Daniel Campos

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Encontrados 261 textos. Exibindo página 4 de 27.

14/10/2015 - Sereno da vida

A noite vai serenando sobre tudo, como que com suas gotículas querendo tocar o mundo. A noite se aproxima de todas as coisas e criaturas por meio dessas porções que caem da escuridão. Suores de cometas? Extratos de estrelas? Perfumes de anjos? Do que serão essas gotas? Uma tempestade cósmica que se repete a cada noite. Gotículas que aliviam e dão calma às loucuras. Gotículas que nos levam à cama. Gotículas que alimentam as almas das criaturas. Sereno, pequeno. Sereno, ameno. Sereno, veneno à estiagem de sonhos e ideias. Gotas ora são abelhas de uma grande colmeia ora são lobos de uma imensa alcateia. Sereno, poeira líquida do universo. Minha prosa, meu verso. O infinito do adverso.


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10/10/2015 - Silo

Longe de casa há tanto tempo e ainda me lembro dos perfumes, dos sabores, das texturas características daquele lugar onde nasci, cresci e vivi momentos que continuam nítidos pelos labirintos do meu eu. O cheiro dos doces da minha mãe e dos livros, revistas, gibis e vinis do meu pai se misturando no ar. A variedade de tecidos da minha mãe e de rádios, radiolas e vitrolas de meu pai se cansado pelo ambiente numa dança de cores e vibrações. Meu irmão, quando não submerso em seu mundo de tecnologias, estava comigo numa mão de baralho ou transformando a mesa da cozinha de minha mãe em uma partida de pingue-pongue. Minha mãe, cozinheira e costureira de mão cheia, caminhando pela casa como se fosse a rainha daquele lugar encantado onde escrevi romances e vivi às voltas com prosas e poesias. Meu pai dando comida escondida para Kika, brincando com Samuca e Amora. Minha mãe implicando com os miados de Franjinha. Os almoços festivos que duravam o dia todo, com jogadas de sinuca, fartura de comida e passos de dança, ainda estão impregnados em mim assim como os dias intimistas onde apenas Chico Buarque, Vinícius de Moraes ou Tom Jobim cortavam o silêncio do meu quarto que um dia foi ateliê de costura de minha mãe. Depois das tesouras, moldes e fitas métricas de minha mãe, o quarto teve mesa de desenhista e violão, mas acabou mesmo em se tornando um ambiente de escritor, com computador, livros, discos e muitos cadernos que iam ganhando linhas e versos. Recordo com saudade dos dias chuvosos em que minha escrita fluía com boa música, herdada de meu pai, chás e bolos feitos por minha mãe. E de repente, a casa se enchia dos meus avós. E tudo se enchia de encantaria. Meu pai chegando da rua com jornais, revistas e filmes trazidos da locadora se tornou cena comum, assim como ele fazendo suas preces num altar improvisado, com Nossa Senhora Aparecida, no armário da sala de jantar. Cenas do dia a dia que pouco a pouco foram se depositando em mim como num grande silo que me alimenta até hoje.


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29/09/2015 - Se perder e se achar

Não me fale suas razões. Eu não quero ouvir. Para que explicações? Não há mais o que decidir. Decidido está. Toma seu caminho e vá com todos os meus perdões. Não se arrependa. Coloca uma venda para não ficar encarando o passado. A sua escolha seguirá sempre ao seu lado para deixar você esquecer o que quis para sua vida. Os pedaços dos nossos corações quebrados e misturados vão se deixar e reencaixar por ai. Um dia ainda iremos se lembrar do que é inesquecível. Virá o frio da saudade e um fio de lágrimas. Pensará o que teria acontecido se tivesse feito diferente. E sem mais o que fazer tocará a dor em frente como junta de carro de boi que vai gemendo sua tristeza rangendo sua beleza tendo a certeza de que viver é se perder e se achar. ...
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05/09/2015 - Sem vendas

