Daniel Campos

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Tempo

Tempo, diga-me quem é?
Diga-me quem ou o quê se esconde atrás desse nome: tempo!
Quem é você?
Vamos, diga-me!
Quem é você que muda a cada momento?
Quem é você que se alonga e some no horizonte?
Quem é você que dói e faz doer a coisa amada?
Você que queima as pontes
Você que abre e fecha estradas
Você que nos faz eternos penitentes
Não! Não me diga que é inocente.
Quantos sonhos já morreram em você?
Quantos?
Vamos, diga-me!
Diga-me quem é?
Quem é você que leva tantas esperas consigo?
Você que amadurece o primeiro figo
E apodrece a nossa ilusão
Quem é você?
Você que nos diz não
Você que nos castiga
Você que nos obriga
Você que nos afana
Você que nos engana
Você que finge se deixar aprisionar
Mas é grande demais para se contentar
Com as folhas de um calendário
Para dar voltas em um ponteiro
Para caber em uma agenda
Tempo, como você nos faz de otário...
Você que é o buraco da fenda,
Quem é você?
Diga-me seu nome inteiro
Diga-me quem é
Você que mora em nós agora
E que é tudo isso que existe aí fora
Diga-me: quem é?
Você que nos quer fraco
Que é o espaço e o vácuo
Diga-me quem é
Quem é você que não tem volta
E que ninguém sabe aonde vai dar
Você que é espinho
Que gruda e não solta
Pelo caminho
Quem é você que não pára
Que corre e passa devagar
Vamos, confesse: quem é?
Quem é você que nos deixa como vermes famintos
Vermes que furam a sua carne macia...
Quem é você que eu não sinto
Quem é você que não alivia
Vamos, me diga quem é
Será que é de confiança
Será que já foi criança
Será que já brincou
Sonhou
E até se apaixonou
Será que tem filhos ou se cerca de esperas
E de outras feras
Quem é você?
Você que é gravidez permanente
Você que é diferente de todo o resto
Você que é o manifesto
O verso e a frente
Tempo, quem é?
Você que separa
Você que é uma tara
Você que é prejuízo
Você que nos tira o juízo
Tempo, quem é?
Você que é o falso consolo
Você que nos faz de tolo
Tempo, quem é?
Você que é ferida e ungüento
Você que eu não agüento
Tempo, quem é?
Quem é você que estilhaça
E nos ameaça?
Quem é você que não se mostra
E não nos gosta?
Quem é você que não tem prazo
E que é o atraso?
Quem é você que ninguém aprende
E que nunca se arrepende?
Quem é você que nos transforma
E foge à norma?
Quem é você?
Vamos, me diga?
Você que fadiga,
Diga-me, quem é?
Diga-me!
Você que é a nossa pior doença
Você que traz desespero
E exagera no tempero
Da desavença
Diga-me: quem é?
Você que atrai
E trai.
Você que é surpresa
E nos faz de presa.
Você que é fato
E acompanha os nossos sapatos.
Vamos tempo, diga-me,
Diga-me quem é?
Você que faz a gente pensar que é verão
Inverno e meia-estação,
Quem é?
Você que brilha
Que marcha, que cavalga, que voa, que trilha
Você que é o fim de todas as escolhas
Você que é o colorido da folha
Quem é?
Quem é você que caruncha o destino?
Quem é você que nos traz a falta?
Quem é você que anda em desatino?
Quem é você que não nos dá alta?
Tempo, diga-me quem é
Quem é você que leva tudo de mim?
Você que me leva ao começo e ao fim,
Diga-me quem é
E o que faço dentro e fora de sua cidade
Diga-me quem é
E como consegue transformar idade em saudade
Tempo, por favor, pelo amor que ainda resta
Pela agonia que nos molesta
Diga-me quem é
Você que me tira a vista, a cidade e o sabor
Você que me tira a conquista, a idade e a flor
No silêncio da ampulheta ou no relógio que grita
Tempo, diga-me uma resposta ainda não dita,
Diga-me, tempo, quem é?


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