01/04/2009 - Só hoje
Paulo estava eufórico. Em um só dia, tinha conseguido mais coisa do que ao longo dos últimos dez anos. Para começar, tinha arrumado um belo emprego. Depois de dois anos sem trabalho, fazendo bicos aqui e ali, conseguiu ter a carteira assinada. E o salário que lhe prometeram dava para fazer as despesas de casa, pagar as contas e ainda sobrava grana para a cervejinha. Também havia conseguido uma bolsa na melhor faculdade da região para fazer seu tão sonhado curso de Direito. Ia estudar do bom e do melhor sem pagar nada por isso. E mais, sua colocação dava direito a uma viagem.
Para aumentar sua felicidade, havia conseguido namorar uma moça que vinha cobiçando há tempos. Sem que ele precisasse falar nada, ela deu-lhe um beijo. O dia não poderia estar melhor para Paulo. Já tinham combinado de ir ao cinema, ao cachorro-quente da esquina e se darem muitos beijinhos e abraços noite afora. Um amigo ligou no seu telefone e aos gritos disse que os dois haviam ganhado uma boa grana na loteria, numa aposta que fizeram em conjunto. Deus finalmente havia olhado para sua porca miséria. Ligou o rádio e a música que havia esquecido na gaveta estava entre as paradas de sucesso.
Seu pai, depois de tempos duros, havia deixado a prisão como um novo homem. Estava disposto a recuperar o amor do filho. Seu exame de diabete havia dado negativo. Seu cachorro havia voltado para casa. Ganhou dois ingressos para o show daquela banda que adorava. Sua avó saiu do coma. Recebeu uma carta de um amigo que estava morando em Angola. Sua mãe fez estrogonofe de camarão para o almoço. O prefeito decretou que amanhã seria feriado e ele poderia dormir até mais tarde.
No entanto, amanhã não era primeiro de abril. E todas essas coisas só eram possíveis no dia da mentira. Só hoje.
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