Daniel Campos

Ou exibir apenas títulos iniciados por:

A  B  C  D  E  F  G  H  I  J  K  L  M  N  O  P  Q  R  S  T  U  V  W  X  Y  Z  todos

Ordernar por: mais novos  

Encontrados 278 textos. Exibindo página 21 de 28.

05/04/2013 - O violeiro leva

O violeiro leva pelo menos uma dúzia de romances na ponta dos dedos. O violeiro leva a estrada no solado da sua botina. O violeiro leva o que viu do tempo no fundo dos olhos. O violeiro leva o som dos bichos muito bem guardado. O violeiro afina cada corda de sua viola de acordo com o som de um “eu te amo” dito por uma mulher. O violeiro leva uma penca de saudades na aba de seu chapéu. O violeiro leva pontas de estrela para presentear suas amadas.

O violeiro leva ponteios em seu coração de ponto. O violeiro leva pássaros em suas toadas. O violeiro leva trens em seus destinos. O violeiro leva chuva para bocas desertas. O violeiro leva uma cantiga para a roda. O violeiro leva o adeus no corte do canivete. O violeiro leva causos para o redor de uma fogueira. O violeiro leva luas como quem leva uma garrafa de cachaça. O violeiro leva fagulhas de desejo no aço das cordas. O violeiro leva o silêncio como deus leva o diabo.


Comentar Seja o primeiro a comentar

19/03/2015 - O zóio da menina

O zóio da menina encheu, o zóio da menina vazou e o cabelo da menina cresceu, cresceu que ventou pras bandas de onde coração não anda. O zóio colorido da menina entornou e saiu bêbado pelas pedrinhas da calçada tropeçando em rainhas descoroadas e luas descoradas, todas espreguiçadas, cansadas de reinar. O zóio da menina formou onda, deu peixe, sereia e pescador, e agora por ele ronda marisco em feixe, vapor de cachoeira e farol que clareia. O zóio da menina de cinturinha de pilão balançou, chamou pelo vento de lá pelo vento de cá, e orvalhou ao tempo que dançou de uma só vez com o tempo que passou e com aquele que ainda não chegou. O zóio da menina esverdeou, azulou, avermelhou e até enviuvou em vida como se não escutasse nada do que o timoneiro do amor lhe falou por meio das mensagens engolidas por garrafas que um dia lançou a esse par de zóio tão, mas tão marinheiro que se aninha entre o amanhã e o anteontem na linha do horizonte dando conta de chorar o mar inteiro.


Comentar Seja o primeiro a comentar

17/10/2012 - Ó, Obatalá! Ó, Obatalá!

Sob os olhos atentos de um índio sentado em um trono com uma lança deitada nas mãos e dos altos e crescentes estalos dos dedos dos médiuns, no meio dos tronos vermelhos, um doutrinador abre seu plexo e estende os braços para o alto buscando o céu. Suas mãos rompem as fronteiras de sua aura e sua voz escapa firme e intensa como um rugido de leão: “Ó, Obatalá! Ó, Obatalá! Entrego, neste instante, mais esta ovelha para o teu redil!”.

A força dessa expressão arrepia. De alguma forma, mexe com quem a escuta no interior do Vale do Amanhecer. A chave abre um canal para onde é projetada aquela vítima do passado. Espíritos que após serem doutrinados, devidamente harmonizados com o choque magnético da doutrina, são elevados. Dependendo da força do doutrinador, o espírito é lançado ao segundo, ao quarto, ao sexto ou para além do sétimo plano. ...
continuar a ler


Comentários (6)

30/05/2012 - Obá Xirê

Viva Joana D’Arc. Viva Obá. Obá Xirê. Obá é guerreira. Obá Xirê. Obá é solitária. Obá Xirê. Obá é feiticeira. Obá Xirê. Obá é vingativa. Obá Xirê. Obá fala pouco. Obá Xirê. Obá é atrevida. Obá Xirê. Quem nunca sofreu por amor? Obá sofreu, sofreu demais. Obá Xirê. Obá veste marron raiado, vermelho e amarelo. Obá Xirê. Obá pertence ao fogo e as águas revoltas. Obá Xirê. Obá é o rio que vai se lançar numa cachoeira. Obá Xirê. Obá é filha do incesto entre Iemanjá e Orugan, seu próprio filho. Obá Xirê. Obá transborda quando raivosa. Obá Xirê. Obá só ajuda os injustiçados. Obá Xirê. Obá não aceita pedidos de perdão. Obá Xirê....
continuar a ler


Comentários (5)

02/03/2013 - Obatalá vem

Lá vem todo de branco, Obatalá. Vem montado em seu cavalo branco. Vem de túnica branca, vem Obatalá. Vem com sua lança branca. Vem com seu escudo branco. Vem negro e santo, guerreiro e altaneiro, Obatalá, todo de branco. Vem como o raiar do dia, sol de Obatalá, com as graças de Oxalá. Oba, Oba, Obatalá.

