Daniel Campos

Texto do dia

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02/06/2009 - Morredor de mim

Morri tantas vezes. Mortes provocadas, planejadas, inesperadas... Algumas vezes morri por mãos desconhecidas, outras por minhas próprias mãos. Às vezes morri de rir, mas na maioria das oportunidades morri mesmo foi de chorar. Morri de véspera em inúmeras situações e tive, ao menos, três mortes adiadas. Nem me lembro quantas vezes recebi extrema-unção. Não me recordo se recebi ou não o seu perdão, no leito de morte. Só sei que morri fora e dentro, dentro e fora de mim.

Deitei naquela madeira fria. Cruzei as mãos. Fechei os olhos. Presenciei as preces e maldições saindo das bocas. Fui carregado e carreguei meu próprio caixão. Gritei mudamente debaixo dos sete palmos. Ouvi o estômago dos vermes roncando de fome. Por mais que pedisse o contrário, fiquei sozinho. A solidão da cova me matando. Vi meus sonhos morrerem um a um. Esperei que viessem me buscar, mas ninguém apareceu. Apagaram as luzes e, por mais que eu dissesse que não, deixaram-me no escuro.

Eu não ressurgi como fênix. Pudera, não tinha cinzas. Eu não ressuscitei como Cristo. Pudera, não tinha cruz. Eu não fui sequer exumado. Pudera, não tinha ninguém a minha procura. A cada morte, um novo modo de me perder. A cada morte, o futuro me traia. A cada morte, eu pior me sabia. A cada morte, eu, morredor de mim, me iludia. E quantas mortes eu ainda terei em minhas costas? E quantos vezes eu ainda terei que cavar minha própria sepultura? E quantas vezes eu ainda terei de acreditar que alguém virá me buscar?


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