Daniel Campos

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31/01/2011 - O amanhecer do limão galego

Hoje acordei e me assustei: o meu limoeiro estava loiro. O cabelo longo e escuro e verde das folhas deu lugar a um amontoado de luzes. Mas ao contrário de mechas luminosas o que vi foram bolas e mais bolas pondo fim à escuridão. Bolas brilhantes e chamativas como bolas natalinas. Na verdade, bolas amarelas-limão, cheirando a sumo e temperos e caipirinhas e outras coisinhas. Hoje acordei e me assustei: o meu limoeiro amanheceu verdadeiramente galego, como na terrinha de antigamente.

Tão logo o vi, eu me esqueci de relógios e compromissos. Perdi hora. Cheguei atrasado ao serviço. Foi um reboliço. Tudo porque parei e me sentei debaixo do pé de limão galego. Fiquei brincando com pensamentos. Voei no tempo e na imaginação. Quantas lembranças e sensações os frutos pequenos e atrevidos daquele limoeiro me traziam. É como se eu tivesse me reencontrado com um perfume perdido, com um gosto há tempos não sentido e com uma coloração sumida da minha paleta cotidiana.

Hoje amanheceu e eu me assustei: é como se o sol enchesse aqueles frutos com uma espécie de néctar fluorescente, tão cítrico e ao mesmo tempo tão doce. Era preciso aproveitar aquele momento. Logo viriam apanhá-los. Logo viriam roubá-los. Logo viriam derrubá-los. Logo viriam espremê-los. Logo viriam anoitecê-los. Ao menos se eu pudesse protegê-los e os fazê-lo durarem uma eternidade. Mas quem era eu para impedir o pôr-do-sol dos limões galegos e o renascimento da saudade?


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