Quando Obatalá passa tudo fica branco. Tudo o que Obatalá toca fica puro. Obatalá é nuvem branca que passa no céu. Obatalá é sorriso de criança. Obatalá é véu de noiva. Obatalá é o raio branco que põe medo em qualquer um. Obatalá é a lua branca no meio da noite escura. Obatalá é brancura da alma....
continuar a ler


Comentar Seja o primeiro a comentar

17/03/2016 - Obelix, Charlie Brown, Pato Donald, pai

Meu pai me ensinou soltar a agulha da vitrola sem arranhar as vozes de Caetano, Bethânia e Chico Buarque. Trouxe-me lágrimas verdadeiras, num choro sentido, quando anunciou a morte de Tom Jobim. E pelas páginas de livros e jornais, trouxe-me a poesia de Vinícius de Moraes, a baleia de Graciliano Ramos, as lutas de Garcia Marques, os meandros de Saramago, o humor de José Simão, as viagens de Arnaldo Jabor, os passados de Carlos Heitor Cony. Meu pai de tantos jornais debaixo do braço, das bancas de revista, dos livros enfileirados, sem ordem alguma, em suas tantas estantes. Se eu pudesse dar um presente ao meu pai, dar-lhe-ia tempo e paz para ler todos os livros que ele comprou um dia. Muitos pais ensinam os filhos a nadar, mas o mais próximo de água que meu pai chegava comigo era da bica de água da Rainha, onde ele levava sempre dois galões grandes, um azul comprido e um branco mais arredondado, para buscar a água que bebíamos durante a semana. Ainda me lembro do gosto daquela água que escorria das torneiras farta, como se todos os rios do mundo desaguassem ali. E por falar em desaguar, o que dizer dos olhos de meu pai depois de perder Bizuco e Kika. Ele foi o último a se despedir dos dois cachorros que mais marcaram nossas vidas. Além de jornais, meu pai sempre chegava em casa com compras, petiscos, filmes, discos, notícias, preocupações, medos e uma forma calada de demonstrar seu amor pelos que habitavam a casa que ele construiu pedaço por pedaço. E a cara fechada, que chegava a franzir a testa, escondia um coração menino, afoito, esbaforido que por muitas vezes embaçava seus óculos esverdeados. Meu pai me apresentou à Mangueira de Cartola, o tempo de Paulinho da Viola, a força de Clara Nunes, Elis Regina, Dolores Duran. Meu pai ainda me emprestou seus pais, um avô de tantos causos e uma avó de inúmeras receitas. Sonhou um país melhor para mim e meu irmão. Guardou as notas de real com a esperança de que nós vivêssemos enfim em um mundo sem inflação. Meu pai foi muitas vezes além dos seus limites, lutando contra si mesmo, para tentar agradar. Com o passar das forças perdeu boa parte de suas forças, perdeu muitas lutas para si mesmo, mas continua tentando agradar. Meu pai com o tamanho de Obelix, com a alma de Charlie Brown e com o nervosismo do Pato Donald foi, do seu jeito, se construindo, descontruindo e reconstruindo pai. Por essas e outras, minha mãe me deu ao mundo e meu pai me deu o melhor do seu mundo.


Comentários (1)

24/12/2011 - Obrigado senhora nossa

Obrigado pela maternidade contínua. Pelo colo em todas as horas. Por guiar cada passo meu, acalentar toda e qualquer aflição, cuidar dos meus sonhos. Obrigado por me deixar entrar em sua casa. Pelas broncas, pelos conselhos, pelos cuidados comigo. Obrigado por tudo o que me oferece - pelo o que eu sei e pelo o que ainda não sei compreender.

Obrigado pelos encontros diários, por ouvir os meus chamados, por nunca ter me dado as costas. Pelas estrelas que iluminam minhas noites mais escuras, pelas pétalas que faz nascer ao meio das minhas ervas dadinhas, pelas suas canções que não me deixam sozinho. Obrigado pelo novo e também pelo antigo que me possibilita viver....
continuar a ler


Comentar Seja o primeiro a comentar

05/04/2012 - Observações sobre a mulher amada

A mulher amada some mesmo continuando viva. Seus pulsos podem ser sentidos mesmo depois de dias e dias de ausência. A mulher amada quer ser salva, mas nem sempre está ameaçada. Querer ser salva é apenas uma tática para continuar viva na memória. As mocinhas sempre habitam a cabeça dos heróis e dos vilões.

Agora, uma coisa é certa: se não for amada, a mulher não existe. Ao menos não a mulher amada. O que não amamos desaparece do nosso dia a dia. É bom repetir um beijo ou uma palavra para continuar pulsando. Há sempre um prazer oculto na ausência da mulher amada, que sai de cena para nos trazer sua saudade. ...
continuar a ler


Comentar Seja o primeiro a comentar

16/03/2013 - Observador

Longe, ele observa a vida que passa. Mantém os olhos abertos e os sentidos acesos, atento a todos os detalhes. Porém, não se aproxima muito. Gosta de ter os olhos pertos, mas distantes ao mesmo tempo. Diz ele que é para não influenciar no desenrolar das coisas. Acontecimento algum passa despercebido por ele, que é uma espécie de espectador de tudo e de todos. Em pé, sentado ou deitado, dá seu jeito de tomar conhecimento dos fluxos e refluxos da cidade.

Conhece o horário do vento. Sabe com que roupa a mulher da casa amarela vai sair para um determinado compromisso. Sente a léguas de distância o cheiro da chuva. Advinha facilmente os pensamentos da menina que caminha na outra calçada. Tem familiaridade com os perfumes que flutuam pelas redondezas. Enxerga, com nitidez, o que se passa por detrás de muros e paredes. Não dá palpite, não conversa, não provoca, apenas fica em seu canto como parte da paisagem....
continuar a ler


Comentar Seja o primeiro a comentar

11/10/2011 - Oceânica

Suas lágrimas dão sabor a minha pele, a minha alma, a minha jornada terrena. Sua salga ora suaviza ora ressalta o gosto de um sentimento, dependendo da intensidade de seu choro. Também altera a minha cor e a textura dos meus pensamentos. O pranto é simples, intuitivo, receptivo.

Uma desilusão, uma decepção ou uma traição força a saída do sentimento salobro, desidratando sua alma de sereia. Quanto mais dor, mais sal e mais intensa a desidratação. O cenário influencia a salga. E o tipo de choro também faz diferença ao temperar corações alheios....
continuar a ler


Comentar Seja o primeiro a comentar

Primeira   Anterior   19  20  21  22  23   Seguinte   Ultima