26/05/2009 - O silêncio de um eu te amo
Hei de cantar até o silêncio dessa trova que berra entre nós. Criatura amada, mais que amada, faz-se nua no céu para eu possa enfim me por na quietude de sua serenata. Que a lua, por ciúme, não vaie. Que o sol, em ardume, não ovacione. Que as estrelas se aquietem em constelações e não intervenham no espetáculo da paixão. Que o único ruído dissipado seja o gemido dos olhares indiscretos e o grito das mãos pedindo bis aos pecadores. No mais, que o manto do silêncio nos cubra e nos guarde para sempre amém.
Não quero ouvir sugestões, reclamações, palpitações, divagações, reflexões, indagações de parte alguma, nem mesmo de Marte. Quero o vazio de todo e qualquer som para me calar no silêncio profundo que lhe habita, ò criatura amada. Cortem a língua dos tagarelas, amordacem os falantes, sufoquem os rompantes dos que não sabem ou conseguem ficar mudos. A plenitude do amor deve se dar acusticamente, sem interferências externas ou internas. Portanto, pássaros, pianistas, floristas, ao menos por agora, não são bem-vindos. Voltem amanhã ou esperem nas coxias.
Quero que nossos corpos se comuniquem sem precisar de alfabetos gregos ou hebraicos. Quero que nossas línguas se calem em frases não ditas. Quero ler as cartas de seus olhos e me oferecer, para ser lido, na borra de seu café. Quero muda e cegamente entender o ser existencial, consubstancial, visceral que vocifera em suas entranhas. Arranha os meus tecidos, as minhas células e escreva em mim as suas memórias e profecias. Não falem nada, não digam nada, não proclamem nada... Eu quero saber a métrica e a fonética escondidas por detrás do eu te amo que se põe no silêncio de suas costas, no eclipse da saudade.
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