Daniel Campos

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30/06/2010 - Divagações a respeito da mulher amada

O sentimento, em primeiro lugar. Logo em seguida, o conflito entre esperanças e angústias de tempos passados e vindouros. Só depois, a técnica. Eis o script perfeito para a apresentação, ou melhor, a montagem da mulher amada. É de valiosa importância ficar atento à ordem das palavras ditas ou não ditas pela boca, feita de carne e silêncio, da mulher que confessa amar ao mesmo tempo em que se permite ser amada. Essa ordem lhe levará à infância, às paixões juvenis e aos sonhos futuros da mulher amada, que é tão precisa quão dedicada ao seu construtivismo amoroso.

Impressionista, a mulher amada prioriza os efeitos - formas, tamanhos, cores, temperaturas, aromas, texturas e sabores – num corpo multissensorial. Diante dela, o olfato ganha língua e o paladar, olhos. Olhos capazes de devorá-la viva, mas com toda cerimônia necessária para a ocasião. Entre o romantismo e o canibalismo, o aroma da mulher amada é um buque servido em chamas. E não se engane de achar que ela é efêmera. Cuidado em suas previsões, pois a primeira impressão em relação à mulher amada tende a se transformar num duradouro amor.

Isso porque a mulher amada, mesmo ilusória, sabe se fazer real. O imperfeito constrói o perfeito que há em si. Não é à toa que ela é cheia de ironias, citações literárias, cinematográficas, propagandísticas. Pelos seus atos e fatos: tentações irreverentes, jogos de palavras, labirintos inocentes, molecagens desafiadoras. Mas é a mistura exata de afeto e desafeto contida nessa mulher de amores o que mais me satisfaz e atrai aos seus perigos. Afinal, quando o romance beira o limite do insuportável, do inaceitável, do imponderável, ela se desmancha na boca como um afável torrão de açúcar.


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