Daniel Campos

Prosas

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Encontrados 3193 textos. Exibindo página 26 de 320.

10/03/2016 - Miario

O gato miou na calha, na galha, na batalha onde fez cantador. Miou e arranhou o telhado para não cair no ladrilhado. Nem todo gato cai em pé. Muitos caem e morrem no colo de uma mulher. O gato miou e se assanhou quando a gataria o provocou. Miou gritado todo arrepiado. Miou chorado dando mostras de que ia se apaixonar. Miou pequeno fugindo do sereno, gato não gosta de se molhar, mas sabe como ninguém se lambuzar.


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09/03/2016 - Quando esse tempo chegar...

Quando tudo acontecer como dito não me venha dizer que foi obra do maldito. Quando tudo escorrer pelos dedos da sua mão não me grite querendo uma solução. Quando tudo desaparecer ao seu redor não se iluda dizendo que já foi pior, pois o melhor você jogou fora. Quando tudo o que você acredita cair não tente sumir. Quando tudo o que você postou for esquecido não adianta procurar nos achados e perdidos. Quando seu nome não for mais mencionado não adianta fazer pose e apontar para um culpado. Quando seu reino desmoronar de nada valerá espernear. Quando todas as cartas tiverem na mesa e a partida perdida creia que o caminho certamente não é a briga. Quando sua sombra for maior que o seu corpo tenha a certeza de que o sopro de deus não zomba. Quando a solidão se instalar definitivamente no seu eu será inútil clamar por perdão, será adeus.


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07/03/2016 - Mulher sem saída

Quando me deito no seu ventre e escuto o som que corre pelos labirintos íntimos de mulher sem saída vou ao deleito. A vida e a morte a açoitam e nossas esperanças se amoitam. Você geme de pesar e de prazer. Suas contrações indicam um absoluto querer, pulsante e indomável. Mulher sonhadora e palpável. Escandaliza os meus ouvidos. Passa ao meu coração os seus tremidos. É trem sem trilho, mãe sem filho, canção sem estribilho. Deito em ti como quem deita com as esquinas, com os encontros inesperados, com os poetas do passado. É dona de um romantismo perdido, inviolado, incorruptível. Casta do fantástico, o desejo como um elástico da alma é tensionado ao impossível. E eu ouço as batidas, a lida dos seus fantasmas, os seus cataclismos e empirismos, num um som abafado e angustiado como que peito com asma. Eu ouça as badaladas, suas jornadas pelas invernadas do tempo, escuto o vento nascente e de luto de colocando sobre a cama enquanto diz que me ama. E eu te devoro, infiltro-me em seus poros, misturo nossas raças e no acalanto você acha graça. Constante e esparsa, desespero que não passa. Mulher destemida, livre e sem saída temo te perder antes de entregar minha vida.


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07/03/2016 - O rio da sede

Vasculhei as gavetas. Abri os armários. Procurei sobre o roupeiro. Vi pelas pedras do aquário. Não achei letra alguma do seu paradeiro. Andei pelos canais da TV e nenhuma notícia de você. Bisbilhotei pela internet, encontrei a Beth, a Margareth, a Ivete, mas nada de você. Perguntei para o pivete do sinal vermelho, mas ele não me deu sinal do seu cabelo, do seu joelho. Questionei o espelho e ele ainda me mostrou você vivendo em mim. Seu cheiro ainda emana das flores do jardim. Sua voz ainda grita e geme debaixo dos lençóis. E eu amanheço, entardeço e anoiteço com esses tantos nós que não desatam e me desacatam numa falta, numa ausência, numa penitência que me mata. Risquei as cordas do violão, perguntei ao nosso cachorro da imaginação, cochichei com os porta-retratos e ninguém te viu por aí. Pedi para um bem-te-vi de te ver, mas ele sumiu daqui. Pedi para um pirilampo te assuntar, ele foi como um relâmpago para nunca mais voltar. Pedi para meu anjo da guarda te guardar e ele deu de me faltar. Tudo o que era meu foi com você, meu sentido, minha razão, meu porquê. Tudo seguiu seus passos, correu para seus braços, intuiu para seus laços. Tudo do meu futuro ao meu passado foi arrastado pelas águas da sua correnteza. Sua beleza me inundou, me aguou, me levou o que eu tinha e o que desejava ter. Um rio de tromba d’água, sem anágua, sem paga. Um rio perfumoso e malicioso, de curvas e curvedos, de tantos segredos. Um rio de riscos, coriscos, perigos que me deixou sem abrigo. Um rio devastador que dá de beber para depois minguar numa sede de amor. Um rio que enche o coração, preenche de ilusão e depois some, deixando para a gente apenas o nome e o vazio.


