Daniel Campos

Texto do dia

Se você gosta de textos inéditos, veio ao lugar certo.

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Encontrados 62 textos de março de 2016. Exibindo página 3 de 7.

21/03/2016 - Pela não omissão

Por mais que não acredite, o meu caminho é mais do que um convite. É missão. É sina. É sacerdócio. É um reencontro com minha casa, comigo mesmo, com o que eu pedi para mim. Não espero que aceite, mas que respeite a minha escolha de ser. Sou do outro, para o outro, pelo outro. O outro é o meu sentido. Por isso, a minha doação, a minha entrega, a minha divisão entre o céu e a terra. Eu não sofro, não sinto dores, não tenho sofrimento algum no que faço. O meu passo é para frente buscando o que eu um dia pelas mais diferentes razões, deixei incompleto. O meu trabalho é o que me leva adiante, o que me dá sentido, o que me renova, fortalece, redime. Nada me oprime senão a falta de poder fazer algo por quem tem dores, horrores, pavores maiores do que os meus. Trabalho, trabalho, trabalho para que não volte a chorar pelas oportunidades perdidas. Pior, muito pior, do que chorar por uma despedida, pela perda de uma vida, por uma esperança partida, é chorar pelo que teve condições de realizar e não realizou. Pior, muito pior, do que errar por agir é errar por omissão.


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21/03/2016 - Belazul

Minha menina azul
Blue como o blues
Intensa, pequena
E imensa em mim
Linda, bela, belazul
Beautiful do início
Ao fim do fim do fim
Eu conheço tua alma
Como a palma
Da minha mão cigana
Eu conheço teu cume
Tua maior depressão
O que ama e chama
E do que tem ciúme
Eu sei do azul que há
Em tudo isso que é ocê
Mulher azulada, azulinda,
Azuleia, azulante, azulá,
Flor de azulê que me azula ...
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20/03/2016 - Eu voei

Arrumei a cama com uma colcha de retalhos dos sonhos que já tive e que hoje me esquentam nas noites mais frias. Enchi o bule de café para engolir as palavras que descem a seco pela minha garganta. Palavras que não quero engolir. Palavras que se remoem pela minha boca querendo fugir. Palavras que perderam a hora de serem ditas. Palavras benditas que se tornaram malditas, e que, mesmo bonitas, ninguém as repita. Coloquei o gosto da vida que ainda me resta no meio de um pão. E mastiguei o que ainda me sobra como um cantor mastiga a sua canção. A mesma canção que ele canta toda vez que sobe no palco como se fosse a sua oração. Abri minha janela, dei bom dia ao infinito do sol reluzindo pelas telhas de zinco, tendo a certeza que dois mais dois são cinco. Olhei as horas e mais uma vez veio a tristeza de ainda, de ainda não ser a minha hora. Liguei a TV, abri um livro, pensei em mim, em você, em nós, o que eu ainda vivo. Fui para frente do espelho e vi meu sorriso vermelho, em carne viva, numa sina de ser imenso sendo pequeno, de se ouvir de dentro para fora, de vir mesmo tendo de ir embora, de ser tantas vidas num só. Tirei o pó da estante, coloquei um disco para rodar, fechei os olhos e dancei com elefantes, como se eu fosse um menino gigante. Depois da dança, senti como se tivesse estrelas na língua, o sabor da esperança, peguei a colcha de retalhos dos sonhos que já tive e coloquei em minhas costas como se fosse asas, e pulei na imensidão desse oceano que veio quebrar suas ondas na minha janela. E eu juntei meus sonhos, amei-os como nunca, colei-os numa junta, e, por mais incrível que seja, veja, eu voei.


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20/03/2016 - Entra no trem

Vem, entra no trem
Que vai dar no mar
Num tanto de lugar
Nos montes laranjas
Nas curvas e esquinas
No colo das meninas
De mistérios e franjas

Vem, entra no trem
Que vai subindo alto
Como se fosse pássaro
De lata, coração de aço,
Por entre nuvem e mato
Destino sobre a mesa
Frigi a fornalha acesa

Vem, entra no trem
Que vai apitando azul
Cortando norte e sul
Faiscando os trilhos ...
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19/03/2016 - Cê tem sua hora

Você tem a sua hora
E todas as minhas
Horas
Sozinhas ou não...
Ora,
Cê está dentro
E fora
Da imaginação...
Cê, sentimento
Que não se ignora,
Zóio que chora
A tristeza da beleza
De se fazer mulher...
Cê que chega
Se aprochega
Se aconchega
Como bem quer
E nunca que sai
Que vai embora
Porque não quero
Que cê vá,
E te espero
Como ninho vazio...
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19/03/2016 - Nosso castelo

É como se o nosso castelo, tão, mas tão belo, fosse de areia e o vento da separação insistisse em nos desabrigar de grão em grão, como galinha que nunca enche o papo, como ratoeira sempre à espreita da fraqueza do rato, como beleza do mato que dá de morrer no asfalto.

