Daniel Campos

Texto do dia

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Encontrados 31 textos de março de 2010. Exibindo página 2 de 4.

21/03/2010 - Domingo, por Liberato Barbosa

Em algum lugar deste domingo, seu Líbio deve se levantar um pouco mais tarde. Depois da semana toda madrugando para tirar leite, hoje aproveitou um pouco mais a cama. Bom para o corpo exausto da lida. Dos seus 77 anos de vida, setenta deles passou trabalhando na roça. Como é bom poder ficar na cama sem o risco de seu pai lhe jogar uma balde de leite no rosto como punição para seu atraso. Perdia hora por culpa dos bailes movidos a sanfonas e lampiões e das inúmeras voltas na Praça da Matriz flertando com as moças que, aquela época, giravam no sentido contrário aos moços. ...
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20/03/2010 - Imperador Liberato, o revoltoso

Meu avô morreu no mesmo dia em que há mais de dois mil anos morria o imperador romano Júlio Cesar – 15 de março. Coincidência ou não, Líbio, como era chamado pelos amigos, foi o nome de outro imperador romano (Líbio Severo). Mesmo não tendo acumulado a fortuna dos imperadores e nascido bem distante das terras do império romano, meu avô sempre foi tratado como uma espécie de imperador. Sua coroa era um chapéu de palha. Sua espada, uma enxada de duas libras.

Sentava na cabeceira de qualquer mesa. Na sala, tinha lugar cativo para assistir televisão. Tinha direito a duas poltronas, uma com direito a almofadas macias para acomodar suas costas e outra para ele esticar os pés. Seu trator era um Ford Major importado da Inglaterra. Não conheci ninguém que o tivesse vencido em uma disputa de braço de ferro. De uma forma ou de outra, ele sempre pôs medo em quem cruzasse seu caminho. Como nasceu no ano da Revolução (1932), ganhou o apelido de revoltoso. E fez valer esse apelido aterrorizando, no bom sentido, o mundo ao seu redor. ...
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19/03/2010 - “Olha pra frente que de trás cuido eu”

Era noite alta e grande. Perto da meia-noite, a lua de tanto minguar se apagou. Tudo ficou negro. Tudo ficou escuro. Pelos rumos da linha do trem, um homem andava farto de medo. O vento soprava fazendo com que os galhos das árvores gemessem. Um vento frio em pleno verão. As moitas de capim sacudiam diante daqueles sopros de ar. O mato parecia ganhar vida. Era uma sensação horrível ver tudo se mexendo ao seu redor. E naquela noite ele não havia tomado um gole sequer de cachaça. Estava tão sóbrio quão sua finada mãe (que Deus a tenha). ...
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18/03/2010 - Sem maestro, a orquestra se cala

Hoje o galo de peito vermelho não encontrou motivo algum para cantar. Ao contrário de subir na cerca e cocoricar forte sua melodia caipira, abaixou a cabeça e silenciou. Seguindo seu exemplo, as galinhas carijós não vão botar ovo algum ao longo do dia. Brenda, aquela cachorra preta que o seguia pelo sítio afora, sequer se levantou. Os canários da terra e do reino, descendentes daqueles que ele capturava em arapucas de menino, não estralaram ao amanhecer do dia.

A barulhenta máquina de fazer fubá também ficou quieta em seu canto. Nem mesmo os tratores quiseram papo, ficaram mudos e com faróis baixos. Ao contrário de apitar, o trem que corta o sítio ao meio há mais de quarenta anos, soluçou. Os mais de mil pés de abacate se curvaram em sinal de reverência. A terra sangrou de dor ficando ainda mais vermelha. As águas correntes que alimentam o lago pararam de correr. As tilápias, tão cobiçadas por ele, não saíram de suas tocas....
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17/03/2010 - O último capítulo

Dia 9 de fevereiro de 2010. Depois de seis meses, meus pés tocam novamente aquela terra vermelha. Dava para sentir boa parte de minha infância e juventude misturada aquele chão. Quase trinta anos de uma forte convivência com aquele lugar que acostumei a chamar de sítio do vô Libio. Quantas histórias vividas ali? Impossível calcular. Mas todo livro precisa ter um último capítulo. E o meu foi escrito naquela terça-feira gorda.

