Daniel Campos

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Nascentes

Mel
Tinha os olhos das castanheiras
No auge do outono
Da mãe
Tinha a boca farta
As pernas rechonchudas
E um beicinho
Para conseguir tudo o que queria
Ao primeiro gesto.

Mitzi
Tinha os cabelos lisos
Com cachinhos nas pontas
Iguais ao da mãe
Tinhas as mãos pequeninas
Um que de boneca
E uma ternura no jeito de falar
Mas uma violência
Para sacudir-nos enquanto pais.

Maria Clara
Tinha um romantismo
No íntimo do seu íntimo
Tal a mãe tinha a cintura fina
O gosto pelo piano
E uma série de pintinhas
Esparramadas pelo corpo
E um ciúme devastador
Capaz de dividi-la em duas.

Hugo
Tinha a personalidade forte
Segura e decidida da mãe
Tinha óculos e um abraço pronto
E uma força interior
Fora do comum
Mas tinha também algo de marinheiro
Ou melhor, de nó de marinheiro,
Que ata e não desata de jeito algum.

Mel, Mitzi, Maria Clara e Hugo
Todos eles são meus filhos
Todos eles são filhos de um amor maior
Todos eles são filhos do destino
Todos eles morreram antes de nascer
No plano físico
Mas no mundo dos sentimentos,
Aquele que, de fato, me importa
Eles correm para lá e pra cá
Em campos de gérberas
Ou em quartos coloridos
Cheios de gravuras
Feitas, cuidadosamente e
Apaixonadamente, pela mãe
E riem
E fazem birra
E brincam de esconder
E derrubam meus óculos
E se dependuram em meu pescoço
E dão beijos de boa noite
De boa sorte, de um amor infante
Sob a guarda de um anjo lilás
E bendicto.


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