Daniel Campos

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04/07/2010 - Toada da porteira da estrada

Lá no alto da porteira, num galho da velha cumeeira, mora um pássaro preto que assovia bonito toda vez que vê moça fagueira romper o estradão. Conta uma lenda cabocla que ele era Dito de Benedito, moço bonito e de muitas posses, cobiçado na região. Tava de casamento marcado com uma morena de olhos de brasa quando se apaixonou pela filha de um tropeiro. Numa noite de lua prateada o coração do peão balançou e da aliança de noivado até a casa, que já tava toda montada, tudo se perdeu pela estrada.

Não dando a batalha por perdida, a moça que tinha o sangue das bruxas nas veias amaldiçoou o casal num feitiço que amarrou nas teias de uma caranguejeira. Como desgraceira dessa maldição, o peão virou pássaro preto e a morena, uma figueira. A feiticeira se deu por satisfeita, mas como toda maldade é imperfeita, o pássaro trocou as asas pelos galhos que um dia já foram os braços da mulher que se apaixonou. E numa angústia louca bicou aquele lenho se lembrando do desenho e do gosto de sua boca antes de se dar aquele desgosto.

Como prova de sua lealdade, cantou dia e noite e noite e dia no alto daquela figueira que se remexia com o vento, chorava com a chuva e dava figos para seu amado comer. Porém, depois de muitos anos, a árvore foi ao chão pelas mãos de um lenhador, que transformou aquele lenho em porteira. Porteira do estradão. Desde então, o tal pássaro, tenor de uma só dor, canta toda vez que vê uma mulher abrindo ou fechando aquela porteira, na qual fez sua morada, de modo a lembrar do amor de sua tropeira enfeitiçada.


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