20/01/2009 - Arrastão
Você chutou meu castelo de areia e agora eu sou mais um náufrago da sua maré cheia. E olha lá, vem vindo o arrastão, vai levar o que me resta de mim, o que me sobra de mim, o que você ainda deixou de mim. E eu já não sei quem é ou sou. E eu não sei para onde vou. Será que eu sou um coral longe de seu atol? Será que eu me escondo em uma ostra à procura de uma pérola ou da sua boca de limão?
Você fechou seu guarda-sol e me deixou ao sol. Você remou sua prancha para o oceano e me entregou de bandeja aos tubarões. Você fingiu que era guarda-vidas e me fez afogar. Eu fui pedir abrigo aos pescadores, aos surfistas, aos banhistas e corri, e chorei e entrei no primeiro castelo de areia, que uma criança esqueceu no meio da praia. Eram quatro torres e uma muralha e um rei sem rainha.
Você chutou meu castelo de areia e agora eu sou mais um náufrago da sua maré cheia. Eu nunca mais eu lhe vi, mas me contaram que até a lua se bronzeou pelos óleos e sais de seu corpo, que as flores de seus pés ficaram douradas e que seus cabelos cachearam na brisa. E, no quebrar do mar, você embarcou em um veleiro e ardeu feito vela a saudade que restou. E agora, sem as muralhas do castelo, o arrastão vai me levar a saudade também.
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