É como se o nosso castelo fosse de gelo e os raios de sol quisessem de propósito, pra mor do óbito do nosso amor, derreter o nosso mundo, colocar a perder nosso enlace vagabundo que vive um pro outro, apertado e solto, espalhado em ramas, colado num coito de almas e dramas. ...
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18/03/2016 - Violão arredio

O violão está num canto esquecido, perdido em canções silenciosas. Só escapa uma ou outra nota quando o vento vibra as cordas que mais parecem cobras espichadas ao sol, sem intenção de bote. Inofensiva e decorativa, assim vai aquela peça de madeira entalhada para cantar. O meu violão caipira, do interior do interior, se avexa com a cidade grande e tem saudade do mato. Queria ter sido violão pantaneiro, mas acabou num canto do quarto de um desafinado. Pobre violão que não é tocado, que não é abraçado, que não é incorporado ao corpo do seu mestre. Talvez fosse melhor entregá-lo à correnteza para ele escolher o seu dono rio abaixo. Suas seis cordas não conversam entre si. Suas casas vão ficando cada vez mais longe uma das outras. Suas curvas vão pegando poeira e o silêncio lhe dá uma canseira. Parece que chora um choro quieto, de inutilidade, de frustração, de descriação. Por essas e outras, maltratado naquilo que nasceu para ser, mais dia menos dia ele irá num pé de vento ou nas mãos de uma mulher que ao contrário do meu coração prefira fugir com meu violão.


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18/03/2016 - Clareia, meu pai

Clareia, meu pai, clareia minha estrada
Afasta as sombras e aquele que zomba
Da minha escolha, que tomba pedras
Só para atrapalhar a minha caminhada
Meu pai, clareia como noite enluarada
A passada deste que contigo não medra
Louva-a-deus, estrelas e pirilampos
Coloca a luz no meu carreiro de dentro
Cortas as sombras com seus relâmpagos
E me leva cada vez mais mata adentro
À mata-virgem, meu pai, da sua morada
Onde as árvores alumiam que cintilam. ...
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17/03/2016 - Obelix, Charlie Brown, Pato Donald, pai

Meu pai me ensinou soltar a agulha da vitrola sem arranhar as vozes de Caetano, Bethânia e Chico Buarque. Trouxe-me lágrimas verdadeiras, num choro sentido, quando anunciou a morte de Tom Jobim. E pelas páginas de livros e jornais, trouxe-me a poesia de Vinícius de Moraes, a baleia de Graciliano Ramos, as lutas de Garcia Marques, os meandros de Saramago, o humor de José Simão, as viagens de Arnaldo Jabor, os passados de Carlos Heitor Cony. Meu pai de tantos jornais debaixo do braço, das bancas de revista, dos livros enfileirados, sem ordem alguma, em suas tantas estantes. Se eu pudesse dar um presente ao meu pai, dar-lhe-ia tempo e paz para ler todos os livros que ele comprou um dia. Muitos pais ensinam os filhos a nadar, mas o mais próximo de água que meu pai chegava comigo era da bica de água da Rainha, onde ele levava sempre dois galões grandes, um azul comprido e um branco mais arredondado, para buscar a água que bebíamos durante a semana. Ainda me lembro do gosto daquela água que escorria das torneiras farta, como se todos os rios do mundo desaguassem ali. E por falar em desaguar, o que dizer dos olhos de meu pai depois de perder Bizuco e Kika. Ele foi o último a se despedir dos dois cachorros que mais marcaram nossas vidas. Além de jornais, meu pai sempre chegava em casa com compras, petiscos, filmes, discos, notícias, preocupações, medos e uma forma calada de demonstrar seu amor pelos que habitavam a casa que ele construiu pedaço por pedaço. E a cara fechada, que chegava a franzir a testa, escondia um coração menino, afoito, esbaforido que por muitas vezes embaçava seus óculos esverdeados. Meu pai me apresentou à Mangueira de Cartola, o tempo de Paulinho da Viola, a força de Clara Nunes, Elis Regina, Dolores Duran. Meu pai ainda me emprestou seus pais, um avô de tantos causos e uma avó de inúmeras receitas. Sonhou um país melhor para mim e meu irmão. Guardou as notas de real com a esperança de que nós vivêssemos enfim em um mundo sem inflação. Meu pai foi muitas vezes além dos seus limites, lutando contra si mesmo, para tentar agradar. Com o passar das forças perdeu boa parte de suas forças, perdeu muitas lutas para si mesmo, mas continua tentando agradar. Meu pai com o tamanho de Obelix, com a alma de Charlie Brown e com o nervosismo do Pato Donald foi, do seu jeito, se construindo, descontruindo e reconstruindo pai. Por essas e outras, minha mãe me deu ao mundo e meu pai me deu o melhor do seu mundo.


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17/03/2016 - Dois sanhaços

E então
Num fim de tarde
No chão
Que o céu invade
Nasci
Com corpo de homem
E alma de pássaro
Vivi
Como fome de voar
E braços de aço
Tão incríveis
E impossíveis
De me levantar

E então
Você chegou
Arrebatadora
E me amou
Avassaladora
Erguendo casas
Dos meus escombros
Tirando asas
Dos meus ombros
Você se aninhou
Nos meus braços ...
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