29/11/2008 - A mulher sentada na janela
A mulher sentada na janela quer ser paisagem de si mesma. A mulher sentada na janela quer, ao mesmo tempo, se jogar dali e ser amparada. A mulher sentada na janela quer seguir junto aos carros, ônibus, caminhões, aviões. A mulher sentada na janela cobre e encobre edifícios. A mulher sentada na janela quer criar asas de pássaro. A mulher sentada na janela tem sonhos azuis. A mulher sentada na janela tem desejos de nuvem. A mulher sentada na janela, feito veneziana ao tempo, é consumida pela ferrugem.
A mulher sentada na janela brinca de não ter medo. A mulher sentada na janela assovia ao passaredo. A mulher sentada na janela tem palavras duras e um silêncio torturador. A mulher sentada na janela tem pernas desconexas do resto do corpo. A mulher sentada na janela quer um último beijo, um último cortejo, um último ensejo. A mulher sentada na janela quer ser fechada e aberta por outras mãos. A mulher sentada na janela quer ranger, gemer e estremecer nos braços de outro alguém.
A mulher sentada na janela é feita de folhas... Folhas de outono, folhas de caderno, folhas de papel crepom. A mulher sentada na janela tem um quê de brisa. A mulher sentada na janela controla a intensidade do sol e da lua. A mulher sentada na janela é o reflexo da rua. A mulher sentada na janela não tem origem nem destino. A mulher sentada na janela abre os braços em cruz, conforme um Cristo feminino. E, ali, entre o céu e o chão, sofre o seu calvário.
Comentários
amei o poema muito bom!
Escreva um comentário
Participe de um diálogo comigo e com outros leitores. Não faça comentários que não tenham relação com este texto ou que contenha conteúdo calunioso, difamatório, injurioso, racista, de incitação à violência ou a qualquer ilegalidade. Eu me resguardo no direito de remover comentários que não respeitem isto.
Agradeço sua participação e colaboração.