Daniel Campos

Texto do dia

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17/05/2009 - A cabreúva e o jacarandá

Era só uma árvore. Uma cabreúva. Mas eu quis saber sobre teu nascimento, relacionamentos e dramas. Tinha quase trinta metros de altura, copa frondosa, flores e sementes delicadas, mais do que isso, tinha uma boa memória. E ao contrário das paineiras que se fecham em espinhos ou das gameleiras que escondem demônios ou dos mognos que são meio caladões, aquela era uma árvore simpática, que gostava de conversar. E ela tinha história e histórias para contar.

Foram tantas conversas, tantas fofocas, tantos gritos, tantos rompantes, tantas calúnias, tantos romances, tantos jogos de sorte e de azar, tantas núpcias, tantas declarações, tantos pedidos de perdão, tantas mentiras, tantas divagações, tanta bebedeira, tantas preces, tantos cochilos, tantos duelos, tanto riso, tanto pranto, tanta brincadeira, tanta cantoria, tanta romaria, tanto vento e sentimento passando entre suas galhas e suas raízes.

A maioria dessas histórias nasceu em um banco de madeira, meio carunchado, que pegava à fresca de suas folhas. E como ela gostava de sombrear aquele banco. Sem braços ou mãos, propriamente ditos, usava sua sombra para abraçar aquele banco e quem nele se sentasse. Ela se lembrava de quando consolou Ana após a morte de João; quando acariciou Pedro, um desses ecologistas de fala bonita e quando escondeu o beijo roubado de Talita.

Podia conversar ou abraçar ou sondar tantas vidas e histórias, mas tinha que se calar em sua própria história. Ou melhor, com o que sobrou dela - aquele banco de madeira, o seu amor Jacarandá.


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