Daniel Campos

Texto do dia

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Encontrados 62 textos de março de 2016. Exibindo página 4 de 7.

16/03/2016 - Bailarina de olhar anil

A bailarina saiu da ponta, arrancou as sapatilhas e correu pela rua encharcada da chuva das seis. Não se ateve aos sinais, às faixas, às regras e nem aos casais namorando ignorando o tráfego. Dessa vez ela nem tirou a maquiagem do ensaio, colocou suas personagens num mesmo balaio, e correu hospicianamente pelo asfalto que sangrou seus pés tão finos como hinos nas bocas de fiéis. E na correria do fim do expediente o mundo não se tornou ciente do desespero da bailarina que cruzou a esquina como se descobrisse de um só impacto que deixou de ser menina para ser mulher nos braços de um qualquer. Ao contrário de rosas e tangerina, deixava pelo ar um cheiro de cangibrina e seus passos embriagados iam dois pro futuro, dois pro passado. E aquele restolho de chuva caiu tudo de uma vez de seu olho esquerdo num temporal que finda a chuva trazendo a aragem, a estiagem, a viúva que só tira o preto para levar o desejo a eito. A bailarina como colombina recém-acordada na quarta-feira de cinzas avançou doida pela cidade em busca de uma saudade, de um salvamento, de um tempo que já não havia. E ela nada dizia, só chorava e resmungava do coração uma velha e rasgada homilia. Coitada da bailarina que no seu íntimo atravessou o ritmo e desafinou passos, desfigurou traços, desatou laços sem se importar se perderia ou não o compasso. Foi deixando meias-calças, meias verdades, meios amores para se entregar plena ao espetáculo dos tentáculos da noite que engoliu seu par de olhos anil.


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16/03/2016 - Sem freio

Querendo ou não eu vou com tudo
Sem freio, surdo aos seus apelos,
Adentrando pelo seu mundo de pelos
Curvas, relevos, agravos, perfumes,
Avançando pelas suas depressões,
Pelos seus cumes, e descobrindo,
Indo e vindo, seus muitos corações,
Vou pelas suas brechas, deixas,
Queixas e comemorações de sim
E de não, pois o talvez não existe
É ou não é, é assim que se faz
Mulher, entre a guerra e a paz
De um ser intrínseco, belo e fatal...
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15/03/2016 - Foram me chamar

Foram me chamar pra roda de samba, mas o couro do meu tamborim rasgou. Foram me chamar pra seresta, mas das sete cordas do meu violão uma arrebentou. Foram me chamar pra lavagem da escadaria da Senhora das Guias, mas, fia, com todo respeito, não estou num bom dia. Foram me chamar para pescar, mas meu coração já estava fisgado num anzol bem amarrado. Foram me chamar para o festejo, mas cadê meu realejo? Foram me chamar para assistir os fogos de artifício, mas prefiro as luzes que vejo explodindo no fundo dos meus olhos de hospício. Foram me chamar para raspar o tacho, mas minha colher a correnteza levou rio abaixo. Foram me chamar para dar colo e daí santo nenhum me segura, rezo à loucura e logo me embolo.


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15/03/2016 - Atravessando sinais

Você atravessa meus sinais
Como se eu só fosse verde
Para os seus descaminhos
Sempre vindo na correria
E indo com toda a sede
Carregando a minha paz
Tanto tempo faz dos linhos
Ainda nos campos em flor
E eu já te dizendo fica
Em meu ninho por favor
Mas o tempo a pinica
E a faz trilhar novos trilhos
Mas saiba que meus sinais
Um dia estarão vermelhos
E não adiantarão seus ais
Nem implorar de joelhos ...
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14/03/2016 - Acendendo as velas

Acenda as velas. Bota os veleiros no mar. O vento bate a cortina das janelas. Os olhos da moça pelos confins estão a velejar. Reza pros seus que eles hão de te ajudar. Nada de já acordar com três pedras de sal em cada olhar. O choro não te deixa enxergar o que te espera. Se tudo está seco, sem flor, sem vida, sem amor, não se desespere, já vem a primavera. Acendas as velas.


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14/03/2016 - Vai cansar e fim

Estando bem meu bem
Nada me derruba
A inveja vem e aduba
A minha luta. Vou além
Graças aos que desejam
O meu mal, o meu pior
Olhos gordos me beijam
E as falsidades sei de cor
Não me desanimo, limo
Essas negatividades
Toco mais uma de amor
E sem pedir por favor
Tomo a felicidade
Que é minha por direito
E os que querem a queda
Atestam que não tem jeito
Não que eu seja perfeito
Mas quem não medra ...
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13/03/2016 - Coração gritado

Silêncio, o mundo enfim dorme
Nada parece se movimentar
Pássaros recolhem suas asas
Até as mariposas se aquietam
As mulheres, nuas e imóveis,
Como obras de Michelangelo
Os anjos não fazem barulho
E a lua roda e baila sem música
Solitária num oceano quieto
Cujas ondas estão todas
Absolutamente todas elas
Cá dentro de mim num reboliço
Sem fim que grita e esperneia
O já ensurdecido coração


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13/03/2016 - Hoje é dia de domingo

Hoje é dia de pão fresco com manteiga de leite, daquelas bem amarelinhas e cremosas. Hoje é dia de galo cantar acompanhado do sino da igrejinha. Hoje é dia de gordura pingando na brasa. Hoje é dia de moda de viola, de bossa nova, de tamborim e pandeiro. Hoje é dia de comer pipoca no escurinho do cinema. Hoje é dia de jogar bola e de dar bola a alguém. Hoje é dia de praia, piscina, cachoeira, enfim, de se dar com a água. Hoje é dia de ir além do aquém. Hoje é dia de pedalar a bicicleta ou as pernas do seu amor. Hoje é dia daquela comidinha especial, com cheiro e tempero de fazer inveja a qualquer outro dia da semana. Hoje é dia de colo, de abraço, de corpo junto e misturado. Hoje é dia de deixar o relógio de lado e caminhar por um outro lado. Hoje é dia de se encontrar com árvores, com trilhas, com lagos, com feiras, com sabores, com perfumes, com crenças e outras bênçãos. Hoje é dia de vestir a roupa de domingo e sair por aí como que não querendo nada, mas sonhando com tudo, sem espada, nem escudo.


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12/03/2016 - Na biblioteca

Interior de biblioteca. Pessoas leem em mesas apilhadas de livros e outras caminham com exemplares nas mãos. Uns vasculham estantes e outros, páginas. A bibliotecária traz olhares de um final nada feliz. Em uma das mesas, Lia está lendo ao lado de Luiz, que por sua vez tem a sua frente vários livros abertos. Ele rabisca em um bloco olhando para ela com olhos intensos, tão intensos que a incomodam. Lia muda de mesa. Luiz, sem qualquer cerimônia, segue a moça ficando ao lado dela. E, no novo posto, continua lançando olhares indiscretos para o rosto e para a parte do corpo da moça que escapa aos seus olhos. Lia murmura pedindo para ele parar. Luiz sussurra que é impossível, pois ela não o deixa parar. ...
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12/03/2016 - A lenda da cobra alada

Com asas e presas
Voava e serpenteava
Espantando, cobiçando
E levando à loucura
A hipócrita realeza.

A estranha criatura
Mulher, ave e cobra
Num esqueleto só
Tinha veneno de sobra
E uma vida de dar dó.

Se picava, se furava,
E se auto-flagelava,
Por prazer e deleite
E amava e desejava
Um corpo esgotado
De tanto querer.

E ela abusou
E se entregou
À própria sorte...
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