Daniel Campos

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Sobras

Sobras de madrugada
Talvez o último suspiro
O quarto morno
As paredes tão íntimas
Espremem a mulher
Que se abraça a uma pelúcia
Tendo um quê de despedida
Em quadrantes
Rosa chá.

Chega o momento de separar os sonhos
Uns tão nítidos, outros nem lembrados
E os deixar ali
Caídos
Numa febre inconsciente
Fazendo ninhos em cobertores
E procriando ilusões.

Quando a luz se acende
Numa vontade de voltar
O corpo sonolento
Equilibra-se em esperas
E os olhos ao espelho
Confirmam que continua linda
E como não haveria de estar?

O corpo se despe
Deixando a roupa com gosto de sono
No assoalho quieto
Talvez algum deus
Ainda virá repousar sua cabeça
Naquela roupa que ainda pulsa
Talvez hoje seja dia para um vestido
Não sei, o diálogo com as roupas
É tão secreto e tão próprio
Mas com a roupa que estiver
Far-se-á mais uma vez
Templo da beleza.

Mais uma vez esse poeta
Cultivará rimas
Que vão se casar
Com as pernas
Em cruz
Que começam a descer os degraus
De uma escada que converge para o nada
Enquanto as mãos vão deslizando pelo corrimão.

Carícias nos olhos inquietos
O café que não necessariamente café
E outros detalhes a mais
Antes de sair e ver o dia ainda virgem

Chove. Uma chuva continuada e fria
Que umedece os cabelos
Que respinga o tecido
Da roupa e da pele
Instante de pensar novamente
Na cama, nos sonhos, na vontade de ficar
Vai sem querer ir
Não me encontra
Sabia que não ia me encontrar
Mas não sabia
Que lhe encontrava
Desde as primeiras horas do dia

Do dia
Que passei com os olhos de cera
Velando o seu sono
O seu amanhecer
N'uma vela
Que se faz chama
E morre um pouco a cada momento
Para permanecer viva
Na fé dos que não crêem
No amor que arrebata
E salva
De todos os males
Do medo à solidão
Amém.


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