Daniel Campos

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14/07/2014 - A morte de quem se ama

Como se sentir depois de receber a notícia de que a pessoa que você mais ama na vida morreu? E receber essa notícia dela mesma? Uma morte tão inesperada quanto anunciada. Uma morte que você não quer e nem vai aceitar. Afinal, quem se conforma em perder seu grande amor? Saber que nunca mais vai poder tocar sua pele, sentir seu perfume, olhar no fundo de seus olhos e declarar o que sente seja por meio de prosa ou verso com toda licença poética. A certeza de que nunca mais vai ser possível lançar um eu te amo e esperar as reações dela consome até a última gota da alma. Nunca mais, essa expressão dói, cala, grita, faz chorar por dentro e por fora, sangra sentimentos em carne viva. Dar adeus todo dia a resquícios que ainda estão impregnados no cerne do afeto é dilacerador. A morte é declarada, mas ela não é finita. A morte de alguém que se ama é infinita. Cada dia ela morre um pouco mais e de um jeito diferente, trazendo dor e perdas diferentes. A lembrança em certos momentos desse luto é pior do que o esquecimento. Há fantasmas do que você poderia ter dito e não disse, do que poderia ter feito e não fez, do que poderia ter ouvido e não ouviu lhe apavorando o tempo todo. Porque a morte, como coloca uma pedra na possibilidade de continuação, levanta a todo e qualquer instante o “podia ter sido diferente se”... quando, na verdade, sabíamos que tinha de ser exatamente assim. A morte faz com que fiquemos nos enganando para sofrer menos ou mais dependendo da necessidade. A morte da pessoa amada nos martiriza, deixando-nos sozinho e nu com nós mesmos. Aliás, a morte desse amor infinito coloca em dúvida até mesmo a existência do amor. Sim, porque desde sempre acreditamos que os amores não morrem. Como se sentir depois de receber a notícia de que a pessoa que você mais ama na vida morreu? E receber essa notícia dela mesma? Rasgado. Apunhalado. Dilapidado. É como se uma bomba atômica acabasse com todas suas ligações neurais e você não pensasse em mais nada. Apenas sentisse a dor das consequências. E entenda conseqüências como estragos, vazios, destruições... E o pior é a solidão, tão sedutora quão indiferente, querendo brindar com você a cada instante o seu estado solitário. A morte da pessoa amada faz você se sentir o mais solitário dos seres. Nada do que for dito ou feito é capaz de lhe consolar. E que ninguém tente estancar seu choro. É preciso colocar pra fora para que essas feridas todas não se transformem em uma espécie de câncer sentimental. A sensação é de que era muito melhor ter morrido no lugar dessa pessoa, mas não havia motivo algum para você morrer antes dela. E pelo resto dos seus dias você vai se perguntar a razão de ela ter morrido de forma tão brusca quão bruta. Sim, porque a morte da criatura amada por mais que aconteça durante o sono é de uma brutalidade tamanha. E daí a fé em outras vidas se reforça, mas quanto tempo ainda será necessário esperar para o reencontro. Será melhor morrer logo para antecipar esse recomeço? São tantas dúvidas pairando sobre a morte da mulher amada, que não se sabe se foi natural, acidental ou criminosa. De fato, há sempre um crime palpitando numa despedida desse porte. Aliás, despedir-se de quem se ama de forma definitiva é algo que contraria a natureza humana. Os homens inventaram o fogo, a roda, o avião, mas não criaram uma forma de superar a perda. Como se sentir depois de receber a notícia de que a pessoa que você mais ama na vida morreu? Com um ponto final no lugar do coração.


Comentários

14/07/2014, por Rafaela Almeida:

:( :( sem palavras :(

14/07/2014, por Luana T:

Vc tá cada dia melhor, é um texto melhor que o outro. Quanta inspiração!!

15/07/2014, por Giovanna Ambrósio:

É amor demais. Estou passando uma fase delicada e você me fez chorar muito. Mas foi ótimo, euzinha estava precisando de uma coisa desse tipo.


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