Daniel Campos

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01/08/2010 - Niágaras

Quando uma uva niágara explodiu seu perfume adocicado em minha boca fui tragado para os confins do meu baú de lembranças, no qual vou me misturando em pedaços de adulto, velho e criança. E, ali, caído em meio a mundos abstratos e fundos concretos, encontrei um dos meus doces prediletos. Um doce que não é feito em panelas de cobre, mas em videiras que cobrem uma parte do céu por meio de suas parreiras. O doce diferente e inocente das uvas niágara que chegavam em casa em caixas de madeira trazidas por meu pai.

Meu pai, em meados de dezembro, chegava com caixas e mais caixas dessas uvas vindas da quitanda do Bira e as oferecia a minha mãe como se trouxesse buquês de flores. E o sorriso dela diante daquelas caixas era equivalente ao momento em que avistava um pé repleto de jabuticabas. Por debaixo das ripas de madeira, devidamente pregadas, um papel delicado acolchoava as niágaras. Aquilo era praticamente um tesouro que minha mãe não fazia questão de guardar. Em conjunto ao sabor, guardo com nitidez em meu baú de recordações o perfume dessas uvas.

Um perfume que se alastrava pela casa, chegando a impregnar nas galhas da árvore de Natal. Não é à toa que essas uvas pequenas, arroxeadas e aglomeradas de forma apertada nas camadas que formam seus cachos sempre fazem me lembrar do Natal. Talvez porque sejam doces como imagino doce o espírito natalino. E também porque eu acredito que os cabelos cacheados dos anjos de dezembro sejam feitos de cachinhos de Niágara.

Divagações à parte, essas uvas, que hoje não chegam mais em caixas de madeira da quitanda do Bira endereças para a minha mãe, ainda mexem comigo de uma forma incomum. Pudera, já é agosto e os sinos de Belém dobram-se ao primeiro estouro das uvas Niágara. Falta pouco, muito pouco para o Natal. Ao menos, essa é a mensagem subliminar que acompanham essas uvas.


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