Daniel Campos

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Paradeiros

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui ajudar a semear três quartas de alqueire
Fui recepcionar os reis de Mônaco
Fui acompanhar a última dançarina de flamenco.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui espionar a passagem de um cometa
Fui chorar o funeral de um sonhador
Fui escutar as últimas das mexeriqueiras da esquina.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui olhar a chegada das baleias brancas
Fui saber as tendências para o próximo inverno
Fui cheirar a última torra de café caipira.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui conversar com um vinho chileno
Fui postar uma carta a um transatlântico
Fui tentar encontrar o último dos mosqueteiros.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui tentar descobrir o truque das aranhas
Fui procurar alguns alienígenas
Fui atear a chama do lustre da última capela.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui levar gérberas para as abelhas
Fui buscar os limites de um bloco de carnaval
Fui tentar conter a última praga bíblica.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui andar nas costas de um elefante
Fui dimensionar o raio do círculo polar
Fui ajudar no parto da última parteira.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui procurar uma cidade perdida
Fui preparar um jantar para alguém que não virá
Fui dar corda no último dos relógios.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui sondar quem está por detrás do porta-retrato
Fui concretizar mais um sonho psicodélico
Fui sonhar nas carruagens de um último ladrão.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui saborear algumas mangiferas indicas
Fui encontrar o ninho de uma sabiá
Fui procurar onde caiu último balão.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui medicar as vítimas de si próprias
Fui rumar no rumo dos sinais de chuva
Fui recuperar as jóias da última imperatriz.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui tentar fugir dos fugitivos
Fui fabricar um atestado de gravidez
Fui costurar as lonas do último circo.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui meditar com os escolhidos
Fui jogar uma garrafa com um poema no mar
Fui badalar o último sino.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui chamar a chama das lamparinas
Fui sacramentar um destino passional
Fui testemunhar o último veredicto do tempo.

Se eu não abrir a porta, não se preocupe
Fui encomendar uma porta no serralheiro
Fui contratar os serviços de um chaveiro
Fui trancar você, pela última vez, do lado de fora.


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