21/10/2009 - S de Superman ou de Suplicy
Blog do NoblatEle vestiu uma sunga vermelha sobre a calça, abriu os braços e saiu pelos corredores do Congresso Nacional tentando voar. Se não fossem seus cabelos grisalhos, seria facilmente confundido com um menino. O conceituado senador Eduardo Matarazzo Suplicy ao topar participar da brincadeira de um programa humorístico de televisão trouxe à tona um tipo de molecagem diferente das que muitos parlamentares estão acostumados a participar. Construir castelos que não são de areia e brincar com dinheiro público, convenhamos, são fatos muito mais graves, moral e eticamente falando, do que se fantasiar de super-homem.
Aliás, só um super-herói pode salvar a imagem de uma instituição que insiste em ser pautada por escândalos. O Senado virou piada coletiva há muito tempo e a culpa não é de Suplicy. Pelo contrário, o senador eleito por São Paulo dedicou sua vida à erradicação da pobreza e ainda não foi levado a sério como deveria. O gesto de vestir uma sunga vermelha deve ser visto como um grito contra a descolorida hipocrisia política brasileira. Por detrás da arquitetura de Niemayer, da alta-costura e dos ares de bom-moço que escondem aqueles indivíduos que deveriam representar o povo há vilões de fazer inveja às histórias em quadrinhos.
A enxurrada de críticas foi, sobretudo, óbvia. É claro que um super-homem incomoda o “status quo” implantado por uma série de Lex Luthor, Sr. Mxyzptlk, Apocalypse, Parasita, Metallo, Superciborgue, Bizarro, Darkseid e outros tantos malfeitores que povoam as histórias do Superman. E a cor da sunga, embora associado ao super-herói, é também uma referência aos ideais "vermelhos" que foram tão destruídos quão o planeta Krypton. Talvez se a sunga de Suplicy estivesse recheada de dólares ele teria sido absolvido mais rápido e nem desse tanto o que falar.
Para evitar uma investigação estruturada em uma suposta quebra do decoro parlamentar que poderia lhe custar o mandato, o bisneto do conde Francesco Matarazzo teve que procurar a direção do programa e pedir que tal cena não fosse exibida. Depois de muito disse-me-disse a Corregedoria do Senado encerrou o caso. É uma pena que um senador que, mesmo por meio de um programa de humor, seja associado a um personagem que lutava para corrigir erros, combatendo a tirania e a injustiça social seja hostilizado dessa forma. A pressão foi tão grande que Suplicy foi obrigado a dizer que a atitude de se fantasiar de super-herói não foi boa.
Correr de sunga vermelha, assim como citar Racionais MC's sobre os tapetes azuis, disputar uma prévia com Lula, dar um cartão vermelho a Sarney, ficar ao lado de Heloísa Helena e cantar Bob Dylan no Plenário são fatos que provocam mais do que a defesa intransigente de um projeto que garante uma renda mínima a cada cidadão brasileiro, independentemente de cor, credo, sexo, origem e classe social. Pode parecer absurdo, mas combater a fome, a pobreza e a desigualdade social na terra do Carnaval dão bem menos ibope do que uma piada batida como essa de se vestir de super-herói.
Embora seja pop o bastante, diante da conjuntura política brasileira, Suplicy está condenado a ser apenas a versão Clark Kent do Super-Homem: um homem comum, de aparência frágil e inofensiva. Já que essa coisa de integridade, de honestidade, de salvar o mundo tem causado tanto espanto, se eu fosse Eduardo próximas eleições. Dedicar-me-ia à literatura social e fundaria uma ONG que me permitisse voar livremente. Afinal, com a experiência que acumulou em quase duas décadas como parlamentar, Suplicy sabe como ninguém que há uma espécie de kriptonita naquele Congresso que enfraquece as boas idéias e iniciativas, bem como impede atos de heroísmo.
Observação do autor: Publicado no blog do Noblat em 21/10/2009: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2009/10/21/s-de-superman-ou-de-suplicy-233997.asp
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