Daniel Campos

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06/11/2009 - O Brasil precisa nos escandalizar à moda Anita Malfatti

Blog do Noblat

Dia 6 de novembro de 1964. Há 45 anos morria Anita Malfatti, um dos principais gritos do modernismo.

O que esperar de uma menina que à procura de seu caminho chegou a se deitar por entre dormentes e desejar o trem?

Entre a loucura e o delírio, enxergou um leque de cores riscadas passando sobre seus olhos e a certeza de que seria pintora.

Com a morte do pai engenheiro, lecionou para ajudar no sustento da casa antes de mergulhar mundo afora trabalhando seu dom artístico.

Foi além dos dogmas da Academia Real de Belas-Artes de Berlim, encantou franceses e norte-americanos, porém foi apedrejada pelos olhares brasileiros.

Em 1917, aos ecos da Revolução Russa, chacoalhou uma São Paulo tão acadêmica quão provinciana que relutava em aceitar o novo como algo bom e belo. Monteiro Lobato, um pré-modernista, comparou a pintura de Anita aos desenhos produzidos em manicômios ferindo, para sempre, a alma da artista.

Sua arte provocadora aglutinou jovens poetas e artistas incorfomados com a enxurrada de críticas.

Esse movimento colaborou para o nascimento da Semana de Arte Moderna de 1922 – na qual Anita assombrou mais uma vez com suas cores violentas e artificiais.

Assim como as telas expressionistas de Anita, o modernismo berrou que as formas tradicionais da arte e da vida cotidiana estavam ultrapassadas, que era preciso criar uma nova cultura, da economia à poesia.

Era preciso reinventar a existência.

O país crescia e se transformava enquanto Anita surpreendia novamente pintando telas simples, com temas ligados à natureza.

A pintora que escondia uma deformidade congênita na mão direita com lenços coloridos buscava agora disfarçar a realidade com pinceladas doces e ingênuas. Após o choque, a ternura.

Quarenta e cinco anos depois de sua morte, o Brasil ainda precisa entender e viver Anita Malfatti. Observando a política feijão-com-arroz servida aos brasileiros dia após dia chega-se a conclusão de que é necessário dar vida à novas Anitas.

Um país que banalizou o escandâlo precisa seguir o exemplo da pintora e experimentar voluntariamente a fome, a sede e a cegueira, buscando superar a si mesmo antes de transformar algo ou alguém.

Embora o mundo contemporâneo nos imprima mudanças a cada novo segundo, em alguns terrenos, como o político, tudo se tornou previsível.

Que em 2010, ano de eleições e da 10º edição do Fórum Social Mundial, o Brasil possa viver um novo modernismo e nos escandalizar à moda Anita Malfatti.

Observação do autor: publicado no blog do Noblat, em 06/11/2009. Endereço: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/post.asp?t=o-brasil-precisa-nos-escandalizar-moda-anita-malfatti&cod_Post=238210&a=112/


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