Hoje acordei com um vazio dentro e fora e fora e dentro de mim como se o tudo fosse nada e as faltas fossem deveras notadas. Nada se pôs a encaixar. Ninguém parecia amar como eu amei. E tudo ficava fora do lugar. O meu mundo havia sucumbido a um desses buracos negros espaciais que levam o que temos sem deixar nada para trás. Por todos os lados eu via a dona do meu coração, mas não conseguia tocá-la como se ela fosse poeira, fruta madura da árvore chamada ilusão. Hoje acordei com um vazio como rio sem água, como estrela sem luz, como alicate sem fio, como porto sem navio, como cruz sem Jesus. E eu tentei fechar os olhos e dizer para mim mesmo que estava tudo bem. Mas o amor, quando é amor, vendas não tem. ...
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27/08/2015 - Só não apela

Alinha as linhas da sua mão com as linhas do meu coração e advinha a minha direção. Alinha as vinhas do cálice da sua boca com as minhas videiras e acende minha língua como fogueira de São João. Mancha as estrelas com seu batom e leva o som da sua voz às pérolas mais belas em formação no fundo das ostras do mar profundo. Mela minhas costas e todas as minhas costas com seu mel, pelo avesso do meu céu, e pelas tabelas me rela só não apela dizendo entre os dentes que acabou quando sabe que é pra sempre. ...
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02/08/2015 - Se meu pai me diz

Se meu pai me diz para seguir meu coração eu sigo. Se meu pai me diz para confiar em sua mão assim eu vivo. Se meu pai diz para eu ser feliz para a tristeza não ligo. Se meu pai em diz para deixar para lá eu me privo. Se meu pai me diz que o tempo ruim vai passar eu já começo a clarear. Se meu pai me diz para amar incondicionalmente eu amo de coração presente. Se meu pai me diz para seguir em frente eu vou. Se meu pai me diz para ser melhor eu sou. Se meu pai me diz que tenho asas eu voo. Se meu pai me diz que minha vida é o outro eu me doo. Se meu pai me diz que está comigo eu tenho abrigo. Se meu pai me diz para afofar a terra e semear eu me faço canteiro. Se meu pai me diz para amanhecer eu me ilumino por inteiro.


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30/07/2015 - Seu jeito de amar

Num dia você me chama carinhosamente. Noutro, manda-me embora como se eu nem fosse gente. A mesma boca que grita é aquela que me enche de palavras bonitas. A mão que dá adeus é a que busca os seus prazeres e me dá conforto. Quando você me deseja morto eu sei que me quer bem, que é o seu jeito de dizer que ama e tem medo de amar também.


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10/07/2015 - Saudade encolhida

Nunca mais tive seus beijos nem sua boca a me dizer nada. Seus abraços abraçam outros braços. Suas pernas, como estão? Pra onde vão? Que caminhos são? Seus pés fazem novos passos. E entre acertos e erros, você afunda nos aterros da minha imaginação que abunda pela oitava paixão. Quando é que você volta? E quando me encontrar não solta? Sua ausência me provoca. Sua falta me sufoca. Sua saudade me toca e me invoca junto à sombra da sua silhueta desbotada em minha cama, em meu corpo, em meu dia a dia. Quantos copos de amanhã preciso para lhe esquecer? Quantas poesias terçãs são precisas para lhe trazer ao meu querer? Nunca mais senti seu perfume, mas ainda tenho ciúme da metade que é minha e vaga sozinha atendendo pelo seu nome. Tenho fome da minha vida que é sua, minha vida amada e nua.


