Daniel Campos

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06/10/2011 - A casa do caboclo

O que cai do céu não se sabe se é chuva ou o choro do Caboclo das Sete Encruzilhadas diante da destruição de sua casa. Ao golpe de marretadas, telhados e paredes que abrigaram o berço da Umbanda vão ao chão. Acabam com o marco inicial da religião genuinamente brasileira. Destroem mais de cem anos de história, forjada com muita luta e sacrifício. Ôô sacerdote, ôo curandeiro! Os espíritos dos caboclos e dos pretos velhos estão na rua Floriano Peixoto, número 30, no bairro de Neves, no município de São Gonçalo, Rio de Janeiro, despedindo-se do terreiro que é a certidão de nascimento da Umbanda.

Que Olorum ou Zambi ou Tupã tenha piedade! A casa, desgastada pelo tempo, que nunca teve o interesse dos políticos e dos empresários de ser preservada, está prestes a dar o lugar a uma loja de alumínio. A religião dando lugar ao comércio. A casa que foi do médium Zélio de Moraes, fundador da Umbanda, já teve sua fachada e a parte lateral da entrada do imóvel derrubadas. Até depois de amanhã tudo estará demolido. Foi lá que nasceu a primeira tenda Nossa Senhora da Piedade. Foi lá que se fez a junção dos elementos africanos, indígenas, católicos e espíritas. Foi lá que o Caboclo das Sete Encruzilhadas ditou as sete linhas da Umbanda.

Quantos milagres, quantos diálogos, quantas manifestações de espíritos serão soterrados com a demolição desta casa? Mais do que concreto, vão destruir cultura, costumes, memórias, elementos vivos de um povo dizimado, escravizado, castigado por um progresso elitista. Que o Caboclo das Sete Encruzilhadas perdoe os homens que não sabem o que fazem. Que os filhos de santo contem com a ajuda de seus guias espirituais pra vencer essa demanda. Que os preto-velhos, os caboclos, os boiadeiros, as crianças, os marinheiros, os ciganos, os orientais, os xamãs e os exus não caiam como caem os tijolos, as telhas e os pedaços da história...


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