11/07/2009 - Desobrigue-se
Percorra seus porões, vasculhe seus sótãos, o que você procura deve estar a lhe esperar em algum lugar. Acenda uma lanterna, uma vela, um lampião e bata perna pelos seus subterrâneos cooptando pistas. Abra seus túmulos, catacumbas, caixões, caixas e caixinhas à procura de você. Ao longo dos últimos anos, quantos de seus sonhos, de seus projetos, de suas vontades ficaram para trás? Quanto de você precisou ser enterrado, precisou ser deixado, precisou se tirado de suas mãos? Quanto de você precisou ser ferido, banido, morto ou escondido para que continuasse a sobreviver?
Quantas frases você foi obrigado a deixar de dizer? Quantos beijos você foi obrigado a deixar de dar? Quantos castigos você foi obrigado a cumprir? Quantas de suas fantasias vocês foi obrigado a moer nos moinhos da realidade? Quantas vezes você foi obrigado a se retirar do centro do palco? Quantos sentimentos você foi obrigado a renegar? Quanto de si você foi obrigado a vender? Quantos caminhos você foi obrigado a deixar de percorrer? Quantos sorrisos você foi obrigado a chorar? Quanto de amor você foi obrigado a abandonar em um canto qualquer, em um livro qualquer, em um vulto qualquer?
Pois chegou o momento de se desobrigar de tantas castrações, de tamanhas negações, de incontáveis frustrações. Tente recolher o máximo de coisas que você deixou pra trás. Veja o que ainda pode ser útil, o que ainda pode valer algo, o que ainda pode gerar alguma coisa para além do passado que se tem guardado. Quem sabe se de um punhado de saudade você não consegue, ao menos, um sopro de felicidade? Quem sabe se depois de tantas asas caídas você não consegue compor uma ave proibida? Quem sabe, quem sabe, quem sabe se dentre tantos mortos e feridos você não consegue viver um tempo ainda não vivido?
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