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06/03/2016 - Luz, luz

Luz, pássaros azuis iluminando as ruas. Luz, luz das luas. Luz, luz de todas as idades num brilho jovem e amadurecido, recém-nascido ou envelhecido. Luz, luz que cobre a cidade. Luz, cometas nus passando sobre os prédios. Luz, luz da cura, dos santos remédios. Luz, luz que vem do espaço. Luz, luz das estrelas de tantas pontas e pontes. Luz do amanhã, luz do ontem. Luz, luz das ondas de energia que vão alumiando o dia. Luz, luz para espantar as sombras. Luz, luz que se espalha pela ventania, pelas ramas. Luz, luz que arromba as trancas dos nossos porões. Luz, luz que entra nos grotões iluminando nossas tramas. Luz, luz que alivia. Luz, luz que bota para correr os pensamentos macabros. Luz, luz dos olhos de candelabros. Luz, luz que vem do alto. Luz, luz das matas, das cascatas, dos pirilampos que se atrevem pelo asfalto. Luz, luz das candeias. Luz, luz das horas cheias. Luz, luz da prece que acalma. Luz, luz, luz que aquece a alma.


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05/03/2016 - A mula que leva o tempo

A mula que leva o tempo em seus jacás nunca empaca. Ela vem com um passo firme e passa por onde nem imaginamos ser possível chegar. A mula ataca ribanceiras, ladeiras, precipícios, indícios de impossibilidade, de irredutibilidade e de irresponsabilidade. Atente ao que faz com o seu tempo. Tente viver entre o amanhã e a saudade de um jeito totalmente diferente. Avance e não canse com as pedras. A mula que leva o tempo em seus jacás há de seguir independentemente das tormentas, do que venta, cai e troveja. Veja que a direção aponta para frente. Toda semente jogada na terra um dia há de brotar. E quando esse dia raiar sementerá um novo velho sempre tempo. O tempo que está em todo lugar, no alto céu, no fundo mar, nos jacás da mula que o leva, no magnífico ventre da semente que rasga, parte, escapole da casca dura como uma dura certeza – de que o tempo virá em completa beleza e que ninguém o segura porque o tempo é correnteza que tudo carrega e ninguém sossega.


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04/03/2016 - Mulher de lótus

Mulher, o que esconde nessa boca de romã? Será o melhor de ontem ou o que guarda para o amanhã? Seja o que for, mulher, todo mundo quer provar o que leva em sua língua portuguesa. Quanto de realeza ainda existe no seu olhar triste, que vai derramando mares inteiros em seus lábios ora pálidos ora corados? E eu, cálido de desejos, e de outros beijos nunca dados, vou de boca em boca à procura da mulher que marca a alma de batom. Marcado, como que sangrando uma tatuagem feita a ferro e fogo, vou pelo lodo da existência procurando, clamando, esperando pela flor de lótus que se abre na boca de uma mulher que vive entre o pecado e a inocência.


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03/03/2016 - Des(embaraços)

Pendura a sua sanidade na minha loucura. Borda com ponto em cruz nas nossas linhas amarrando a saudade. Cura meus traumas e acalma as minhas paixões de rinha. Espora as minhas solidões e ora aos meus senões. Toca a minha intimidade, provoca o meu instinto. Fala ao que eu sinto. Migalhe pão pelo meu labirinto. Acredite no que eu minto. Grite de sentimento, colocando as palavras ao vento. Encontro de almas, de braços, de passos. Que venha o tempo e os seus (des)embaraços.


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02/03/2016 - Colares de um mesmo pescoço

Firma teus passos nos meus e vamos pela estrada alongada da imaginação não querendo mais nada a não ser você e eu. Vamos cavalgar no louva-deus, morar numa ostra, nos servir um ao outro na nossa melhor louça. Vamos juntos, em conjunto, num só assunto falando de amor. céu e condor, onda e concha, pinta e onça, veneno e cobra, fartura e sobra, assim somos nós complementares, elementares, colares de um mesmo pescoço. Carne e osso, pó e poeira, fogo e fogueira. Um unido ao outro num querer que não nos deixa solto.


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01/03/2016 - Tristes considerações

Aprendi a falar tailandês para te dizer adeus na língua em que sempre sonhei me casar com você. Desencomendei o cachorro que faria festa que cada vez que você chegasse. Cancelei o financiamento da casa da árvore onde moraríamos como duas crianças crescidas. Guardei os livros não terminados com as personagens principais tendo o seu nome nas minhas gavetas. Chorei de uma vez o que choraria nos aniversários da sua partida. Desafinei o violão propositalmente para não correr o risco de viver dia após dia compondo minha saudade. Entreguei nossas alianças ao tempo. Pedi para pararem de desenhar o solitário que te daria quando nosso primeiro beijo completasse dez anos. Doei as roupas da nossa filha que nunca saiu do reino dos sonhos. Descumpri a promessa que fiz a mim mesmo, de que jamais te perderia. Briguei tanto com o ponto final que ele virou uma vírgula e o que virá depois da pausa eu não sei porque eu deixei de sabê-la.


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