Daniel Campos

Imprimir Enviar para amigo
17/07/2014 - Não deu tempo, Valentina

Não deu tempo de eu falar numa canção de ninar o quanto sonhei que os sorrisos de mãe e filha fossem iguais. Não deu tempo de você rir da minha cara de bobo assim como fazia sua mãe. Não deu tempo de você se orgulhar das histórias de amor que esse seu pai iria lhe contar. Não deu tempo de você engatilhar em minha direção e se sentir segura em meus braços feito sua mãe. Não deu tempo de eu desejar que você tivesse os olhos, as mãos, os pés, as pintinhas de sua mãe. Não deu tempo de eu ver você crescer na barriga que tanto me encanta. Não deu tempo de lhe contar em segredo boa parte das minhas loucuras apaixonadas. Não deu tempo de eu ganhar uns tabefes de sua mãe por lhe introduzir numa alimentação nada saudável. Não deu tempo de eu assoviar seu nome entre as cordas do violão que já chamou tanto por sua mãe. Não deu tempo de eu lhe ensinar a ler meus versos, poemas que desejei escrever pelo corpo de sua mãe. Não deu tempo de lhe vestir de rosa e tiara de diamantes, afinal filha de princesa, princesa é. Não deu tempo de lançar beijos aos olhos de sua mãe tendo você entre nós na cama. Não deu tempo de lhe dar um banho de ouro, tampouco uma chuva de pérolas. Não deu tempo de você descobrir o quanto sua mãe é digna de ser amada. Não deu tempo de você conhecer a teimosia de sua mãe. Não deu tempo de você me chamar de herói. Não deu tempo de eu levar junto a mim a miniatura de sua mãe. Não deu tempo de eu levantar da cama atendendo ao seu choro na ponta dos pés para não acordar sua mãe. Não deu tempo de lhe aconselhar sobre o amor. Não deu tempo de lhe presentar com uma coleção de bonecas inspiradas na sua mãe. Não deu tempo de lhe mimar sem deixar jamais de mimar sua mãe. Não deu tempo de eu ver qual a cor do primeiro esmalte que pintaria suas unhas. Não deu tempo de entrelaçar minhas mãos nas mãos de sua mãe durante seu parto. Não deu tempo de ficar contando dia após dias mais ela a sua chegada. Não deu tempo de embalar seu sono rumo ao mundo dos sonhos onde eu sempre vivi com sua mãe. Não deu tempo de lhe falar o quanto sua mãe me fez esperar. Não deu tempo de lhe contar nada sobre as estrelas que sua mãe me fez conhecer tão bem. Não deu tempo de lhe perfumar da primeira essência que encontrei em sua mãe. Não deu tempo de eu lhe levar de mãos dadas a reinos encantados onde sua mãe habita com desenvoltura. Não deu tempo de alegrar o seu choro. Não deu tempo de assim como sempre busquei fazer com sua mãe trazer pra mim todas as suas dores. Não deu tempo de não levar tudo tão a sério e me permitir a brincar com você. Não deu tempo de ouvir as ideias criativas de sua mãe para decorar seu quarto. Não deu tempo de lhe fazer surpresas (sua mãe certamente lhe contaria que eu adoro surpresas). Não deu tempo de saber quem seria mais menininha, você ou sua mãe. Não deu tempo de dizer que você tem a mais linda mãe desse mundo. Não deu tempo de você descobrir que é filha de um anjo torto. Não deu tempo de lhe dizer que nossa família está além do tempo. Não deu tempo de saber qual tatuagem sua mãe faria em sua homenagem. Não deu tempo de ver sua mãe dar o braço a torcer no assunto maternidade. Não deu tempo de você protagonizar capítulos do romance que lhe geraria. Não deu tempo de eu lhe ensinar que o impossível é possível. Não deu tempo de você se alimentar daqueles seios de devaneios. Não deu tempo de você ser uma bichinha preguiça tal qual sua mãe. Não deu tempo de lhe ver como espelho da sua mãe. Não deu tempo de ter com você um mundo tão próprio como com sua mãe. Não deu tempo de lhe colocar no balé. Não deu tempo de você me chamar de afoito. Não deu tempo de eu ceder a sua birra como me acostumei a fazer com sua mãe. Não deu tempo de despertar de uma vez em sua mãe o desejo de ter você. Não deu tempo de a gente ter na mesma intensidade por um tempo a mais esse querer. Não deu tempo de não lhe perder, de não lhes perder. Não deu tempo de você dizer as suas amiguinhas "sou filha de um amor de conto de fadas".


Comentários

17/07/2014, por Rafaela Almeida:

FOFO

17/07/2014, por Luana T:

Aposto meus olhos que há muitas que suspirariam com a ideia de ser mãe dessa menininhaziha. Que sensibilidade! Como você consegue ser assim? Melhor, como você é assim?


Escreva um comentário

Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.

voltar