Daniel Campos

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Avalanche no deserto

A noite parece ter caído toda de uma só vez a ponto de não ter mais nada para cair até o amanhecer. E não passava das 21 horas. Nas mãos, um copo de água com açúcar. A sensação de o mundo, por alguns segundos, ter se apoiado em suas costas. Os pensamentos revirados. As emoções desencontradas. Andava em círculos. Amanhã teria de acordar cedo, mas o sono não vinha. Talvez não viesse nunca mais. Ora tinha vontade de trancar a porta do quarto ora queria abrir o portão e caminhar na rua, descalça. Não sabia o que queria. Poucas vezes se viu tão confusa. O telefone, cheio de impressões digitais e de confissões não dizia nada. Parecia exausto. Por hora, deitou no colo da mãe, fez um monte de perguntas abstratas e fugiu antes do final do abraço. Parecia sufocada. Colocou um disco. E talvez a música servisse para abafar o choro, que já era tão quieto. Foi para frente do espelho, vestida com uma jóia ainda não vista pelo espelho e os olhos não entendiam as lágrimas. Olhos que se agarravam a algumas linhas repetidas vezes. Guardou o colar embrulhado no papel e abriu a janela. Não tinha nada para ver lá fora, mas olhava fixamente para si mesma. E ali, entre um gole e outro de açúcar, separava sentimentos dos nós que a vida havia dado. De repente, desceu da janela e ganhou a cama. De repente, um suspiro. Estava feliz. Contente da vida. E mais uma vez, o disco, que se repetia pela sétima vez, abafava seus risos calados. Virou de lado e dormiu em paz. Só tinha um único medo, o medo de ter certeza.


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