Rascunhos jogados. Vida embolorada. Ciscos trazidos por um vento invisível. Silencio e pó. Heróis e mocinhas esquecidos nas páginas amareladas dos romances que caíram da estante. Sonhos rasgados. Esperanças desbotadas. Velas queimadas, palitos de fósforo quebrados. Provas de abandono por quem abandonado foi.
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05/01/2015 -
Epidemia no céu
O céu foi tomado por uma epidemia de nuvens. São nuvens brancas, negras, rosas. O céu azul nunca mais foi azul. O céu deixou de ser dos anjos para ser das nuvens. E são infindos formatos, tamanhos, profundidades que nossos olhos terrenos chegam a ficar tontos com tanta informação. Há nuvens de chuva e de seca. Há nuvens engraçadas e sem graça. Há nuvens inteiras e partidas. Há nuvens de bichos e homens. Há nuvens simples e dobradas. Há nuvens carregadas e vazias. Há nuvens de dar medo e de se apaixonar. Há nuvens de sombra e de sol. Há nuvens de silêncio e de trovão. Há nuvens aos pares e na solidão. E epidêmicas, as nuvens se multiplicam na velocidade da luz. Com nuvens só há nuances de luar. Sim, a lua fica semanas sem dar os quartos. E as estrelas ficam detrás das cortinas de nuvens se esforçando pro seu brilho não ser em vão. As nuvens que embelezam o céu são as mesmas que escondem o universo por detrás de seu falso véu.
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04/01/2015 -
Cruzada
Ela chega e cruza pernas, cruza braços, cruza olhares. Ela é de cruzada, das antigas cruzadas que se matava em nome de deus. E o seu deus é sedutor, é sedução. Ela é de cruzar. Cruza noite e dia com homens, mulheres, titãs e até mesmo com deus. Cruza por prazer, por fé, por amor e por não ter mais o que fazer. Cruza por ruas, avenidas, alamedas, chegadas e partidas. Ela cruza traços, abraços, beijaços. Cruza laços e embaraços. Seu corpo é cruzamento em movimento.
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03/01/2015 -
Dias secos
Meu amor, que calor, quanto sol, falta nuvem, o azulão urge, o vento sumiu, tudo sopra quente, o sangue ferve, a lágrima evapora, a poeira ergue, a chuva foi embora, o rouxinol caiu, as pedras pipocam, os rios sem força já não desembocam no mar, as águas ficam pelo caminho, o suor toma de conta, queimaram os ninhos, a cachoeira já não ronca, o sono se perdeu, a fome morreu, o gado esqueleteia, a onda seca serpenteia, cadê a chuva, cadê a chuva, cadê a chuva por estas costas ruivas?
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02/01/2015 -
Luz azul
Tão logo a noite do sul caiu as estrelas se jogaram uma a uma aos pés da mulher que passa por retas curvas como um farol. E eu, barco perdido no oceano das paixões, com todas as bússolas interiores girando em falso, fui ao encalço daquela luz perfumada de azul. Uma luz de porte que cortava como lâmina estrelada, afiada e brilhante como as previsões da morte. Eu não sabia se ia ao seu encontro ou se fugia, ainda tonto, depois da última surra dos piratas do norte. Quanto mais avançava, mais aquela luz me atiçava. Como sereno, suava, chorava, cravava meus olhares naquele raio que se jogava aos meus braços. A luz tinha tudo para ser trêmula, incerta, imprecisa, mas era certeira. Chegava como holofote fazendo com que aquele mar bravio, salgado rio, se transformasse no palco do meu monólogo. Diferente das criaturas que morrem caladas, eu cantava o meu fim na esperança de uma reviravolta no rumo daquelas ondas sonoras de silêncio. E fechando os olhos eu ouvia o riso denso vindo daquela luz. Podia sentir seus seios, seus leites, seus deleites, seus anseios, seus enfeites... Nem a tempestade de sentimentos que volta e meia me colocava em naufrágio impedia de eu sentir cada fio de seu cabelo, cada arrepio de seus pelos, cada desvio de sua pulsação. E no mar-alto da minha solidão eu, nu de qualquer medo, confessava em segredo os meus pecados e amados àquela luz que me transformava num remo da cabeça aos pés. Um cego fazendo da luz a sua fé. ...
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01/01/2015 -
Fazendo do antigo o novo
Feliz ano, mês, semana, dia, hora, segundo novo para você. Que aquele desejo antigo (re)nasça novamente em você a partir de hoje. Que a virada tenha chacoalhado a ponto de despertar dentro de você paixões adormecidas. Um viva aos sonhos que explodem tal e qual fogos de artifício no céu da sua boca. Que seu mundo seja novo sob seus pés ou na sua cabeça. Que a força do “novo” tome de conta do seu ser. Que você ganhe ânimo, coragem, esperança, vontade de seguir em frente por velhos ou novos caminhos. Um viva aos sonhos que resistiram – de uma forma ou de outra, não cabendo explicação para o feito – à mudança do calendário. Um feliz tempo novo aos que se desdobram para manter viva a chama das estrelas. Embora sejam as mesmas do ano, do século, do milênio passado, as estrelas brilham com um quê diferente a cada novo dia. Um viva às estrelas de braços, pernas, olhos e coração. Feliz ano, mês, semana, dia, hora, segundo para você que acredita, vive e se entrega ao novo. ...
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27/12/2014 -
Num e noutro dia
Num dia ela chega e me chama de amor, noutro ela vai embora sem me deixar pedir por favor pra ela não ir. Num dia ela chega falando de tantos planos, noutro ela só vê em tudo enganos. Num dia ela chega ela me leva à loucura com tantas juras de amor eterno, noutro ela diz que eu não tenho cura e transforma o mundo num inferno. Num dia ela inventa de ser feliz, noutro ela não agüenta e só fala do mal que a fiz. Num dia ela chega com boas lembranças, noutro ela diz que nosso passado não passa de uma criança. Num dia ela leva tudo a sério, noutro ela enterra meus sonhos bem fundo no seu cemitério. Num dia ela vem elogiando minha roupa, noutro ela rasga tudo e se diz louca. Num dia ela me caça e me beija e me abraça, noutro ela simplesmente passa. Num dia ela quer viver como minha mulher amada, noutro ela não quer ser nada.
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