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20/06/2015 - Situada

Tudo bem? Como está? Indo além? Vindo pra cá? Tem andado pra lá? O que tem feito acolá? A que vem? Oi? Olá? É dia de boi? É noite de obá? O que se deseja? Ao que luta? Champanhe ou cicuta? A quem beija? Relampeja ou troveja? Bem-vinda! Ao que principia? Ao que finda? Fia-se linda a madrugada. Qual é a sua estrada. Com tem passado? Está mais pra samba ou pra fado? Olhares pelo chão ou olhos alados? Vagueia por lares ou bares? Só ou aos pares? Por caminhos certos ou errados? Tem cantado ou anda calado? Qual é o seu lado?


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05/06/2015 - Santa do alto do morro do boi da cara branca

Lá no alto do morro do boi da cara branca, não tem asfalto só carranca. Lá no alto do morro nem a deus se pode pedir socorro porque deus por lá já deu adeus. Lá no alto a mulher só anda de pé no chão ou de sandália, pois o chão não se dá com salto. Lá no alto quando se quer noivar, casar, ficar para sempre é preciso fugir, partir, seguir antes de beijar. Lá no alto o espinho nasce antes da flor e o que se dirá do amor? Lá no alto do morro do boi da cara branca, a tensão é tanta que desejo proibido morre eletrocutado. Quem tem passado comemora por ter sobrevivido, mas chora por nunca ter dali partido. Violão segue calado, palhaço vive emburrado, pivete masca gilete e toda gente se declara inocente. Lá no alto do morro do boi da cara branca a força tanta não é dos soldados nem dos bandidos mal-encarados nem ainda dos mal-amados, mas de quem controla do perdão à esmola, de quem sabe do que voa, do que rasteja e do que rola. Lá no alto do morro do boi da cara branca quem arranca o que quer de homem ou mulher é a Santa. Santa é mais bruta do que a pedra que sustenta toda a gruta. Nasceu no Norte, deu nó na morte, e fez sua sorte no alto do morro do boi da cara branca e ali se agiganta. Santa manda prender, manda soltar, manda sofrer, manda matar. Santa anda e desanda a vida de quem bem quer. De dia é homem que não treme, a noite geme como mulher. Anda armada e nua como lhe convém, já levou facada e tiro, já sequestrou e foi refém. Santa não tem fama de fazer milagre, mas já dividiu ao meio uma lagoa de bagre e pegou pelo rabo um tigre dente de sabre. Muita coisa se conta de Santa, mas ela mesma não fala de si, nem do que sonha nem do que fez nem do que apronta. Para Santa, Santa nunca está pronta. Gosta de tomar sua cachaça, que consegue de graça, e andar tonta pela cabeça do morro do boi da cara branca. Não admite ser feita de monta nem errar na conta. Santa tem cabelo comprido, corpo de bandido e um ar mais do que atrevido. Não sei se mais por fé do que por medo, o povo do morro bota seus pedidos, suas moedas, suas vidas aos pés de Santa. Santa faz chover bala, faz corpo queimar, faz traidor pagar, faz doação a sua própria mala. Santa é de se drogar e de se achar em qualquer lugar. Mas aí de quem mexe com Santa, pois Santa não é de se beijar nem de conseguir perdoar. Santa é do pau oco e não foi feita para se quebrar. Santa corta a cabeça de quem for, por amor ou por falta de amor, no toco que fica lá no alto do morro do boi da cara branca. O que dá na cabeça de Santa ela faz sem pensar no que será que devia ter feito. Para Santa tudo tem jeito, o seu jeito. Vive de ajeito e quebra o mundo no seu peito. Santa tem tanta cicatriz e jura que nunca foi feliz. É de comer prato cheio e de não fazer volteio. Com ela nada é por um triz; Ou é ou não é assim que se diz. Santa não aceita flores e não gosta de vela, prefere o escuro e dois dedos daquela que lhe faz ainda mais Santa. Santa fala alto e firme como rei. É a lei do alto do morro do boi da cara branca que quando escuta Santa até se levanta. Santa espanta. Santa espanca. Santa impõe respeito com sua anca. Santa rebola e dá o que quer. Santa deita como homem e rola como mulher.


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