Daniel Campos

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Poema torto

Se algum dia receber um pedaço de papel
E nele alguns versos com uma letra torta
Desculpe-me! Não é a letra, mas os versos são ébrios.
Os versos que ora nascem com rimas
Ora são jogados no papel,
Mas o que importa
É que se fazem com o mesmo sentimento.
Este, não se pode questionar
Tampouco calcular o valor.
O sentimento que se une ao pensamento
E vai escrevendo, tentando compreender
Esse desatino interior, esse nó
Que ata e desata a razão sem se explicar.
As palavras vão aliviando a agonia
Da emoção guardada e encarcerada
Que a boca não tem coragem de expor
Num medo desnecessário, entretanto vital.
E quando o sentimento se expõe
À instabilidade mundana e aos olhos pecaminosos
Que pecam pela insensibilidade
Vive-se o risco do anonimato
De morrer recém-nascido
Ou ainda nem encontrar alguém para pari-los.
Alguém que se disponha a ficar sozinho com a poesia
Ouvir o que ela tem para dizer
E escrevê-la em um pedaço de papel deserto de pautas
E das linhas do futuro...
Se algum dia receber um desses pedaços de papel
E nele alguns versos tortos
Falando de um amor mais torto ainda
Deverá saber que fui eu quem os enviou,
No entanto, ao ler os versos saberá também
Que está me lendo naquele poema.
Aquele pedaço de papel, de certo modo, sou eu...
Dito isso, ao ler, tente compreender,
Entender-me acima do silêncio das palavras
E então declamarei aos seus ouvidos aqueles versos...
Mas veja, dependo da sua boa-vontade
Do seu entendimento,
Só eles são capazes de abrir as portas
Das masmorras e dos porões
Onde se enclausuram
Suas donzelas emoções
Suas mocinhas corações
Suas princesas imaginações...
Quando receber meus versos
Pense na aflição dos meus olhos
Que se interrogam quanto ao destino
Da poesia:
Amassará o papel? Irá jogá-lo fora?
Ou guardá-lo-á onde só você pode encontrar?
Dentre tantos caminhos
Retos ou tortos demais,
Será que um belo dia terá aquela ânsia
- Talvez até sinta saudade -
De me reencontrar?
Se a resposta for não,
Silêncio!
A uma poesia que morre torta
Atrás da porta
De uma mulher
Numa esperança qualquer.
Se sim, irá procurar entre seus guardados
Pedaços de um passado que sobreviveu
Ao tempo das traças e das loucuras
E depois de soluços e suores
Num sorriso torto de medo
E desejo
Achar-me-á naquele pedaço de papel.
E ao olhar os versos tortos
Irá me ver, escutar a minha voz
Declamando-a, declarando-me
Num simples pedaço de papel
Tatuado pelas letras
Que me fazem poema
Na sua poesia torta,
Que me fazem poema
Na poesia que me entorta.


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