Daniel Campos

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24/11/2012 - Os truques de Seu Antônio

Seu Antônio, em sua última passagem pela Terra, era um homem cheio de truques e mistérios. Pouco se sabia sobre sua vida. Ele praticamente não falava de sua infância, de sua adolescência, de suas aventuras. Suas histórias sempre falavam sobre outros personagens. O segredo, para conhecê-lo, era ir juntando em seus causos e piadas pedacinhos dele. Como todo autor de boas histórias, coloca pitadas de si e do que o rodeio em suas narrativas.

Ele era o menino da história que nunca brincou. Ele era a criança tratada como bicho pelo pai. Ele era aquele de corpo franzino que carregava e descarregava mil caminhões de lenha por dia. Ele era o aluno que não pode estudar. Ele era um apaixonado pela dança. Ele era o jovem que teve que abrir mão dos bailes. Ele era o recém-casado que saia de casa com uma enxada nos ombros a procura do pão de cada dia.

Seu Antônio era o homem de três tombos, de três capotamentos seguidos. Ele era aquele que teve que abrir mão dos temperos da vida. Ele era do tempo que o castigo vinha por meio de um chicote. Ele era alguém que andava com cuidado para não pisar em uma formiga sequer. Ele era o sério que não gostava de malcriações. Ele era o brincalhão que para enganar os pernilongos que roncavam em seu ouvido, por debaixo da coberta trocava a cabeça pelos pés.

Ele era milhões em um. O menino grande que ria das trapalhadas de Mazzaropi. O caçador de lagarto para os almoços de domingo. O taxista que carregou Deus e o Diabo em suas corridas. O astuto que amarrava um cachorro nas costas do outro para que quando um cansasse o outro tomasse seu lugar. O avô que se realizava em seus netos. Ele era aquele dançador que batia catira com os olhos. Ele era o sonho que jamais deixou de ser sonho num mundo de pedra.


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