13/05/2009 - O Brasil desprezando o Brasil
"Vou contar a minha vida, do que eu já tenho passado
Sempre foi rapaz de gosto, um cabocro arrespeitado.
Já fui violeiro de fama, das morena cubiçado.
Tudo isso se acabo, hoje eu vivo desprezado".
(trecho da canção Desprezado, de Tonico e Tinoco)
Imagine um nó de boiadeiro lançando a alma da gente. Sem dúvida, uma asfixia que fere a alma de qualquer um. Foi isso que senti ao ver Tinoco, da dupla Tonico e Tinoco, aos 89 anos de vida, na tela de um programa popular da televisão, pedindo ajuda para salvar a mulher que está com câncer. O violeiro de inúmeros sucessos já gastou tudo o que podia e também o que não podia para tentar salvar a bem amada. Cheio de dívidas, pôs-se a fazer uma rifa, entre amigos, do único bem que lhe resta (um Gol 1998) para tentar contornar a situação.
Mais absurdo do que presenciar um ícone chegar a esse estado deplorável é saber que ele ganha cerca de mil e quinhentos reais por show. Enquanto duplas sertanejas, que tiveram seus caminhos abertos por Tonico e Tinoco, faturam duzentos, trezentos mil reais por uma única apresentação, o caipira, que ao lado de seu irmão compôs uma dupla apelidada de Coração do Brasil, mendiga para sobreviver. Infelizmente, Tinoco foi deixado pra trás. Pode vasculhar que você não encontra em disco algum dessas duplas milionárias uma parceria com Tinoco. O passado, em nosso país, é desprezado. Tanto faz ser bom ou ruim, vai para o ralo do esquecimento.
O homem que cantou o Jeca em canções cheias de saudade, lendas e sotaques caipiras foi deixado de lado. As novas gerações, na ânsia de se imporem, tratam logo de cortar suas raízes. No entanto, quem está esmolando não é o Tinoco, mas o retrato de um Brasil consagrado, afamado, festejado que, com o passar do tempo, por uma dessas injustiças da vida, acabou ficando dependurado em uma parede velha. E nessa dança de cadeiras, na qual até uma lenda viva do porte de Tinoco cai, o que será de nós no amanhã?
Embora eu ainda não saiba a resposta para essa questão, tenho certeza de que assim como Tinoco não queremos para nós o final da moda que abriu esse texto: "Meus suspiro são doído, no meu peito machucado, já acostumei com o desprezo, quero viver desprezado".
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