Liberato de Lima Barbosa, ou vô Líbio como sempre o chamei, estava com um câncer bastante agressivo na cabeça. Difícil reencontrar um homem sempre tão ativo e vistoso naquelas condições. O tumor malignamente já havia comprometido sua coordenação motora. O homem que percorria aqueles dez alqueires desde criança com passadas rápidas e largas caminhava com extrema dificuldade. Mas fizera questão de ir comigo ao sítio Boa Vista por mais uma ou pela última vez. ...
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16/03/2010 - Morreu o professor

Morreu quem me ensinou a viver intensamente o amor pelas coisas da vida. Morreu quem me ensinou que tudo é feito de terra. Morreu quem me ensinou a honrar a palavra dada acima de qualquer coisa. Morreu quem me ensinou o sentido de infinito. Morreu quem me ensinou a lutar e lutar muito. Morreu quem me ensinou a lidar com enxadas, serrotes, cavadeiras, foices, pulverizadores, debulhadores, plantadeiras... Morreu quem me ensinou que o melhor não é ver a obra finalizada, mas aproveitar cada momento do processo de construção. Morreu quem me ensinou a sonhar de olhos abertos. ...
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15/03/2010 - Hoje é dia de Jobim

Hoje o dia amanheceu predestinado a dar errado, mas aí o rádio tocou Jobim e o enredo do cotidiano se transformou. Então, de repente, da boca fechada em copas nasceu um sorriso longínquo como a linha tridimensional do horizonte. Era como se as notas daquele piano tivessem o poder da criação. Será, perguntam os profetas do deserto, que os anos dourados de Deus residem debaixo do tampo daquele piano de cauda? Será ali a morada do criador, do salvador, do redentor???

Felizes os convidados a ouvir Tom Jobim. Por meio dos tons de seu piano o moço que andava cabisbaixo pela calçada ganhou ânimo para dançar com os postes; a senhora que passava de sombrinha, rodou, rodou, rodou até cair de contentamento; o velho fraco pensou que tinha ganhado asas e correu de braços abertos por entre o jardim de petúnias tentando voar; o menino se encheu de coragem e roubou da menina seu primeiro beijo; e o poeta colocou pau, pedra e o fim do caminho na poesia do dia......
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14/03/2010 - “Não manche meu nome”

Hoje, quase 16 anos de ausência depois, o sobrenome Senna volta a uma pista de Fórmula-1 para disputar um Grande Prêmio Oficial. O capacete amarelo, com faixas verde e azul, também é cópia daquele que deixou o mundo boquiaberto. O locutor esportivo responsável por narrar os feitos do nome Senna também é um velho conhecido. No entanto, nada é igual. E não é preciso sequer assistir a corrida para saber disso.

O menino que hoje tenta trilhar os caminhos do tio dificilmente vai honrar o sobrenome e o capacete. E isso não é culpa de Bruno. A culpa é que um novo Senna não nasce assim. Ayrton chegou à F-1 consagrado nas categorias de base. Em sua bagagem, além da experiência, levou uma série de títulos e elogios. Bruno traz com ele um sobrenome de peso, que pode pesar demais sobre seus ombros, um capacete que ainda vive no subconsciente de muita gente e o dinheiro de uma empresa brasileira. ...
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13/03/2010 - Misericórdia divina

Que Deus tenha misericórdia. Que Deus não lhe deixe sofrer mais. Que Deus coloque tua mão. Que Deus intervenha. Que Deus faça o que tem de fazer sem se preocupar com preces egoístas. Que Deus faça o melhor sem se importar com a dor que isso irá causar. Que Deus abençoe. Que Deus não falte. Que Deus coloque um ponto final nessa angústia. Que Deus lhe dê vida nova.

Que Deus prove o teu amor. Que Deus nos leve a acreditar que a morte não é o fim. Que Deus conforte os corações que ficam. Que Deus lhe livre e guarde. Que Deus não permita o prolongamento de sua agonia. Que Deus aja por interseção dos santos, dos anjos, da Virgem Maria. Que Deus conserve os momentos bons em nossa memória. Que Deus segure em sua e em nossa mão....
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12/03/2010 - Charada

A mulher amada tem sempre uma charada a ser decifrada à flor de seus lábios. Entre o querer e o poder, ela quer e pode. É ela quem decide se quer ou não que você a decifre. É ela quem pode ou não lhe ajudar a descobrir o que esconde em seu corpo, em sua alma. Não há nada mais misterioso do que o enredo que compõe a mulher amada. Nem cineastas como Alfred Hitchcock conseguiram criar atmosfera semelhante ao suspense que cerca a mulher amada.

Diante dela, não se sabe se algo bom ou ruim está para acontecer. Sabe-se apenas que o quê de mistério da mulher amada lhe devora aos poucos numa sucessão de angústias e aflições e desesperos. Expectativa e medo dão as mãos e esperam aflitos o desenrolar de um dos dramas que povoam a mulher amada. E o pior sentimento é a perspectiva de que não se pode interferir em absolutamente nada no tocante aos rumos de seu mundo. ...
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